Escalada da demência
Enquanto Ana Gomes explica o carácter reaccionário da deontologia médica, Andreia Peniche, militante do Bloco de Esquerda, propõe-se dimensionar o aborto no "plano dos direitos de cidadania e de democracia reconfiguradas".
Andreia Peniche entende os prazos previstos nas leis como quimeras e a proibição de abortar como uma "manifestação profunda e cruel do poder patriarcal". Acha que esta consubstancia uma "cidadania mitigada para as mulheres" que redunda numa manutenção da heterodefinição das mulheres como identidades resultantes da sua função maternal. Nem os defensores do aborto a pedido até às 10 semanas escapam.
Não resisto a citar:
O direito ao aborto exige uma concepção de democracia como agência, isto é, como reivindicação enformada politicamente no sentido da transformação das relações sociais de poder: porque exige que se perspective a sexualidade separada da reprodução e porque reclama a sexualidade como um direito das mulheres; porque exige o reconhecimento das mulheres como porta-vozes das propostas de transformação social emancipatória.
Para compreender o direito ao aborto como um direito emancipatório não basta alterar a lei, é necessária uma refundação da democracia e da cidadania que permita entender as mulheres, simbólica e praxicamente, como seres humanos plenos". O aborto deve ser descriminalizado não apenas porque as mulheres são livres de tomar as suas decisões, mas também porque as suas acções devem ser reconhecidas e legitimadas como acções morais e responsáveis.
Estas duas senhoras querem rescrever por via decretal a nossa vida em sociedade e o entendimento que fazemos do que é ser ser humano.
É disto que realmente se trata. As 10 semanas são só um pretexto. E um primeiro passo.
João Vacas