Ditadura da maioria
- E se a maioria da populaça pretender instituir a pena de morte?
- E se a maioria da populaça pretender instituir uma ditadura (provavelmente desconhece mas essa deveria ser a vontade da maioria em 1928, o que aliás ficou reflectido numa famosa frase de Fernando Pessoa)?
- E se a maioria da populaça entender que o blogue do João Miranda deveria ser encerrado?
- E se a maioria da populaça entender que os velhos com mais de 70 anos devem morrer, de forma a salvaguardar as reformas dos mais novos?
- E se a maioria da populaça entender que o liberalismo puro é uma patetice pegada e que os seus defensores devem ser todos presos?
Parece-me que estas perguntas já encontram resposta no post do João Miranda, quando ele diz "Se a lei for entendida pela esmagadora maioria da população como necessária (...) então é uma boa ideia.", mas ainda assim gostaria que ele me respondesse.
Bem sei que este post pouco ou nada parece estar relacionado com o aborto, mas quando pessoas, supostamente inteligentes, pretendem levar o debate acerca do mesmo para o plano das liberdades individuais, como se a liberdade individual da mãe fosse o único interesse ou direito em jogo, parece-me evidente que estão a tentar viciar os dados da discussão.
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A NÃO CONSCIÊNCIA DOS LIMITES
No fundo, é tudo uma questão de prioridades
«Human babies are not born self-aware, or capable of grasping that they exist over time. They are not persons»; therefore, «the life of a newborn is of less value than the life of a pig, a dog, or a chimpanzee.»
Nunca é demais avisar que ideias deste tipo não são tão marginais quanto possam parecer. Depois de décadas a aperfeiçoá-las, Peter Singer foi nomeado professor responsável pela cadeira de Bioética em Princeton, uma das mais reputadas universidades do mundo, e tem hoje uma grande número de seguidores, muitos em posições influentes da academia e não só. Isto lembra-nos que determinadas inovações, pese embora a aparência actual de pequenos passos, se podem revelar, no futuro, uma porta aberta para os mais ferozes utilitarismos.
Adenda: O mais destrutivo e eficaz crítico das teorias de Singer tem sido Roger Scruton. Conferir aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
MEDIA - INCONSCIENTE (?) SERVIÇO PELO SIM
Nos últimos dias, não há telejornal que não passe uma reportagem sobre as clínicas de aborto espanholas. Até já todos as conhecemos pelos nomes: Os Arcos, Los Bosques, etc. Quem não sabia onde abortar em segurança, agora já sabe. Eis um bom serviço de informação prestado aos abortistas.
Ficamos a saber que fazem uns milhares de abortos por ano, a espanholas e portuguesas, quanto cobram, que têm óptimas condições de higiene e conforto, que acompanham as parturientes, e por aí fora. Se é verdade ou publicidade a custo zero, não sabemos. Sabemos, isso sim, que são instituições legais. E, acrescento eu, com fins lucrativos.
Por agora, deixo só esta pergunta: será que nos próximos dias vamos ver igual tempo de antena reservado a instituições sem fins lucrativos, que dependem do voluntariado, donativos e eventuais ajudas do Estado, como a Ajuda de Berço, Ajuda de Mãe, Movimento de Defesa da Vida, etc? Seria um bom serviço de informação prestado a quem não quer ter os filhos por falta de apoios, e a quem quer verdadeiramente ajudar a reduzir o número de abortos.
Expliquem-me como se eu fosse muito burro II
Crime sem Pena
PROPAGANDA II
Crime Scene
Helena
Como se vê pelo último post, a Helena gosta tanto de consensos e falinhas mansas como o velho Evelyn gostava da companhia da descendência:
(...)
AS PERGUNTAS DO REFERENDO
“Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?”
Para regular a vida em sociedade, o Estado toma opções, decidindo quais as situações que exigem a sua intervenção e em que sentido, ou seja, escolhe aquelas que deve:
1 desincentivar, utilizando mecanismos que as impeçam ou dificultem (p.ex: sanções);
2 tolerar, não as regulando, ou
3 incentivar, criando condições que as facilitem ou favoreçam.
