Ainda sobre as pílulas do dia seguinte…

Há que ter em conta que o ordenamento jurídico não se reduz ao direito penal.
Aliás, este é caracterizado pela sua fragmentaridade, sendo esta especificidade que, de acordo com um dado entendimento do princípio da proporcionalidade, viabiliza a não inconstitucionalidade por omissão da descriminalização de uma conduta atentatória de um bem jurídico com assento constitucional.
No caso das pílulas do dia seguinte, não está em causa a sua criminalização. Mesmo porque cada um pode activamente mobilizar a sua esfera de direitos e deveres para, fazendo uso da sua autonomia privada, adquirir, onerosa ou gratuitamente, o medicamento em questão. O ordenamento jurídico reconhece um direito de acesso a esse bem. Independentemente da questão moral que lhe está subjacente, e de que o direito não cura, o ordenamento jurídico não considera o acto desvalioso. E, porque a norma – mesmo formalmente legítima – não é tudo, resta-nos uma de duas possibilidades. Ou ela está em contradição com um princípio de inviolabilidade da vida humana (e no caso seria inconstitucional), ou ela, numa remissão para os princípios, garante a conformidade que o funcionamento intrassistemático exige.
Essa consonância existe juridicamente pelo simples motivo de, independentemente do momento da fecundação, a mulher ainda não estar grávida quando o efeito químico se produz.
Posto isto, algumas notas, num registo tópico que garanta uma melhor percepção do discurso:
1. Não faz sentido chamar à colação o problema da tentativa porque esta só pode ser equacionada por referência a comportamentos penalmente relevantes, que, manifestamente, não é o caso.
2. A consonância que, interpretativamente, se procura não pode ficar presa à relação de unilateralidade entre a constituição e o direito penal que é, na sua globalidade, o fundamento da não inconstitucionalidade das diversas descriminalizações existentes, e tanto quanto não se reconheça uma segunda dimensão ao princípio da proporcionalidade.
3. Se o autor do texto a que dou resposta me diz que não há saltos qualitativos no desenvolvimento embrionário como pode admitir o aborto a pedido até às 10 semanas?
4. Se admite o aborto livre às 10 semanas, partindo do pressuposto que a vida humana é um continuum, posso concluir que admite o aborto livre até aos nove meses e que o prazo arbitrariamente estabelecido funciona apenas como válvula de escape para permitir, de forma referendária, a aprovação de uma alteração legislativa?

Comentários:
A questão é muito simples.

Se o "não" argumenta com a "vida" do embrião após a sua imediata formação, então deve também procurar:

a) proibir a pílula do dia;

b) criminalizar todo o aborto terapêutico que não coloque em risco a mãe;

c) criminalizar o aborto após violação.

Estranhamente, neste bloque há uma certa dificuldade em discutir estes tópicos, com o argumento de que "não é isso que está cuasa neste referendo". No entanto, são recorrentes as tentativas de colocar em discussão temas como "na Inglaterra o aborto é até às 24 semanas a pedido" por exemplo, "depois das 10 vem as 24". Coerências.

Por motivos de esclarecimento do debate seria importante que neste blogue os leitores ficassem elucidados sobre todo o portfolio de ideiais associado à defesa do "não".
 
Caro Filipe,

estou cansada de explicar o porquê da não punibilidade do aborto em caso de violação, etc.
Faça-me um favor. Leia os posts sobre o assunto. Verá que NUNCA a minha resposta foi "não é isso que está em causa".
Obrigada
 
O filipe e um pouco burrinho! depois da pilula do dia seguinte o espermatozoide ainda nem fecundou! nao tem vida! nao tem orgaos! burcalho! Eu tenho 11 anos e sei isso! lol mas se quiseres entender algo mais le o texto da mafalda
 
Filipe,

caso não tenha reparado, há uma diferença entre um referendo e umas eleições. É que enquanto que as eleições implicam um programa e o exercício do poder público durante um determinado lapso de tempo, o referendo esgota-se na resposta à questão que é colocada.

