O VÁCUO ESPIRITUAL


Ontem houve por aqui referências a livros. Se não se importam, eu convoco alguém insuspeito para uma pequena reflexão. Poderá, à primeira vista, pensar-se que isto nada tem a ver com o tema deste blogue. Acontece que tem. Esta mulher, como se costuma dizer, "provou" de tudo. Tem autoridade intelectual para se pronunciar nos termos em que o faz. Não é santa nem demónio. É apenas uma mulher bem viva e bem vivida. Chama-se Camille Paglia e o livro Vampes & Vadias (Vamps & Tramps, no original), da Relógio D' Água. O seu livro mais recente "está lido" aqui.

"Deixámos às gerações que vieram depois de nós num vácuo espiritual. Os jovens estão a lutar pela sua identidade num mundo definido pela desigualdade e pelas incertezas materiais, justapostas bolsas surrealistas de fome e fausto. Daí a sua vulnerabilidade ao politicamente correcto, única religião que conhecem. Os jovens imploram por alimento espiritual, e a elite das escolas oferece-lhe as amargas cinzas do niilismo. Tudo o que há de inspirador ou enobrecedor foi conspurcado pelos seus docentes confusos e insensibilizados, que não merecem o nome de "professores".


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O MEU TESTEMUNHO
O aborto ou a interrupção voluntária da gravidez é uma questão de consciência – como bem disse o Cargeal Patriarca de Lisboa. “Esta é uma questão transversal", salientou. O cardeal adianta que, apesar de haver pessoas que têm já uma "posição completamente tomada", ainda há "uma camada da população para quem a questão é dolorosa, incómoda".
É o meu caso.
Olho-me e analiso-me: Nunca fiz um aborto, nunca o faria (e agora já posso dizer nunca terei essa experiência).
Repenso: Tens a certeza que nunca o farias? ...procuro exemplos de situações desesperadas. Não! nunca passei "por isso". Nunca fui posta à prova! O mais perto que estive foi ter um dia pensado e sentido no mais íntimo:
“É cedo ainda...que inoportuno!... o 1º nasceu ainda há pouco... é preciso nova casa... não vai ser fácil ...a economia caseira vai ressentir-se. Que transtorno! ”

Olho-a, hoje, e a culpa desse primeiro pensamento, nunca verbalizado, ainda me aperta.

Dilema meu... e de muitas mulheres por esse mundo fora.
Como é possível tantas certezas, tantas convicções... a mim revolve-me a entranhas. Sabendo que o aborto ilegal e inseguro vai continuar e é motivo de tanto sofrimento, tanta ansiedade, tanta solidão - agravados por serem feitos na clandestinidade. A mulher fica sempre sózinha. Só uma ínfima parte das mulheres confessa ter feito um aborto e, as que o fazem, normalmente só a amigas íntimas, não dizem sentir-se aliviadas, dizem sentir-se perseguidas com sentimentos de culpa, sobretudo quando olham crianças. ( quer sejam parvas ou não, caro JG – são crianças que nasceram e as delas não - é assim que as mulheres sentem, não há leviandades nesta questão).

E depois o que se sofre durante a gravidez! No meu caso, trabalhei até ao fim. No 2º parto precisamente até à vespera – nasceu num sábado. No 1º nasceu numa 2ª feira – trabalhei à sexta-feira anterior: As dores nas costas, os pés inchados, os dentes a cariarem-se, o cansaço, as náusias, os vómitos. A partir do 6º mês desesti de almoçar no refeitório da empresa porque eram 10 minutos a pé em pleno verão e ficava sem forças para o 2º turno de trabalho. A solução eram sandes, à secretária,- o menos indicado. Nunca inventei dores insuportáveis junto da médica, tive a honestidade de dizer que só as tardes eram difíceis de aguentar por causa do cansaço e das dores nas costas. A “simpática médica” da Caixa respondeu: cansaço e gravidez não são doença... não lhe posso dar baixa, (faltavam 10 dias) a entidade patronal é obrigada a deixá-la descansar (como eles conhecem os locais de trabalho!)- Baixas por doença, nós sabemos, são para os amigos, para os “fiteiros” ... e para alguns doentes, vá lá... concedo.

Mas não falemos mais da gravidez, não é isso que está em causa, mas a sua interrupção ou o aborto – como queiram.
Há situações desesperadas: Há adolescentes abandonadas pelos pais e ostracizadas pela família.
Há “lares disfuncionais”. Há homens violentos, bebâdos, drogrados e também futuras mães.
Há espíritos fracos e dificuldades económicas.
A contracepção às vezes falha com os pobres e com os ricos.
E não argumente com "a paródia", a gravidez não é o resultado de uma "paródia".

A Segurança Social deveria apoiar sériamente as famílias com filhos. O abono de família deveria ser um abono sério. Os descontos do IRS por cada criança deveriam ser proporcionais aos custos com o tamaho da casa,com a alimentação, a educação o vestuário etc... Mas somos um país pobre... e lobies liberais, que pululam pela blogosfera, fogem como o diabo da cruz destes temas...


Quem sou seu para decidir em nome de cada um?
Não tenho esse direito!
Já decidi: vou abster-me!
Decidam vocês ... os iluminados. Os que nunca se enganam e nunca têm dúvidas.
Eu, neste caso, "só sei que nada sei".
 





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