No estado actual da legislação, salvo em caso de perigo para a vida ou saúde da mulher, malformações do feto, ou de violação, constitui crime abortar, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas de gravidez.
Despenalizar esta conduta consiste em fazer com que ela deixe de constar do rol dos crimes. O Estado, em vez de punir, decide não interferir.
No entanto, se ganhar o “sim”, o Estado não se vai limitar a não interferir, não punindo.
Vai fazer mais do que isso: como o aborto só deixa de ser crime se for realizado em estabelecimento legalmente autorizado, vai criar nos hospitais públicos os meios necessários para que se possam efectuar estes abortos, vai legalizar clínicas privadas para o fazer, com as quais vai estabelecer protocolos, vai dar prioridade à realização de abortos, com o consequente atraso no tratamento de doenças efectivas (veja-se o artigo 6.º do projecto de lei do partido socialista, que entrará em vigor se ganhar o sim).
Ou seja, para além de despenalizar, o Estado vai participar activamente no aborto.
Daqui resulta que a pergunta que nos vai ser colocada no referendo encerra, pelo menos, duas questões:
1. Queremos abolir do rol dos crimes o aborto realizado até às dez semanas a pedido da mulher?
2. Queremos que o Estado, muito provavelmente com o dinheiro dos nossos impostos, crie as condições necessárias para que estes abortos sejam realizados, legalizando estabelecimentos para o efeito?
A resposta afirmativa à primeira das perguntas não implica um sim à segunda.
Por conseguinte, julgo que o Tribunal Constitucional deveria recusar a pergunta do referendo nos termos em que se encontra formulada.
LIBERALISMO
EU RESPONDO
Ler os outros
PROPAGANDA
IVG: uma frase de Karl Barth
Homem não entra
O que eu gostaria mesmo, porém, era de ver o Luís levar este argumento até ao fim. Terão os homens menos direito a falar do aborto do que as mulheres? Se sim, então porque fala tanto o Luís do aborto? E se eu, devido a um cromossoma errado, estou democraticamente inibido de opinar sobre o tema, porque não o estão os outros de fazer campanha pelo "sim"? Ou os muitos deputados do sexo masculino de votar qualquer alteração à lei? Ou qualquer homem de votar em Janeiro no referendo, com o argumento de que tão íntima questão só às mulheres diz respeito? Quer o Luís mandar calar o Primeiro-Ministro ou o Ministro da Saúde, que se têm mostrado tão activos na matéria? Ou os camaradas Louçã e Jerónimo?
Aguardo a resposta - com os mais femininos supiros que alcanço arrancar do meu peito másculo.
A PALAVRA DOS OUTROS
"É com indisfarçável alegria que vejo o aparecimento de blogues a favor do NÃO à capciosa pergunta que este clube de rapaziada da corda, a que a ilitracia pátria deu a maioria absoluta nas últimas legislativas, se prepara para lavrar em letra gorda num bocado de papel a que se convencionou chamar expressão da vontade popular.
E digo alegria, porque é com apreensão que vejo o triunfalismo dos que já se preparam para vitoriar o SIM, confiantes que andam no lento mas eficaz adormecimento de vontades, entretanto agravado de 1998 a esta parte. O desemprego galopa por aí à rédea solta, o medo vai paulatinamente conquistando as mentes, a miséria (material e humana) oferece o triste espectáculo que se vê nas ruas, os negócios prosperam como nunca, ataca-se ferozmente a honra dos outros, desacredita-se e demoniza-se quem recalcitra, ofende-se com a fisga da culpa (como aconteceu recentemente) o pobre consumidor que, embrutecido num T-0 onde não cabe com a família, diante do plasma que vai dolorosamente pagando a prestações, ainda leva com um flibusteiro em cima, a acusá-lo de ser o maior responsável pelo aumento da factura de electricidade.