Significa isto que é irrelevante saber qual a posição de quem vota Não sobre outras questões que não aquela que é colocada a referendo. Mesmo porque pode haver várias posições distintas entre posições que têm em comum o facto votarem NÃO à liberalização do aborto.

Finalmente, digo-lhe que uma das razões que me leva a votar NÃO no referendo tem a ver com o facto da lei actual não ser inteiramente coerente na defesa da vida. Parece estranho? Eu explico melhor: A coerência absoluta exige a rigidez absoluta. Assim, assumir o direito à vida de forma radical e fundamentalista implicaria penalizar o aborto sempre, da mesma forma que assumir a liberdade de opção da mulher de forma radical e fundamentalista implicaria votar SIM no próximo referendo, permitindo-lhe abortar mesmo sem razão nenhuma, quaisquer que fossem as circunstâncias.

Fora destas duas há as posições moderadas, aquelas que admitem que o direito à vida possa não prevalecer em determinados casos. A lei actual prevê três desses casos - a malformação do feto, o perigo de vida para a mãe e o caso de violação.
Além disto importa dizer que a penalização do aborto permite distinguir as diferentes situações das mulheres que abortam, enquanto a liberalização faz tábua raza de todas as circunstâncias tornando o aborto legal em qualquer circunstância (ou se preferir, sem necessidade de verificação de qualquer outra circunstância).

Se concordo com as excepções existentes? Com a pílula do dia seguinte?

Se quiser saber proponha um referendo sobre isso.
 
Caro Filipe Castro:
Diga-me só isto: tem mais algum argumento além desse?

Já houve imensos posts sobre essa temática, até já eu lhe respondi (e não obtive qualquer resposta). O que é perguntado é: "Concorda com a despenalização da IVG quando realizada até às 10 semanas, por opção da mulher, em estabelecimento de saúde autorizado?" - depois "sim" e "não" e coloca-se a cruz no Sim se se concorda com a despenalização da IVG quando realizada até às 10 semanas, por opção da mulher, em estabelecimento de saúde autorizado e no Não se não se concorda com a despenalização da IVG quando realizada até às 10 semanas, por opção da mulher, em estabelecimentos de saúde autorizado!
Muita gente vota Não porque é contra a despenalização etc... etc... etc... POR OPÇÃO DA MULHER e mais nada! Há quem veja na lei actual uma moderação que poupa os casos extremos... o que não invalida que veja a lei que vai ser aprovada com este referendo como um extremismo injustificável.
Eu, por outro lado, sou contra a actual lei (nomeadamente no que diz respeito ao aborto terapêutico). Diga-me lá, nesta fase do campeonato, o que quer que eu faça? Que vote Sim, por acaso? Não faz sentido! Existe uma hierarquização de valores e, se esta lei é, para mim, errada, a próxima é muito pior...
Em suma:
1) Eu posso ser contra o aborto em qualquer circunstância.
2) Eu posso ser contra a penalização da mulher em todas as circunstância
3) Eu posso ser contra a despenalização da mulher em qualquer circunstância.
E não há paradoxo aqui... é tão simples quanto isso.

Por outro lado, a questão das 10 semanas e das 24 faz sentido. Porque se vencer o Sim da pergunta do referendo "Concorda com a despenalização da IVG quando realizada até às 10 semanas por opção da mulher em estabelecimento de saúde devidamente legalizado" vai resultar inexoravelmente numa lei que despenaliza antes das 10 semanas mas penaliza daí em diante (mesmo mulheres em circusntâncias bem piores que as que abortaram até às 10 semanas), pelo que, quer queira quer não, este argumento está em jogo e em causa!

