25 anos depois

Estava a ver que nunca mais se lembravam. Finalmente, lá foram recuperar o labor hemerotéquico do Daniel Oliveira. Foi o Nuno Ramos de Almeida, no que rapidamente se viu seguido pela Gisela Nunes e pelo Carlos Abreu Amorim. Esta malta delira com Paulo Portas. Vivem e respiram o senhor. Então quanto ao CAA, receio mesmo que não tenha vida própria.

Seja como for, que resultado útil esperam ter com esta tropelia argumentativa? Um debate "sério", "esclarecido"e "moderado" não será certamente. O texto em questão foi escrito na vigência da lei anterior, na qual as cláusulas de não punibilidade actualmente previstas não existiam. Depois, para além das considerações acerca da falta de autonomia "laica" do discurso da direita (que hoje seriam largamente ausentes de fundamento concreto e cujo substracto político-ideológico muita gente do "Não" - eu incluído - subscreveria na íntegra), nada há nele que verdadeiramente sustente a alegada incoerência entre o pensamento de Paulo Portas de então e a sua posição quanto à pergunta deste referendo.

Porém, ainda que essa incoerência fosse visível, o que provaria ela? E que tipo de debate pretende quem recorre a este escrito de há 25 anos atrás - quando Portas, segundo sei, tinha 20 anos de idade? O que pensavam, esreviam e, já agora, em que partidos militavam e que grandes líderes defendiam o Daniel e o Nuno quando tinham 20 anos. Seria bonito que soubéssemos, quanto mais não fosse para que déssemos todos uma boa gargalhada.

Sim, porque só os moralistas mais rasteiros levantam o dedo perante estas "incoerências". A decência exige, antes de mais, compreensão e riso perante a via sinuosa que é a vida. Por exemplo, eu tenho andado estes últimos dias fascinado com a deliciosa ironia que se abateu sobre o Carlos Abreu Amorim - esse grande liberal. Não foi há 25 anos, mas há muito menos, que o vimos escrever e jurar que não tinha "desejo em conviver com pessoas que constante e compulsivamente pretendem exibir a sua predilecção sexual, buscando qualquer pretexto, por mais frágil que seja, para se vitimizarem até à exaustão". Foi uma frase irreflectidamente estúpida, até porque agora, no seu novo blog pelo "Sim", convive com o intelectual predilecto do ovimento LGBT português, o qual, de acordo com o que se conhece dos escritos do CAA, caberá no seu conceito de "homossexual fanfarrão". Se o Carlos tivesse sentido de humor, rir-se-ia deste caracol que o destino traçou na sua vida. Mas a verdade é que não tem, conforme um dia explicou genialmente outro dos seus novos companheiros de blog. E, de facto, mais vale nem tentar.

Comentários:
Prezado Francisco

25 anos são, de facto, muitos anos, não é. e se for apenas há um ano atrás ? Teresa Caeiro, deputada pelo CDS pelo distrito de Leiria, em campanha eleitoral afirmou que era favorável à despenalização da IVG. O problema não é mudar-se de opinião ( eu mudarei o meu voto SIM se os objectivos que penso alcançar com ele não se concretizarem ou, se antes, se agravarem), o problema é não assumir a posição que se tem, nas tuas próprias palavras, em nome de moralismos rasteiros, ou pior, dito por outras palavras, o problema é não defendermos as causas públicas em que acreditamos. Um ano depois, Francisco, um ano depois.

Real
 
http://masporque.wordpress.com/2007/01/20/aborto-nao-tem-que-ser-uma-palavra-cara/
 
Real,
eu mudarei o meu voto SIM se os objectivos que penso alcançar com ele não se concretizarem ou, se antes, se agravarem
Duas perguntas:
- quanto tempo vai esperar até verificar se esses objectivos se concretizaram?
- acredita mesmo que, se o "sim" ganhar, lhe será dada oportunidade para mudar o voto?
 
Meu caro Real,

Que eu saiba, a Dra. Caeiro ainda não mudou de opinião, muito menos o disse publicamente. Julgo mesmo que ainda num dos semanários deste fim-de-semana se publicam umas suas declarações que reiteram o voto sim.

Quanto ao mais, qual é o problema de as pessoas mudarem de opinião? Eu já mudei sobre uma paleta infindável de assuntos e não imagino a vida como suportável se tal não nos fosse permitido.

Em todo o caso, o que é mesmo insuportável é esse moralismo da "coerência", principalmente porque quando vem da esquerda contra a direita, é sempre acoplado dos mais descabidos processos de intenção e suspeitas de grandes interesses obscuros
 
caro joaquim lopes
o pessoal da esquerda qb tem este problema, acredita no "melhorismo social". e eu acredito que o SIM melhorará a situação do aborto clandestino em portugal, se não melhorar pugnarei por outra lei, por outra política pública. Mas e o não, meu caro, contribui para resolver o quê ?

Francisco

gosto muito do que escreves, aprecio até o rigor que imprimes em muitas matérias, mas não deves ser só aí, na verdade, Teresa Caeiro não disse, agora, que ia votar sim, disse apenas que não concordava com a condenação das mulheres.

Real
 
Real,

O que é "melhorar a situação do aborto clandestino em Portugal"? Haver menos abortos clandestinos? Haver mais? Menos mulheres assistidas nos hospitais em consequência de abortos clandestinos?
E é apenas o aborto clandestino que o preocupa? O aborto "porque sim" não o preocupa?

1 - A experiência e o senso comum mostram que o aborto clandestino continua a existir e que o número de abortos aumenta com a despenalização.
2 - A quantidade de mulheres assistidas nos hospitais em consequência de aborto (clandestino ou espontâneo) é bastante reduzido.

O problema de "certa esquerda" não é acreditar no "melhorismo social". É fechar completamente os olhos à realidade e defender "soluções" que não resolvem problemas nenhuns, apenas os pioram e criam outros.

O Real aceitaria que o Estado disponibilizasse salas em hospitais para os pais maltratarem os filhos, com o argumento de que, já que as crianças serão sempre maltratadas, é melhor garantir que são assistidas logo a seguir aos maus-tratos, de forma a minorar as consequências a longo prazo?
 





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