Tudo isto e muito mais, a que os manhosos chamam modernidade, mas que afinal se trata de uma verdadeira guerra social, tem vindo crescentemente a desmoralizar a sociedade portuguesa, tornando-a permeável a tudo o que entendem impingir-lhe em nome de uma suposta liberdade, que, de acordo com as conveniências do momento, umas vezes – aqui d'el-rei! – anda a ser ameaçada por fascistas que recrutam jovens nas escolas, e outras é porque se não pode aceitar que as pobres mulheres violadas (como se se andasse por aí a violar mulheres todos os dias) possam vir a ser presas por IVG (Interrupção Voluntária da Gravidez).
Essa liberdade, que mais não é do que uma triste sequela das taras ideológicas dos que em Sessenta andavam pelos vinte e tantos anos, admiravam as proezas dos camaradas Mao, Pohl-Pot e outros que tais, e gritavam nas ruas «abaixo o capital», mas para lhe chegar melhor, essa liberdade, dizia eu, constitui hoje a gazua que tem servido para abrir todas as portas do relativismo mais boçal, a começar pela do direito à vida, seja ele entendido no sentido lato, seja ele entendido no sentido mais estrito, que é o da própria gestação. E o que é mais abominável em todo este verdadeiro processo de destruição e de culto da morte a que se assiste, é que não são assassinos de cara patibular que o professam, mas sim gente que a custo lá foi aprendendo a comer com faca e garfo, que hoje se apresenta com ideias reformadoras e sensatas, mas que ontem era pelo «make love not war», e que jura a pés juntos tirar-nos do charco para onde todos os dias nos atira. Que me perdoe o Vicente Jorge Silva, feliz criador do termo, mas acho que a geração rasca tem origens muito mais remotas, sendo a sua descendência, hoje com ela a partilhar o mando, um mero ersatz, nado e criado à imagem e semelhança de quem lhes insuflou vida. Quem sai aos seus não degenera.
O general De Gaulle, que conhecia bem os intelectuais do baixo-ventre no seu país, sempre que instado a pronunciar-se sobre a liberalização do uso da pílula respondia, invariavelmente, nestes termos: «ça c'est comme les voitures de sport». Que queria ele dizer com tal metáfora? Enigma! Inclino-me todavia a conjecturar que apenas (e não é pouco) queria dizer isto: «o que a malta quer é divertir-se com corridas».
Divirta-se pois a malta enquanto é tempo, mas que se não esqueça também da retribuição de que os Antigos Gregos já falavam na Tragédia e que Kipling tão bem soube sintetizar nestas palavras: «cometerás os pecados um a um, mas pagá-los-ás aos pares».
Mail de João Borges de Azevedo
Palavras amigas
Admitindo, apenas para benefício do debate, que o objecto do aborto não é uma pessoa, ninguém negará que, às dez semanas e muito antes, estamos perante um ser que não é mera excrescência do corpo materno. Este ente autónomo tem origem humana e, se não morrer ou for morto entretanto, completará a sua formação intra-uterina até à data do seu nascimento. Há, portanto, poucas dúvidas de que, para além de ser, este ser é humano.
E se essas dúvidas são poucas ou nenhumas, há que assumi-lo coerentemente, recusando a tão propalada catalogação do problema do aborto como matéria da consciência. Relegada a essa relação intransmissível e insindicável do eu consigo mesmo, a questão do aborto não extravasaria o patamar da moral e deveria, então, ser solucionada pelos mecanismos próprios do remorso ou da confissão, no plano religioso em que aquela tantas vezes se verte.
Mafalda Miranda Barbosa
João Vacas
Não esquecer o essencial.
E o essencial até não é díficil de mostrar. É uma ecografia de um feto às 10 semanas. Um olhar sem preconceitos leva a uma certeza existencial: "aquilo" é-me familiar, não é uma "coisa", mas "alguém" parecido comigo... eu também já fui assim.