Finalmente vou fazer aqui um copy-paste de um comment que já coloquei noutro sítio. Peço desculpa pela repetição, mas cá se fazem cá se pagam…
“Nenhuma lei é absoluta, mesmo que se reja por um princípio absoluto. Deste modo, não se pode condenar por homicídio uma pessoa que agiu em legítima defesa! Também penso que não passa pela cabeça de ninguém defender a prisão de uns náufragos que tiveram que recorrer ao canibalismo para sobreviver! Isto porque as situações limítrofes têm tendência a erradicar toda a civilização e racionalidade na mente do Homem! As pessoas nesta situação cometeram homicídio? Sim! O homicídio é errado? Sim! Estas pessoas erraram? Sim! Devem ser condenadas? Não! Depois disto a Vida Humana continua a ser um valor absoluto? SIM! Isto é paradoxal? Sim, mas, por algum motivo, faz sentido nas nossas cabeças!
Vamos agora ver o outro lado das situações apresentadas: sabendo de antemão que tais pessoas nunca seriam condenadas por um juiz minimamente capaz, o que diria de indivíduos que, para salvaguardar estas situações de extremo, se organizassem num lobby para remover da Lei toda e qualquer referência ao homicídio? Resposta exagerada... e talvez um pouco suspeita...
Estariam as pessoas que não querem aprisionar as pessoas naquelas situações, incapacitadas moralmente para fazer frente a esse lobby? NÃO! Por isso, independentemente da posição sobre a lei actual, o que interessa é a posição sobre a lei a referendar, percebe? Porque, ao contrário dos adeptos do Sim, nós não vemos tudo em termos de preto e branco.

Chegado a este ponto, não percebo porquê tanta apreensão sobre a lei actual... para que me vou desdobrar em brigas com adeptos do Não que discordam de mim para defender os filhos de violação e com má-formações, quando está na calha uma lei que vai destruir filhos de violação + com má-formações + todos os outros de acordo com o capricho da mulher? Devo deixar a lei actual passar em tapete vermelho enquanto me esforço para apagar uma lei que, daqui a algum tempo, talvez já não exista? Para quê me vou estar a discutar as semanas com que um feto decorrente de uma violação pode ser abortado, se TODOS OS FETOS (de violação ou não) poderão ser abortados num futuro próximo dentro de um prazo que não faz o mínimo sentido? Parece-vos lógico? A mim não! Há duas posições do Não legítimas do ponto de vista ético e não vão ser elas que vão ser referendadas! Portanto, façam campanha pelo Sim, sff... se têm razão do vosso lado, exponham-na pura e simplesmente!”

Cumprimentos
 
Kephas,

Uma das coisas que sucede numa campanha é a exposição de ideias, e a ocultação de outras. É recorrente. Não é nada de novo. Os partidos políticos fazem-no a toda a hora. Objectivo: não afastar eleitores moderados para quem um certo "radicalismo", (e repare que coloco radicalismo entre aspas), é razão para votar ao contrário.
Parece relativamente consensual, que o argumento major do não, é existência de vida num embrião de 10 semanas (em boa verdade qualquer pessoa que tenha ido às aulinhas de biologia do liceu dá este ponto por adquirido, embora o entendimento de vida seja distinto. Por exemplo parece-me totalmente tautolóco referir que um embrião é vida humana. Pois se derivou de uma fecundação entre gâmetas da espécie humana, haveria ser o quê? É claro que a vida a que nos referimos é OUTRA (e aqui a biologia não ajuda nada). Mas isso é outra conversa)). Ora neste contexto a vida do não é um valor absoluto. Sendo absoluto, não podem (devem) existir desculpas que permitam abortos noutras circunstancias. O Kephas parece pelo teor do comentário optar pela coerência. Faz bem. O Gabriel do blasfémias publicou a este respeito um post quase exemplar em termos de coerência. Aquilo que tenho referido, é que não é possivel defender uma coisa e o seu contrário. Estrategicamente para quem está numa campanha (e o bloquedonao está), pode não dar jeito referir certos aspectos, que pela sua "radicalidade" (aspas outra vez) possam afugentar votantes indecisos. Repare que não faço qualquer julgamento moral da estratégia nem do conteúdo de ideias. Mas se o objectivo é a existência de uma campanha esclarecedora, então é meu (e pode muito bem não o dos outros) entendimento que estes aspectos devem "sair do baú" e discutidos cristalinamente. Apenas e só.

Cumprimentos

Ps: para o(a) ru. no comments.
 
Filipe Castro,

Ora neste contexto a vida do não é um valor absoluto. Sendo absoluto, não podem (devem) existir desculpas que permitam abortos noutras circunstancias.
Isto já foi explicado tantas vezes que não compreendo como alguém ainda pode insistir em "fazer confusão".

