A causa (da discórdia) foi descodificada

Num post com o título: "O debate civilizado custa-me, mas às vezes tem que ser.", diz o conhecido Maradona e menos conhecido Jorge Madeira:

1. "(...) com o intercambio cultural permitido por meia dúzia de idas ao café ou o reflexo de um bom espelho em nossas casas, qualquer pessoa vê que o ser humano não é uma grande máquina na prudência e no cálculo das consequências das suas acções. "

2. "Mas, lá por isso ser assim, não se vai deixar de aplicar as soluções que existem para as recorrentes burrices do ser humano."

3. "Estão fartinhos de avisar que não se deve beber alcool em excesso, mas não é lá por causa disso que se vai deixar de tratar a cirrose ou proibir os transplantes de fígado."

Tentando concretizar a tese do Jorge na questão do aborto, a coisa soará mais ou menos assim:

1. Com o intercâmbio cultural permitido por meia dúzia de idas ao café ou o reflexo de um bom espelho em nossas casas, qualquer pessoa vê que homens e mulheres, quando vão para a cama, não são muito prudentes nem calculam bem as consequências que daí podem resultar, como seja, por exemplo, a hipótese de a mulher engravidar.

2. Mas, lá por isso ser assim, não se vai deixar de aplicar aquilo que pode corrigir as recorrentes burrices de homens e mulheres que vão para a cama sem pensar nas consequências.

3. Estão fartinhos de avisar que não se deve ir para a cama sem usar o perservativo (ou a pílula), mas não é lá por causa disso que se vai deixar de tratar a gravidez indesejada que daí pode resultar ou proibir a remoção do feto.



Ou seja, para o Jorge madeira o aborto é uma solução para a burrice recorrente de homens e mulheres que engravidam sem querer. Sem ironia, temos aqui argumento. Para o Jorge, as gravidezes indesejadas - inevitáveis, tendo em conta a imprudência humana - são um problema de saúde, como a cirrose ou um tumor, e por isso devem ser tratadas.

Acontece que nem toda a gente está obrigada a qualificar uma gravidez não planeada ou indesejada como um problema de saúde. Nem toda a gente tem que partir do mesmo pressuposto de que parte o simpático Jorge. E, por isso, nem toda a gente tem que chegar à mesma conclusão a que ele chega: a de que o aborto é uma espécie de tratamento para gravidezes não planeadas ou indesejadas.

Os debates e as discussões são tão mais úteis quanto melhor forem indentificados os pontos de discórdia que dividem quem discute. O Jorge madeira, com o paralelismo que faz neste seu naco de post, teve o mérito de tornar claro o ponto que nos divide: para ele, uma gravidez indesejada é um problema de saúde da mulher; para mim, uma gravidez, ainda que indesejada, é algo que implica um embrião humano, e que, como tal, nunca poderá ser "tratada" como um mero problema de saúde da mulher, mas como um problema cuja resolução passa por harmonizar na medida do possível os valores em causa: vontade da mulher, por um lado, com a viabilidade do embrião, por outro.

Comentários:
A vontade da mulher é , se calhar sempre muito grande, com a ajuda do social- só somos completas se formos mães- e o apoio do homem? (e eu já coloquei um post a questionar a participação do homem)
 
Na "mouche"
 





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