Se mesmo assim não houver certezas, fica a dúvida. E para essa dúvida só há uma resposta honesta: na dúvida, vamos proteger a vida.
Não devemos cansar-nos de repetir isto. Mesmo que pareça óbvio.
Pela cultura da vida
Tenho para mim que a convocação constitui uma fuga em frente, uma demissão de responsabilidades e um abuso de confiança. Descentrada da agenda das grandes questões com que se debate o futuro imediato do país, soa mais a diversão que a um genuíno propósito rectificador de algo supostamente ferido de erro, imprecisão ou injustiça. Este referendo é político, pois coloca o debate a partir das forças políticas que o propuseram e não nasce de uma vontade expressa pela sociedade civil. Este debate é postiço, pois não parte do entendimento que a lei vigente não é a mais cordata, mas sim da inaplicação de tal lei. A responsabilidade de tal inaplicação é, consequentemente, reflexo da falta de vontade do Estado em aplicar em plenitude os instrumentos de que dispõe para evitar o flagelo do aborto.
Abstraindo argumentos de natureza filosófica, religiosa e biológica – se bem que todas tenham cabimento no esgrimir de posições – importa que o povo português compreenda que em todo este historial houve um grande culpado: o Estado. Ninguém quer o aborto – pelo menos é o que ouvimos dos partidários do sim e dos defensores do não – mas, perguntamos, onde está o planeamento familiar, onde estão as políticas de sensibilização, onde estão as campanhas de informação que evitem um mal que todos estimam uma ofensa às mulheres? Perderam-se 25 anos. Se a medicina pode responder fielmente ao mandamento de Hipócrates – “não praticarás o aborto” – graças à panóplia de recursos hoje disponíveis, o Estado não quis, não soube aplicar ou não foi fiel à lei em vigor. A cultura da morte é a mais cómoda. Isenta todos de responsabilidade, premeia quem dela quer extrair lucros e destitui o Estado, a lei, as ordens profissionais e os cidadãos do problema. Ninguém quer ver uma mulher julgada e presa pela prática do aborto, como ninguém minimamente sensível poderia julgar um doente terminal que pede morte misericordiosa. A cultura da morte é a mais cómoda. A defesa da vida é caminho bem mais áspero.
AINDA PRÓS E CONTRAS
- O Dr. João Paulo Malta é contra o aborto e entende que o que se pretende com esta proposta de lei é liberalizá-lo;
- A Dra. Edite Estrela é contra o aborto e contra a penalização das (pobres) abortistas;
- O Dr. Miguel Oliveira e Silva, como médico que é, é obviamente contra o aborto, mas considera que o que está em discussão é o papel do Estado nesta matéria;
Muito resumida e simplificadamente, parece-me serem estas as posições dos oradores de ontem. Um ponto os une: são todos contra o aborto...
No dicionário de língua portuguesa, aborto é definido como a “expulsão do feto antes do fim da gestação”, e como o “acto ou efeito de abortar”. Já abortar é definido como “dar à luz um feto sem tempo de gestação normal que o torne apto para viver”. Ora, estando as 10 semanas de gestação longe do fim deste período, podemos concluir que quem faz uma IVG até às 10 semanas está a praticar o aborto. Podemos também concluir que quem se declara a favor da IVG até às 10 semanas, é implicitamente a favor do aborto.
Os defensores do SIM (à IVG ou ao aborto ou como lhe queiram chamar) centraram-se em dois pontos: o fim dos abortos clandestinos e o fim da penalização das mulheres que abortam, sendo que o segundo conduz automaticamente ao primeiro. Ou seja, se não forem penalizadas, as mulheres que quiserem abortar passarão a entrar nos hospitais públicos, eventualmente com um papelucho na mão obtido no centro de saúde, e anunciam no guichet: “eu vim fazer uma IVG, onde me devo dirigir?”, ou talvez “eu pretendo ver reposto quanto antes o meu direito a ser menstruada, onde me devo dirigir?”.