Como mero exercício, vamos supôr que é como diz: se se defende a vida, não se pode aceitar a morte sejam quais forem as circunstâncias.

Assim e para seguir o seu raciocínio, se não se aceita a morte do feto apenas por opção da mulher porque o feto é um ser humano vivo, também não se poderá aceitar a morte do feto em casos de violação, malformação ou mesmo perigo de vida para a mãe. Mas, naturalmente e porque o direito à vida não se pode limitar aos nascituros mas deve incluir também os nascidos, ser-se-á contra a pena de morte, contra alguém matar outro em legítima defesa e até, p.e., um polícia matar um terrorista que esteja prestes a fazer explodir uma bomba que matará dezenas ou centenas de pessoas.

Absurdo, não é? Pois o absurdo da sua argumentação conduz a que se vá ainda mais longe, já que "absoluto" também funciona no outro sentido.

Pelo que percebo do que escreveu, o Filipe defende que admitir o aborto p.e. em caso de perigo para a vida da mulher grávida implica necessariamente admitir o aborto a pedido, porque em ambas as situações se estará a matar o feto. Mas, admitindo que o feto é uma vida humana, então e para ser coerente, também se deve poder matar um ser humano nascido, não apenas em legítima defesa como por ciúmes, inveja, roubo, ou mesmo por mero divertimento.

É isto que significa para si "a vida ou é um valor absoluto ou não é"? É que, para os autores do blogue do não (e para qualquer pessoa com um mínimo de senso), o valor que se dá seja ao que fôr, incluíndo a vida humana, depende das circunstâncias. E, naturalmente, poder acabar com algo (p.e. uma vida humana) apenas porque sim é completamente diferente de o poder fazer para defender outro valor comparável.
É isto que tem sido repetido exaustivamente por várias pessoas (mais inteligentes e eruditas do que eu) e que o Filipe, vá-se lá perceber porquê, continua a não querer ver.
 
Joaquim Amado Lopes,

Do editorial do bloque do não:

" A vida humana é um valor em si mesmo."

No caso do aborto após violação, o mesmo é permitido até às 16 (16!!) semanas. Naturalmente, que é a pedido. É permitido porque lhe foi atribuido (a meu ver bem) uma valoração superior, comparativamente à vida intra-uterina.
Parece-me relativamente evidente que tal não é muito compativel com a frase inicialmente exposta.

Por outro lado, o Joaquim diz que o valor atribuido à vida humana depende das circunstâncias. Pois depende. E é exactamente por depender das circunstâncias que algumas pessoas acham que a actual lei deve ser mudada. Mas também me parece que não é isso que tem sido referido (coerentemente) aqui e por outros lados.

Mencionar que alguém não quer ver, ou atribuir falta de senso, não me parece um argumento para uma discussão que tem decorrido sem qualquer tipo de ofensa ou ironia.

Cumprimentos
 
Filipe Castro,

O aborto de uma gravidez resultante de violação pesa 2 valores: o do direito à vida do feto e o direito da mulher de não ter suportar a violência que seria levar tal gravidez até ao fim. Naturalmente que tem que ser a mulher a pedir o aborto. No entanto, nessa situação invoca um motivo que se considerou ser de força maior.
A alteração que se pretende é que não seja necessário apresentar nenhum motivo além do pedido e isso não é fazer o valor atribuído à vida humana depender das circunstâncias. É dizer que, até às 10 semanas, a vida do feto não tem valor nenhum.

Se se sentiu ofendido com algo que eu tenha escrito, peço desculpa. Mas continuo a não perceber como pode dizer que, bastando a mulher optar pelo aborto para se acabar com a vida do feto, o valor atribuído a essa vida depende das circunstâncias. É que, para mim, a mulher decidir abortar sem outro motivo além de ser essa a sua opção é dizer que a vida do feto não tem valor nenhum.
 
