AGORA COM OS NÚMEROS À FRENTE

A sondagem TVI/PÚBLICO/RCP feita pela Intercampus e divulgada ontem e hoje traz-nos revelações muito interessantes, destacando-se como primeira e mais importante a de que as pessoas estão satisfeitas com a lei actual. Perguntadas, em concreto, sobre as razões que poderiam justificar ou permitir o aborto, os entrevistados responderam que deveriam ser apenas aquelas que estão já previstas na lei.
Além destas, têm ainda algumas dúvidas (49%-40%) relativamente à falta de meios da mãe para sustentar a criança mas execrável mesmo é a sociedade que obriga a mãe a abortar por insuficiência de meios económicos. Uma sociedade minimamente decente não pode permitir-se que haja uma única mãe a abortar (ou sequer configurar essa hipótese) por falta de meios, principalmente quando há tanto desperdício por aí.

Outro ponto relevante é que os portugueses não querem o aborto a pedido, o aborto porque sim, o aborto livre, o aborto sem qualquer tipo de ponderação de interesses minimamente relevantes (43%-45%). Mas é a isto, que os portugueses rejeitam, que a resposta do SIM pretende chegar: poder a mulher abortar livremente, só porque sim (ver alguns cartazes do SIM), até às dez semanas. Não precisa de invocar nenhuma razão, bastar-lhe-á chegar ao hospital, dizer que quer abortar e, muito rapidamente, ver satisfeita a sua vontade, ali mesmo ou numa clínica privada (o sonho de qualquer doente do SNS...).

Ora, se os portugueses rejeitam o aborto livre até às dez semanas, como se explicam estes resultados? O responsável pela Intercampus, em declarações à rádio, considera que as pessoas não estão devidamente informadas sobre o que está verdadeiramente em causa e no Público pode ler-se que existe muita confusão sobre o que está em causa. Concordo inteiramente. A pergunta é enganadora e o debate não está a ser claro nem esclarecedor. A campanha do SIM tem-se esforçado por apregoar que está em causa o fim do aborto clandestino (não está, ele não vai acabar), que se quer apenas acabar com a perseguição e humilhação das mulheres (não é verdade, continuará a partir das dez semanas), que unicamente se trata de despenalizar (é falso, passa a ser livre até às dez semanas) e, com isso tudo, pretende apenas confundir as pessoas que, ingenuamente, têm-se deixado ir atrás destes argumentos. Bem explicadas as coisas e com objectividade, estão contra.

Sabendo as pessoas, esclarecidas verdadeiramente as pessoas de que o voto no SIM permite o aborto livre, sem motivo, até às dez semanas, elas não votarão SIM e votarão antes, naturalmente, NÃO. É missão daqueles que são pela vida esclarecer as pessoas do que está verdadeiramente em causa e ajudar as pessoas a não serem enganadas. Decidam o que quiserem, mas sabendo bem o que está em causa.

Comentários:
"É missão daqueles que são pela vida esclarecer as pessoas .."

Não , não a missão daqueles que são pela vida, é a de lutar pelo não no referendo, MAS TAMBÉM LUTAR CONTRA A LEI ACTUAL. Porque esta permite vários tipos de aborto (violoção, terapêutico) que segundo o argumento da VIDA deveriam ser punidos como crime. Mas, não dá jeito. Era capaz de afastar alguns votantes. Alguns.
 
Achas que devia ser punido o aborto em casos de VIOLAÇÃO??? Que raio de bom-senso é esse? Vê-se bem que não és mulher... Mas pensa só: se fosse com a tua irmã, namorada, mãe, prima? Muita hipocrisia por estes lados!
 
Não é por não dar jeito, é por não ser isso que está agora em discussão. Leu bem a pergunta do referendo?
 
Li muito bem. Mas se o argumento do não é feto=vida, então o corolário da premissa é evidente. Muito evidente. Não há volta a dar. O argumento moral e ético "da vida" não é um menu. Repare que não faço qualquer censura (pelo contrário) a quem utiliza "a vida" como argumento de luta contra o aborto. A censura só aparece se não formos consequentes com todas as consequências da premissa. S um feto que resulta de uma violação não é vida, é quê?
 