Até os defensores do SIM sabem que com a mulher viverá sempre o peso de ter praticado o aborto, ou tão somente de ter criado a situação que a levou a este acto. Este peso, a que podemos também chamar vergonha ou culpa, não se apaga com a despenalização legal. Ou será que as mulheres que abortaram e não foram penalizadas não continuam a carregar o peso de o ter feito? Acredito que continuem. Afinal, o peso não era o da condenação do acto, mas do acto em si. Não servindo nenhuma das leis (actual e proposta) para as aliviar, serve certamente a lei actual para penalizar quem das suas fraquezas se aproveita.
APRENDER COM QUEM SABE
Incoerência
Impressões do Debate (1)
Quem é que ontem à noite, na RTP1, trocou a Odete Santos por aquela senhora de Bruxelas que sabia tanto do aborto clandestino que até conhecia o nome do medicamento mais usado, o...
o...
ó Doutor, como é que se chama mesmo o medicamento?
Impressões do Debate (2)
Se o objectivo da liberalização é dar às pobres condições para abortar em segurança, já que as ricas vão a Londres e a Badajoz, por que carga de água vai o Governo comparticipar clínicas privadas estrangeiras que serão obviamente preferidas pelas ricas?
Para lhes poupar a viagem?
Impressões do Debate (3)
Edite Estrela disse que, às vezes, pode haver ruptura de stocks de contraceptivos nos centros de saúde, tal como pode haver falta de arroz de vez em quando num supermercado.
Não percebo.
Os chineses fartam-se de comer arroz e têm filhos comó caraças.
Impressões do debate (4)
Suspeito que o dr. Oliveira e Silva é mais favorável à mudança de sexo do que de partido.
Impressões do debate (5)
Isto parece-me uma inconsistência, mas não estou aqui para julgar ninguém.
Impressões do debate (6)
Esta gente quer impor-nos a sua religião à força.
Impressões do Debate (7)
Perto do fim, Natacha Amaro, porta-voz de um dos movimentos pró-aborto, queixou-se de que o "sim" dispôs de menos tempo de antena.
Ah, as saudades que eu já tinha do dr. Cunhal...
Impressões do Debate (8)
Zita Seabra explica que não mudou de opinião, mas que a situação do país mudou: hoje o aborto a pedido não se justifica. E é só isso o que está em causa no referendo.
The end.
Sondagem TSF
Algumas notas sobre o Prós & Contras
2. Como seria de esperar, a posição estrambólica de Zita Seabra só trouxe desvantagem e embaraço ao lado do "Não". É jurídica e politicamente insustentável.
3. Uma das razões pelas quais o "Não" ganhou em 1998 e poderá ganhar em 2007 é o facto de os seus representantes se terem sempre mostrado muito mais tolerantes e moderados na argumentação, contrariamente à histeria radical do outro lado, que irremediavelmente afasta qualquer indeciso. Convém que o verniz não estale. Ao fazer o discurso dos verdadeiros médicos (os que alegadamente cumprem o juramento de Hipócrates e votam "Não") contra os meros "licenciados em Medicina" (os restantes), o Dr. Gentil Martins lançou um ataque descabido e um libelo desnecessário. Com todo o respeito que por ele temos, erupções moralistas desta safra não são o melhor serviço à causa.
