IVG: que direitos (e deveres) tem o pai?

A concessão (sem condições) à mulher do direito de interromper voluntariamente a gravidez abre ao exercício da paternidade um complexo problema moral e jurídico. O facto de não o ver debatido não diminui a minha convicção sobre a gravidade da situação para a qual parecemos caminhar.
Julgo que sempre se considerou que o acto da procriação resulta da decisão livre de um homem e de uma mulher (o problema de uma gravidez ocorrida numa relação não consentida está fora do âmbito desta argumentação). Um casal decide ter filhos ou decide não ter; ninguém lhes impõe essa decisão. Mas essa liberdade tem a correlativa responsabilidade de cuidar de um terceiro, no caso de ocorrer uma gravidez. Essa obrigação é igual para o pai e para a mãe. Ora, este equilíbrio moral e jurídico de direitos e deveres é quebrado quando é dado à mulher um direito soberano de vida ou de morte sobre o feto (até às dez semanas); isto, acrescento eu, como se o filho fosse só seu – ou, como defendem os que suportam a IVG com base no direito da mulher de “dispor do seu corpo”, como se o feto fosse simplesmente parte do seu corpo. E não é também parte do do pai? Não é isso que está pressuposto na lei quando o homem é obrigado a assumir a sua responsabilidade de paternidade?
A defesa da IVG como um direito em abstracto tem, pois, um problema complicado: é um direito apenas das mulheres que, pela sua própria natureza, está duplamente vedado aos homens: primeiro porque não são os homens quem engravida, segundo porque são excluídos da decisão de a praticar. Trata-se, assim, de um “direito” ferido da impossibilidade de universalidade, característica que eu acreditava ser uma das bases do Direito das sociedades livres. Mas, a este problema, acresce um outro: o que é a paternidade? Com a atribuição, sem condições, do direito da mulher à IVG, a paternidade torna-se condicional, uma concessão da mulher ao homem. O exercício desse dever pelos homens passa a estar claramente enfraquecido porque, até às dez semanas de gravidez, uma decisão voluntária da mulher pode quebrar ou fazer desaparecer esse dever. Os homens que entendam a sua paternidade sobre o feto também como um direito passam igualmente a estar sujeitos à decisão da mulher para o exercer.
Com a sua responsabilidade assim condicionada, os homens não estão a ser separados do que de mais íntimo e essencial os une à paternidade? Deste modo, as crianças passarão a nascer, não porque o pai e a mãe quiseram, mas porque a mãe quis. E o homem será pai também por decisão da mulher. Esta menorização dos homens, que juridicamente já é desastrosa, não poderá deixar de o ser também moralmente (a não ser que optemos por viver à margem da imoralidade das leis).

Comentários:
É claro que,sendo uma decisão dos dois não faz sentido falar-se em "opção da mulher".
 
Despenalização do Aborto

A legalização do assassínio dos seres humanos mais vulneráveis. A prova da hipocrisia duma cultura "moderna" pífia e convencida. A forma mais preguiçosa de resolver o problema. O direìto à vida é inegociável. Uma questão básica de moralidade.

ou

A reposição duma liberdade básica de qualquer indíviduo. O fim da hipocrisia das mulheres julgadas por terem escolhido o que fazer com a sua própria vida, exemplo típico da podridão dos "valores tradicionais". O direito da mulher a dispor do seu corpo é inegociável. Uma questão básica de moralidade.
 
Caro Luís, tenho esperança de não ser a primeira - e muito menos a única - a dizer-lhe isto, mas estou plenamente de acordo com tudo o que disse, como se eu mesma tivesse alinhado essas palavras que escreveu. Parece-me, de facto, demasiado evidente que o «não» tem muito mais argumentos, e mais válidos, do que o «sim», mas as conversas que vou tendo com pessoas da minha geração, que deviam ser inteligentes e informadas, deixa-me apreensiva sobre o desfecho do referendo agora convocado. Não conheço ninguém que tão frontalmente como eu seja contra a despenalização do aborto, eufemisticamente designado por interrupção (não será anulação?) voluntária da gravidez. Respiro de alívio ao conhecer este blog, por ver que não estou sozinha. Bem haja, só por isso. E obrigada.
 
Depois de experimentar três vezes discutir o assunto com uma amiga "sim" e três vezes ter sido apelidado de fascista só por querer discutir o assunto, começo a querer votar "não". Mas o meu liberalismo demasiado forte e decadente estrebucha, confesso.
 
Caro Andreu Vallès,

Convido-o a visitar o post feito neste blog por Jacinto Bettencourt, com o título "Pela liberdade, contra o aborto - II". Aquele texto magistral tem a virtude de pôr a nú o equívoco de liberdade que se entranhou na cultura dos nossos dias. Não nos deixemos enganar! A liberdade que tanto se apregoa não é liberdade, é prisão!
 
Caro Marco Neves:
Os seus comentarios "paralelisticos"(parece-me que já é o segundo) são-no apenas na forma mas não no conteúdo.
Julgo que a sua intenção é a de passar a ideia de que tudo na vida é relativo e tem a mesma dimensão e importância ética, mas isto simplesmente não é verdade.
 
Caro Afonso Cabral,

não podia estar mais de acordo com o seu comentário ao Marco Neves.
O relativismo do "tanto faz", conducente ao nihilismo, apaga a dimensão ética do modo de ser pessoa.
Obrigada pelo seu contributo.
 
Realmente! Muito bem visto! Sou mulher e concordo absolutamente com o que diz. Só não percebo é como é que colegas meus, homens, não pensam nestas coisas...
 
Realmente! Muito bem visto! Sou mulher e concordo absolutamente com o que diz. Só não percebo é como é que colegas meus, homens, não pensam nestas coisas...
 
Amigos
Felizmente ainda há muitas pessoas ajuizadas que tê a noção de estar em causa a vida de um terceiro de quem, alguns, queren dispor a seu bel-prazer e outros até oferecem condições para os "matar", talvez melhores do que as que existem para nascer. O Ser Humano é o pior "bicho" que anda sobre a terra. Mesmo assim, Deus acreditou nele e aposta nele.
Quando se vai a um funeral o padre que preside reza, perante os restos mortais do defunto: "que todos aqueles a quem ajudaste te recebam nas moradas eternas" (+ ou - sic). Estão a imaginar tantas crianças assassinadas a receber os seus algozes?! O Homem precisa de usar mais a sua inteligência e questionar-se sobre o sentido da vida. Eu sou contra o aborto. Costa Gomes
 
Não são "relativistas", bem pelo contrário. Serve apenas para nos ouvirmos uns aos outros :)
 
Quem foi o inteligente que agora vem com esta ideia da menorização dos homens ?

Acaso terá ocorrido ao autor do dislate a menorização das mulheres que o NÃO implica,, nessa linha de raciocínio das "menorizações" ?

Tenham dó, discutam com tino.
 
Concordo com a generalidade do seu post, Luís. Mas é importante referir que dentro desta perspectiva, seria essencial falar da responsabilização dos homens (penalmente) no caso dos abortos efectuados. Os mesmos direitos e os mesmos deveres. Penso que a discussão em torno do Sim e do Não está a passar ao lado deste ponto.
 
Concordo plenamente, Susana.
 





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