Escalada de demência II

O direito à vida é uma aberração socialista. Eis a novíssima pérola do AA do AAdF. Só um socialista imporia que o Estado salvaguardasse um direito à vida. Em alternativa, diz o blogger, devemos erigir no ordenamento jurídico o direito a não ser impedido de viver pelos seus próprios meios. O que significa que ou alguém tem meios para viver e/ou sobreviver por si só ou a sua vida pode ser posta em causa. Mais concretamente, o disparate vertido em prosa conduzir-nos-á à assunção da mais valia dos meios por referência ao fim, ao mesmo tempo que comporta resultados práticos interessantes. Pensemos na seguinte situação: o senhor A está a agonizar com um ataque cardíaco. Não tem meios para sobreviver por si próprio, ficando a sua existência dependente do auxílio de terceiros. De acordo com o pensamento em causa, A não tem qualquer direito a ser socorrido. Ou então, numa outra interpretação, que permita uma leitura economicamente cunhada da ignomínia, tendo A meios financeiros para prover ao pagamento dos serviços médicos adequados, terá direito a sobreviver, sendo o inverso mentira, já que os meios de financiamento do SNS serão sempre alheios.
E com isto, AA passa para o aborto. Não tendo o embrião possibilidade de sobreviver por si mesmo, não tem direito a viver. O argumento, deveras interessante, permitir-lhe-á ademais defender a liberalização do infanticídio (duvido que um bebé recém-nascido sobreviva muito tempo sem os cuidados de terceiros).
Mas o brilhantismo não fica por aqui e volta a chamar à colação o direito da mulher ao seu corpo. A inteligência suprema nem percebeu que até os mais acérrimos defensores do sim – creio que não por convicção, mas por imperiosas necessidades de pragmatismo político – abandonaram essa ideia pela simples constatação da diferença entre a vida intra-uterina e um quisto sebáceo.
Contudo, compreende-se. De um apaixonado pelos clássicos liberais que nunca entendeu que tal teoria os coloca aos pulos na tumba - não tivessem sido eles defensores por excelência do direito à vida - não se pode pedir muito mais. Dá para rir à gargalhada com o que vai escrevendo, o que já não é mau de todo.

Comentários:
Cara Mafalda,

Uma vez que os nossos debates já acabaram, por duas vezes, consigo a não querer prosseguir a conversa, aliás de uma forma pouco cordata, não vejo por que deverei despender energias a contrariar intelectualmente a sua contra-informação.

Responderei apenas ao seu exemplo.

Se o senhor A está a agonizar com um ataque cardíaco, não tem direito nenhum a "mundos e fundos" que pertençam outra pessoa para se salvar.

Não quer isto dizer que se alguém os providenciar voluntariamente, o senhor A não possa deles beneficiar "porque a eles não tem direito". Com a transacção livre, a ter direito incontestado a esses meios.

Isto também não quer dizer que não seja aceitável que outrem seja roubado para salvar o senhor A, mesmo que seja uma violação dos direitos desse outrem. É sempre uma acção ilegítima e imoral.

Note que esta excepcionalidade, admitida por muitos liberais-clássicos, pode ser usada para justificar a proibição do Aborto— um motivo de força maior, um lifeboat situation, que obriga ao atropelo dos direitos das pessoas.

Se quiser atacar a posição liberal, este é um bom ângulo.
 
Que continuem! Estas declarações são do melhor que temos para a campanha do Não. Há que divulgar, há que divulgar!
 
Mafalda,
Peço desculpa se o meu comentário é inoportuno, mas francamente não percebo qual o interesse para a discussão de utilizar na argumentação esta abordagem e linguagem. Sendo claramente a favor do Não, parece-me que este tipo de verbo é perfeitamente dispensável, pois deixa transparecer um tom ressentido - que não sei se existe ou não - que bloqueia o debate e atinge pessoalmente os que participam na discussão, repito, sem qualquer necessidade.
MC
Rodrigo Adão da Fonseca
 
Cara anónima 28/12/06 12:41:
O seu raciocínio está errado por 2 motivos:
1. Se o senhor A está a agonizar com um ataque cardíaco tem o direito a ser atendido num hospital público, que, no fundo, usa o dinheiro de todos nós... ou seja, não é um senhor B que é roubado e sim toda a sociedade! Todavia, acho que ninguém é contra isto uma vez que a solidariedade é uma virtude bem fundamentada nos nossos valores comuns (até porque não sabemos se um dia vamos precisar...)
2. Se o senhor A for antes um menino A e tiver uma meningite é obrigação dos PAIS (ou qualquer outro encarregado) pagar (dentro das suas possibilidades) dos seus pertences para o salvar! Ou será que os pais podem, eticamente, deixar a criança definhar, só porque esta não possui pertences?

Caro Rodrigo:
Concordo que o tom do discurso é um pouco agressivo, mas este argumento é poderoso... demonstra onde a materialidade e pragmatismo da nossa civilização nos conduzem... a uma nova "lei do mais forte" onde aqueles que não se podem manifestar estão completamente desprotegidos!

Cumprimentos
 
Caro Rodrigo Adão da Fonseca,

não há qualquer ressentimento até porque nem conheço o AA. Sei que ele existe através da blogosfera e delicio-me com os disparates que vai proferindo.
Achar que o direito à vida é absurdo porque próprio dos regimes socialistas dá-me vontade de rir.
Ao cotejar isso com o auto-convencimento do AA, que se acha detentor de uma cultura jurídico política inigualável, chego à conclusão que este é o único tratamento que merece.
Pode não favorecer o debate. Mas o objectivo é tão só mostrar a quem nos lê os verdadeiro motivos de alguns defensores do sim. E para isso serve.

Cumprimentos,

Mafalda

Caro AA,

fique só a saber que se o senhor A estiver a agonizar com um ataque cardíaco e o AA for a única pessoa com meios para o auxiliar é obrigado a fazê-lo, sob pena de cometer um crime. E a isto não se chama socialismo. Chama-se reconhecimento da ineliminável dignidade ética do ser humano que o AA parece desconhecer.
 





blogue do não