4. O lado do "Sim" atacou, completamente a despropósito (porque não é nesse patamar que o referendo se coloca), com o argumento de que muitos dos presentes, perante uma situação de violação ou má formação do feto, não optariam pela solução do aborto. A estes não ocorreu a inteligência de responder - conforme, no mesmo palco, há alguns anos, respondeu Henrique Pinheiro Torres - que "sim, nesses casos nós não abortaríamos ou aconselharíamos que alguém o fizesse, mas a lei e o estado não devem obrigar ninguém a ser herói". Neste aspecto, o médico do lado do "Sim" tem toda a razão quando diz que a questão é, tão-só, a de saber o que cada um de nós acha que o estado deve dizer. A única (grande) diferença que me separa do Sr. Doutor é que eu considero que o feto merece a tutela penal de que goza hoje. No mesmo plano, querer mostrar, através de uma participante mais jovem, que o nosso lado é intrinsecamente melhor e que jamais abortaria um feto portador de deficiência é transportar para a discussão um zelo moralista que afasta um capital de tolerância importante. Até porque há muitas pessoas que são indiscutivelmente pelo "Não", mas que não hesitariam em fazer-se valer de uma cláusula de não punibilidade da actual lei. Eu, por exemplo, e em nome da transparência do debate, não hesitaria em aconselhar um aborto (sempre dentro dos limites temporais permitidos) em caso de perigo para a saúde da mãe de um filho meu; tenderia a propôr o mesmo sentido em caso de violação; e ponderaria bastante perante a malformação de um feto.
5. É importante que se sublinhe o perigo para a saúde física e psíquica da mãe que ocorre em qualquer aborto, seja em estabelecimento clandestino ou em estabelecimento autorizado, para assim desmistificar mais um lugar-comum do voluntarismo idealista do "Sim". No entanto, o perigo para a saúde da mãe não é, em rigor, um motivo para a criminalização. E o argumento de Isilda Pegado que a compara ao uso do capacete é uma pura falácia. Para além da natureza radicalmente distinta das ofensas (uma é considerada crime; outra meramente como contra-ordenação), não há nenhuma razão palpável que justifique que o estado seja paternalista ao ponto de me obrigar a utilizar capacete ou cinto de segurança. Em nenhum momento estas condutas se podem repercutir numa terceira pessoa ou entidade. Por isso é que utilizar o argumento da saúde da mulher para justificar a criminalização do aborto é, antes de mais, reduzir a importância da questão ao plano da relação binária estado-mulher, esquecendo o verdadeiro bem jurídico a que se pretende atribuír tutela: o feto.
6. Ficou provado que os mitos do "Sim" podem ser desmontados pela própria acção dos seus representantes. Os julgamentos são sempre alardeados como exemplos de atraso cultural. Mas, por exemplo, no recente caso de Setúbal, julgou-se uma mulher que se submeteu a um aborto aos seis meses de gestação. Muitos dos que hoje estiveram na Casa do Artista insurgiram-se, então, contra a desumanidade. Mas, como é óbvio, não seria esta lei a evitar esse julgamento e esse aborto clandestino.
Enfim, talvez este meu post não seja também o melhor contributo para a causa. Mas para o "Não" vencer é preciso equilibrar o debate nos temas e nos termos correctos.
Nova aquisição (repost)
Conversão ou blasfémia?
Hipocrisia? II
Hipocrisia?
Inquisição
PONTO FINAL
3 contra 1
Importa-se de repetir?
A convidar para futuros debates
Mitos abortistas
DR. MIGUEL - O ESCLARECEDOR
- a IVG faz terminar (e não apenas interromper) uma vida humana;
- os médicos devem ser, como é evidente, contra o aborto;
- 1% da população portuguesa é constituída por psicopatas ou parteiras despudoradas.
Pergunta da noite
Prós & Contras IV
Prós & Contras III
Prós & Contras II
Prós & Contras
Luta de classes II
É mais ou menos isto, não é?
Nova aquisição
Questões FAQturantes - 4
Luta de classes
Porquê não?
Além disso, a minha mulher teve alguns abortos espontâneos e eu vi-os! Da primeira vez que abortou, estávamos debaixo de fogo em Angola, incapacitados de sair de casa, telefonámos ao médico assistente e ele pediu para recolhermos "tudo". A minha mulher estava grávida de dois meses, e fui eu que recolhi "tudo": um pequeníssimo bebé, mas que era muito mais parecido com o nosso filho mais velho, na altura com 6 meses de idade, do que ele comigo, que, na altura tinha 22 anos...