Caro Filipe Castro:
Já lhe disse a minha posição sobre o aborto terapêutico (contra, embora existam excepções óbvias como os anencefálicos, p.ex.). No caso da violação não tenho opinião formada, mas tenho a inclinação para pensar que essa categoria nem deveria existir, uma vez que recai na parte da "saúde psíquica da mulher"... tudo isto ainda associado ao facto de ela não ser imputável na concepção do filho (embora considere que dois males não fazem um bem).
Ou seja, eu não sou um extremista que anda para aí a pedir a prisão de todas as mulheres... sei que existem situações limítrofes. Coloco-me do lado do Não porque acho que a lei que vai ser referendada é que é extremista, perdendo-se desta maneira TODA a defesa dos direitos do feto.
Em suma: a Vida é um direito absoluto, mas nem sempre a destruição de uma Vida deve ser penalizada. Por outro lado, a Vida é, com toda a certeza, ABSOLUTA em relação à Liberdade.
Agora que já lhe expliquei a minha posição (apesar de achar que isto não tem nada a ver com o referendo), talvez possa fazer a gentileza de me explicar por que é contra o aborto a pedido até às 24 semanas, ou por que concorda com a convenção das 10 semanas (apesar de vexa achar que isto não tem nada a ver com o referendo).
Cumprimentos
 
Caro Filipe Castro:
Já agora aproveito para informá-lo que, se voltar a repetir o mesmo argumento noutro post, me absterei de o comentar.
Cumprimentos
 
Caro Kephas,

"..talvez possa fazer a gentileza de me explicar por que é contra o aborto a pedido até às 24 semanas, ou por que concorda com a convenção das 10 semanas (apesar de vexa achar que isto não tem nada a ver com o referendo)."

Aqui vai.
Na minha modesta opinião o feto assume verdadeira "identidade" de "vida humana" quando se torna independente ex-útero. É hoje relativamente simples assegurar a sobrevivência de naciturnos com 23/24 meses. Assim, parece no limite construir uma lei com um limite de 24 (volto a referir que na Inglaterra apesar do limite de 24 (que é controlodado por médicos e não a pedido como já vi aqui escrito) a grande maioria, MAIORIA, são efectuados antes das 10 semanas). Mas, porque não 15/16/17/18 bla bla? Por bom senso. No sim ou no não todos, TODOS, concordamos que fazer um aborto está longe de ser uma coisa boa. Assim, 2 meses e meio (1o semanas) são um bom compromisso entre uma prática que queremos todos evitar e a liberdade de decisão que devemos (temos) de conceder a quem está na posse da informação para decidir correctamente. Também por razoes de natureza biológica que não adianta especificar mas que são aspectos menores. Mas para que fique claro: conceptualmente a liberdade devia ser concedida até à independência do útero.

A talho de foice. O argumento da Vida tem sido apresentado como factual. Não é. Sob o ponto de vista biológico é claro que é. Mas isso sabemos todos de há muito muito tempo. O problema coloca-se, portanto sob o ponto de vista filosófico, moral, cultutral e de civilização.
E.g. se eu matar uma pessoa na rua por vingança, serei condenado a uma pena, que variando entre países, ainda assim será penalmente analisada em qualquer país do planeta. Corolário: culturalmente a espécie humana penaliza de forma inequivoca o crime de assassinio. Comparando com o aborto a conclusão é simples. Não é de todo líquido que a atribuição de estatuto de pessoa humana ao embrião/feto seja consensual à escala global. Há países que o fazem, outros que não. O consenso civilizacional ainda não foi atingido. Portanto, quando doutas opiniões se exprimem sobre o assunto dando-o como resolvido, estão a cometer óbvia falácia.

Cumprimentos
 
Caro Filipe Castro:
Desde já aproveito para saudá-lo por finalmente ter assumido a sua posição. Penso que, neste post(ao contrário do que se passa noutros posts e não me refiro propriamente a si) conseguiu-se efectivamente estabelecer-se um diálogo racional e que discute verdadeiramente o que está em causa.
E saúdo também o facto de ter um conceito de vida devidamente fundamentado, que não é cientificamente falacioso e que não é só baseado em motivos de conveniência. De resto, também me arrogo o direito de prosseguir esta conversa, antes que ela desapareça de vez.