O argumento de que "agora não estamos a discutir isso" é engraçado. O anterior referendo foi hà 8 anos. O não ganhou. E bem. O argumento na altura: "feto=vida". Tendo ganho aquele referendo os apoiantes do não sendo consequentes deveriam ter prosseguido nos 8 (oito!!) anos seguintes o objectivo de mudar a actual lei. A lei actual não protege a vida. Não protege. Aborto por violação e terapêutico, continuam aí, e muito poucos apoiantes do não balizados pelo arumento da vida, tem colocado em cima da mesa estas questões. Enquanto observador, só posso concluir que é porque dá jeito. Jeito.
 
"é por não ser isso que está agora em discussão"

Então passam o tempo a falar da vida dos fetos e depois negam-se a discutir o assunto no seu todo? E querem fazer-nos acreditar que com a criminalização se está a poupar vidas?
 
VLX:

Precisava de um esclarecimento, não sei se faz muito sentido colocá-lo neste postal mas tinha de ser a alguém que sabe de leis.

É mera curiosidade técnica.

Como é que um crime pode ter atenuantes em virtude de carências monetárias?

Nunca percebi isto. Então um crime varia de acordo com as posses de quem o pratica ou as atenuantes sempre se prenderam com o facto de confessar ou ter sido levado a isso, etc, etc.,

Tenho dúvidas que se esteja a falar correctamente quando se dão os exemplos dos casos que acabaram em multa.

Há mesmo algo artigo especial (no caso do aborto) que configura a hipótese de atenuante por situações de pobreza?

A ser assim, cada vez fico mais confusa (em relação à lei, não em relação a este referendo ou a esta questão).

Como é possível alterar o sentido ético que deve estar sempre sujacente a uma lei, com esta arbitrariedade?

É crime de ordem diferente?
Há norma que abre excepção dentro da lei?

Bom. É mesmo uma dúvida.

Até porque percebo o facto de se falar em despenalização e não liberalização. A ideia de crime mantem-se, não passa a ser direito. Passa é a protelar esse crime para depois das 10 semanas. Mas, não existindo excepção nos artigos 140 e 141 relativos a condições monetárias, como é que aparecem depois em tribunal?
Obrigada
 
Por impossibilidade total, não posso responder aos comentários que o mereçam hoje. Tentarei fazê-lo amanhã. De todo o modo, adianto desde já aos comentadores que contra o aborto a pedido existem diversos grupos de pessoas, onde se incluem aquelas que consideram que nenhum motivo existe para se abortar voluntariamente e outras que entendem que existem motivos sérios ou graves que justificam ou possibilitam que o aborto seja feito sem penalização. O que as une é que são contra o aborto a pedido, que é o que está em causa. Sendo isto o que está em causa, é irrelevante a discussão anterior. Foi isto, se calhar em termos mais complicados, que se pretendeu dizer e espera-se que agora seja compreendido. Ou, de outra forma, ainda para os mais simples: esse assunto está tanto em discussão como o saldo da minha conta bancária pelo que eu não tenho de vos dar conta sobre um ou outra. Percebeu-se agora?
 
Ok.

Tenho uma pergunta na calha mas já perdi o post onde a deixei. Acrescentei uns detalhes no outro mais acima
 
Filipe Castro,

A lei actual não protege a vida.
Não concordo. Ao impôr limitações ao aborto, a Lei actual inequivocamente protege a vida. Pode-se não concordar com o nível de protecção (p.e. a questão da malformação levanta-me dúvidas) mas não se pode dizer que a protecção é nula.
 
"...são contra o aborto a pedido..." porque o embrião em causa É VIDA (segundo o argumento do não). VIDA. V-I-D-A. Basta ler sites, jornais, opiniões, tudo o que quiser. São contra o aborto a pedido porquê? Porque após a fecundação o que passamos a ter é VIDA. VIDA. Logo, não é possivél dizer que não é isso que está em discussão. É só isso. Nesse momento, é totalemente lógico que se coloque a questão: porque razão não consideramos um embrião com malformação VIDA? Porque razão consideramos um embrião que resulta de uma violação descartavél?

PS: Mantenho. A lei actual não protege a vida. O nivél d eproteção actual não é total. Senão também é possivél dizer que a lei das 10 semanas a ser aprovada também protege a vida, mas com um nivel de proteção...menor.
 
Filipe Castro,
Nesse momento, é totalemente lógico que se coloque a questão: porque razão não consideramos um embrião com malformação VIDA? Porque razão consideramos um embrião que resulta de uma violação descartavél?
É totalmente lógico colocar essa questão mas é totalmente ilógico continuar a colocar essa mesma questão depois de ela ter sido respondida. Várias vezes.

A não ser que se esteja nas tintas para a resposta, apenas goste de se ler a colocar a questão. É isso?
 





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