Neste debate sobre o referendo, muitas vezes é apresentada a questão sobre o que ou quem vale mais? O filho ou a mãe? Os adeptos do "sim" acham que é a mãe.
Na minha opinião, valem ambos o mesmo!
Ambos têm o mesmo direito a viverem, como têm os homens mais pobre e mais rico do mundo! Todos temos o mesmo direito à vida! Nisso, somos totalmente iguais!
Para quem reconhece isto, só pode votar "Não" no próximo referendo, uma vez que é a única resposta que salvaguarda este igual direito.
Votar "sim" é votar pelo financiamento do aborto (não apenas a sua liberalização)!
MATERIAL GIRLS
Novo colaborador eventual II
TURISMO DO ABORTO
"ESCOLHAS" - UMA QUESTÃO DE AGENDA?
Assim como ao Jorge Lima aqui em baixo, também a mim a posição do professor Marcelo Rebelo de Sousa pareceu equivoca, ontem nas suas “escolhas”. Ficou bem sublinhado o facto de o aborto ser matéria de referendo graças à sua iniciativa em 1996. Tudo bem; fico-lhe grato. Mas quanto ao assunto, eu ontem esperava uma sua posição mais… afirmativa. Hoje ao reler o resumo das suas “escolhas” no DN confirmei pelo texto a sua clara abstenção.
Entendi que aceita a pergunta a referendar como boa. Mas o que ficou a zumbir no meu ouvido foi que o professor considera precário o prazo das 10 semanas de gestação na “humanitária tolerância” à mulher que aborta… E pareceu-me ouvir confirmada a minha tese de que o governo Sócrates consegue preencher a difícil agenda 2007 com mais ou menos legitimas manobras de diversão, a decorrer entre a campanha para o referendo e a presidência da UE.
Acho pouco. Não conheço a agenda do professor, mas acho pouco.
Despenalização, ou pena suspensa?
Este argumento tem bastante expressão do lado do Não. A mim, para dizer o mínimo, levanta-me dificuldades. Está fora de questão que muitas mulheres recorrem ao aborto em circunstâncias extremas, que o seu grau de conhecimento do que está em causa é por vezes diminuto, etc., etc. Mas isso justifica despenalizar? Como se pode dizer «Isto é crime, mas percebemos perfeitamente que o pratiquem e não vos acontecerá nada?» E se, por exemplo, se justifica não penalizar uma mulher que praticou um aborto aos 6 meses (suponho que se integra no leque estabelecido pelo Prof. MRS) por motivos de extrema carência económica, porque não aplicar a mesma (ausência de) pena a quem o fez sobre uma criança de 1 mês (clarifiquemos - nascida há um mês)? Porque já a vimos, já lhe pegámos ao colo, porque já nos parece um ser humano? E, por outro lado, porque não despenalizar o furto praticado por necessidade económica extrema? Dir-me-ão: isso já se faz - chama-se pena suspensa. Bingo. Porque é que, em lugar de despenalizar, não aplicamos pena suspensa à mulher que abortou esmagada pela sua circunstância socioeconómica e afectiva, não condenamos a que o fez por um capricho, e, sobretudo, não condenamos exemplarmente quem vive disso, sejam parteiras de vão de escada ou clínicas sofisticadas?
Deixem-me clarificar só mais uma coisa: acredito firmemente que a vida começa na fecundação. Basta atender à definição comummente aceite de vida: «o que é capaz de assimilar matéria para a incorporar em si mesmo». E, para mim, algo (um ser, direi eu...) que, se deixado entregue a si próprio (ou seja, no útero) se transforma num ser humano, não pode ser classificado senão como um ser humano.