1) Não concordo com o conceito de independência ex-útero porque também existem muitos seres humanos sem capacidade de autonomização e que não deixam de possuir direitos. A nossa sociedade pragmática tem tendência, todavia, a não lhes prestar o devido apoio devido ao incómodo e improdutividade que acarretam. Acho que a evolução está em permitir uma maior humanização destes indivíduos e não na continuidade deste pragmatismo desumanizador. Cá está um argumento filosófico, moral e civilizacional.
Por outro lado, esse conceito de independência estará subordinado dos avanços tecnológicos no suporte de vida dos prematuros e, portanto, é bastante lábil. Se um dia fôr possível a criação de uma incubadora que permita a um feto de 9 semanas sobreviver ex-útero, estes tornar-se-á humano, apesar de não existirem diferenças conceptuais entre esse feto e um feto de 9 semanas no actual estadio de conhecimentos?

2) O facto de as 10 semanas serem um bom prazo para permitir a decisão da mulher, não significa que eu considere que ela tem direito a optar. Sobretudo porque "TODOS concordamos que fazer um aborto está longe de ser uma coisa boa". Mas aqui já entramos no domínio do conceito de Liberdade, sobre o qual obviamente temos visões distintas. Eu, pessoalmente, penso que um indivíduo não tem o direito de tomar a decisão eticamente errada.

3) O consenso também não é, na minha opinião, um factor preponderante. Não é verdade que exista um consenso mundial sobre o homicídio. Na Malásia existe o Amok, um ataque de raiva em que o indivíduo mata todos os que vê em seu redor até ser morto, por sua vez. Não se trata de insanidade e sim de uma variante transcultural, uma vez que o Amok (ou equivalente) não existe noutras partes do Mundo. Todavia, nem o indivíduo que comete o Amok, nem aqueles que o matam são julgados ou condenáveis pela sociedade.
Poderá afirmar que são resquícios e excepções que não fazem a regra. Então, devo relembrar-lhe que o consenso sobre os Direitos Humanos também existem há pouco tempo. Mesmo há menos de 100 anos, os nazis (e não pretendo aqui qualquer insulto, apenas expôr o meu raciocínio), achavam que os judeus podiam ser mortos porque eram "infra-humanos". O consenso nunca existirá se não se fizer um esforço evolutivo no sentido dos conceitos e da Civilização.

Faço votos para que prossiga com este debate.

Cumprimentos
 
Filipe Castro,

Na minha modesta opinião o feto assume verdadeira "identidade" de "vida humana" quando se torna independente ex-útero. É hoje relativamente simples assegurar a sobrevivência de naciturnos com 23/24 meses. (suponho que pretendia escrever semanas)
Finalmente, um critério explícito. Que, no entanto, levanta algumas questões.

Admitir o aborto a pedido até às 10 semanas (p.e.) é reconhecer à mulher o direito a decidir sobre si própria. Assim, chegadas as 23/24 semanas, a mulher continuará a manter o direito a decidir sobre si própria, tendo agora o direito de optar não pelo aborto mas pelo parto prematuro provocado. Afinal, já será "relativamente simples assegurar a sobrevivência" do nascituro. Concorda?

No entanto, o parto prematuro não é isento de consequências. Mesmo sobrevivendo, é muito provável que a criança venha a sofrer de algumas deficiências, maiores ou menores. Além de que não é possível "assegurar" a 100% a sobrevivência da criança, pois não?

Assim e caso concorde com o direito da mulher a optar pelo parto prematuro provocado, qual a sua resposta a essa opção ter sido feita e a criança acabar por morrer ou vir a desenvolver sérios problemas de saúde?

Se não concorda com o direito da mulher a optar pelo parto prematuro provocado a partir das 23/24 semanas, quer isso dizer que acha que a mulher deve ser obrigada a levar a termo uma gravidez que não deseja e que, segundo a Ciência, não é necessária para assegurar a sobrevivência do feto?
 
Caro Filipe Castro:
É caso para dizer que és um granda urso! lê o post! e muda de argumento! hehehe!
 





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