CORREIO DOS LEITORES

Ocasionalmente publicaremos os textos enviados pelos leitores que consideremos relevantes e úteis para esta discussão.
Aqui fica o 1.º, da autoria do Fernando G. Costa (médico):
Aborto e eugenia

O debate sobre o aborto tem carecido de muitas discussões importantes, entre as quais está um aspecto sociológico (sociobiológico, para ser mais exacto) sobre o qual seria interessante reflectir:
Como se sabe, as novas tecnologias médicas e o estudo cada vez mais aprofundado do genoma humano, permitem já hoje que se possam detectar não só defeitos do feto, como também várias características físicas e fisiológicas do ser em gestação. É mais do que certo que em breve sejam previsíveis dados como a fisionomia, desenvolvimento físico atingível, cor dos olhos, doenças de que irá padecer (não só aquelas que hoje são alegadas para justificar o aborto, mas outras como diabetes, reumatismos, doenças cardíacas, acne, etc.), enfim, um sem número de dados com que os potenciais pais, num futuro muito próximo, se irão confrontar. Tudo indica que mesmo muitas características psicológicas e intelectuais serão passíveis de previsão, desde o Q.I. até à tendência para a criminalidade, toxicodependência, alcoolismo, por exemplo.
No caso do aborto passar a ser encarado apenas como um vulgar acto de livre decisão da mãe, em que outros factores como pressões éticas, morais, ideológicas ou religiosas perderão peso face ao efeito de diluição da responsabilidade que resultará da sua prática legal e sociologicamente apoiada por uma mentalidade hedonista, não se irá criar uma sociedade profundamente eugénica? Não se passará a abortar apenas porque a criança não irá atingir um coeficiente de inteligência que lhe permita vir a ser quadro superior, ou político...ou, suprema distinção, dirigente de futebol? Ou porque irá sofrer de reumatismo (doença de grandes encargos económicos...)? Ou porque irá ser homossexual ou ter acne, ou não ter olhos azuis e cabelos louros? Já hoje em dia, em países como a Índia ou a China em que os rapazes são mais valorizados que as raparigas, são efectuados inúmeros abortos apenas por se detectar que o feto é do sexo feminino. É por isso que o discurso “pró escolha” pode ser perigoso: se para o cidadão comum o feto for algo que nada tem de humano, se o aborto for apenas um direito da mulher a ver-se livre duma excrescência que parasita o seu corpo (“não queremos ser incubadoras”), se for algo que a sociedade aceita como natural e em que não se equaciona estar em jogo uma vida humana, abortar passará a ser, na maioria dos casos, já nem sequer uma situação limite utilizada por motivo de doença, probabilidade de deficiência grave, ou miséria social, mas sim uma espécie de jogo de rifas em que quem não gostar do prémio o deita fora e joga novamente. Até atingir o filho perfeito que a sociedade modelizar. Quem tiver filhos deficientes ou imperfeitos não virá um dia a ser mal visto? Não será eventualmente pressionado(a) para abortar, sob pena de se tornar responsável por trazer ao mundo um ser imperfeito? Caminharemos então uma sociedade em que apenas haverá crianças desejadas e em conformidade com o modelo dominante. Não sei é se alguém lá estará para ver...
Fernando G. Costa
(Médico)

Comentários:
eu se bem me lembro das idas aulas de filosofia, esta texto é uma falácia (em ponto grande) não formal, do tipo bola de neve.

parece-me.

andré
 
Falácia? O aborto por deficiências do bebé já é permitido. Muitas fazem-no, sem qualquer problema.
Porquê? Porque:

a) como irmã e filha de deficientes (sim, a minha família é TODA ela composta por deficientes: pai, mãe e único irmão), sei que os apoios estatais a deficientes, nomeadamente aos pais de crianças com deficiência é uma anedota!

b) Porque existe o preconceito que um deficiente / doente é um infeliz e faz todos infelizes à sua volta

Em suma: um deficiente / doente é visto como um estorvo. Um mal a acabar quer no início da sua vida, quer no final da mesma.
Portanto, o aborto acabará (se é que não o é já) por ser um processo selectivo em que apenas passarão os considerados perfeitos aos olhos dos pais, da sociedade. No fundo, é a purificação da raça, a vitória dos mais fortes.
O pior cego é o que não quer ver.
 





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