Jorge madeira, O pragmático - soluções parciais para os grandes problemas da humanidade (1)
Questões FAQturantes - 3
Novo colaborador eventual
A causa (da discórdia) foi descodificada
1. "(...) com o intercambio cultural permitido por meia dúzia de idas ao café ou o reflexo de um bom espelho em nossas casas, qualquer pessoa vê que o ser humano não é uma grande máquina na prudência e no cálculo das consequências das suas acções. "
2. "Mas, lá por isso ser assim, não se vai deixar de aplicar as soluções que existem para as recorrentes burrices do ser humano."
3. "Estão fartinhos de avisar que não se deve beber alcool em excesso, mas não é lá por causa disso que se vai deixar de tratar a cirrose ou proibir os transplantes de fígado."
Tentando concretizar a tese do Jorge na questão do aborto, a coisa soará mais ou menos assim:
1. Com o intercâmbio cultural permitido por meia dúzia de idas ao café ou o reflexo de um bom espelho em nossas casas, qualquer pessoa vê que homens e mulheres, quando vão para a cama, não são muito prudentes nem calculam bem as consequências que daí podem resultar, como seja, por exemplo, a hipótese de a mulher engravidar.
2. Mas, lá por isso ser assim, não se vai deixar de aplicar aquilo que pode corrigir as recorrentes burrices de homens e mulheres que vão para a cama sem pensar nas consequências.
3. Estão fartinhos de avisar que não se deve ir para a cama sem usar o perservativo (ou a pílula), mas não é lá por causa disso que se vai deixar de tratar a gravidez indesejada que daí pode resultar ou proibir a remoção do feto.
Ou seja, para o Jorge madeira o aborto é uma solução para a burrice recorrente de homens e mulheres que engravidam sem querer. Sem ironia, temos aqui argumento. Para o Jorge, as gravidezes indesejadas - inevitáveis, tendo em conta a imprudência humana - são um problema de saúde, como a cirrose ou um tumor, e por isso devem ser tratadas.
Acontece que nem toda a gente está obrigada a qualificar uma gravidez não planeada ou indesejada como um problema de saúde. Nem toda a gente tem que partir do mesmo pressuposto de que parte o simpático Jorge. E, por isso, nem toda a gente tem que chegar à mesma conclusão a que ele chega: a de que o aborto é uma espécie de tratamento para gravidezes não planeadas ou indesejadas.
Os debates e as discussões são tão mais úteis quanto melhor forem indentificados os pontos de discórdia que dividem quem discute. O Jorge madeira, com o paralelismo que faz neste seu naco de post, teve o mérito de tornar claro o ponto que nos divide: para ele, uma gravidez indesejada é um problema de saúde da mulher; para mim, uma gravidez, ainda que indesejada, é algo que implica um embrião humano, e que, como tal, nunca poderá ser "tratada" como um mero problema de saúde da mulher, mas como um problema cuja resolução passa por harmonizar na medida do possível os valores em causa: vontade da mulher, por um lado, com a viabilidade do embrião, por outro.
POSIÇÕES
Prós & Contras
Objecto de estudo
Globalização
Corpos Celestes
Aliás, e ao contrário dos meus camaradas aqui de baixo, parece-me que as farpas do Luís são um excelente prenúncio. A autoproclamada superioridade cultural tem dado magníficos resultados em consultas democráticas recentes - para o outro lado. Foi assim que Soares perdeu para Cavaco: chamando-lhe fascista e analfabeto. E não preciso de recordar o desfecho do referendo de 98, pois não?
Revista de imprensa (16)
O VÁCUO ESPIRITUAL
"Deixámos às gerações que vieram depois de nós num vácuo espiritual. Os jovens estão a lutar pela sua identidade num mundo definido pela desigualdade e pelas incertezas materiais, justapostas bolsas surrealistas de fome e fausto. Daí a sua vulnerabilidade ao politicamente correcto, única religião que conhecem. Os jovens imploram por alimento espiritual, e a elite das escolas oferece-lhe as amargas cinzas do niilismo. Tudo o que há de inspirador ou enobrecedor foi conspurcado pelos seus docentes confusos e insensibilizados, que não merecem o nome de "professores".