Lições de uma sondagem


O Expresso publicou ontem uma sondagem que atribui 52,5% de intenções de voto no referendo de 11 de Fevereiro ao "sim" e 47,5% ao "não".
Esta sondagem mostra duas coisas.
Em primeiro lugar, uma recuperação do "não", depois das sondagens iniciais que lhe atribuíam cerca de metade das intenções de voto do "sim" (se bem recordo, 30% para 60%, mais coisa menos coisa). Uma recuperação espectacular, mas não supreendente. Era de prever que os números mudassem com o avanço da campanha e o esclarecimento das pessoas. Nas anteriores sondagens, foi bastante sublinhado um aparente paradoxo: a larga maioria tende a responder favoravelmente à pergunta do referendo, mas está contra a liberalização total do aborto até 10 às semanas. Como as duas coisas são a mesma, o "não" fez bem em insistir nesse ponto. Além disso, a campanha do "sim" está fortemente politizada e dividida, o que afasta votos. Quando Edite Estrela e Jerónimo de Sousa afirmam que uma vitória do "não" é uma derrota dos respectivos partidos, marcam um golo na própria baliza. Sobretudo se o próprio Sócrates vem garantir depois, como fez ontem, que a campanha não deve ser partidarizada. Mas a medalha de ouro do génio táctico vai para João Teixeira Lopes, do Bloco de Esquerda, que conseguiu ao mesmo tempo politizar e dividir com as suas críticas ao "sim" de Rui Rio. Simplesmente brilhante. Corrigiu o tiro no dia seguinte, mas nós agradecemos.
Em segundo lugar, uma análise mais atenta dos resultados mostra que o "sim" vence à vontade em Lisboa (59,7% contra 25,4) e no Sul (57,8 para 24,4), mas com pouca folga no Porto (43,4 para 40,9). E perde claramente no Centro (35,8 para 48,7 do "não") e no Norte (26,7 para 55,5 do "não"). Ou seja, há uma nítida bipolarização do país: as grandes cidades do litoral e os feudos do PCP votam "sim", o campo e o interior (ou o que resta deles) acima do Tejo votam "não" - com as ilhas, acrescente-se. O que também não é nenhuma surpresa. Sempre foi este o mapa eleitoral do pós-25 de Abril, marcado pela mítica fronteira de Rio Maior, e só os nossos tempos pouco ideológicos o vieram alterar - embora o referendo de 98, precisamente, o tenha repetido.
Por outras palavras, a vantagem do "sim" na comunicação social, sobretudo nos jornais (o DN tem sido inexcedível) e nas televisões (RTP e TVI...), significa apenas que a esmagadora maioria dos jornalistas e opinion makers vive no eixo Lisboa-Porto. Para lá da A1, existe um país inteiro, a que tantas vezes se chama real, que pensa de forma diferente e onde pasionarias e iluminados não têm grande saída. É isso que explica a "multiplicação" dos movimentos pelo "não", muitos deles vindos do Norte, de âmbito regional e sem nomes sonantes. O nervosismo que a coisa provocou em Helena Matos e Ana Sá Lopes, ambas bastante mais lúcidas do que é comum entre os defensores do "sim", justifica-se inteiramente. Eu, se estivesse do outro lado, também estaria inquieto.

Comentários:
30% para 60% é 1/3 das intenções de voto.
(30/90=1/3...mais coisa menos coisa.)
 
É verdade. Não falei dos ns/nr. Tirando isso, qual é a dúvida?
 
SIM - Despenalização e legalização do aborto até às 10 semanas.
Continua a ser crime e a serem julgadas as mulheres quando abortam depois das das 10 semanas. Continua o aborto clandestino. A banalização do aborto faz aumentar de forma exponencial a sua prática e é um factor que ajuda a reduzir ainda mais a baixa natalidade portuguesa.

NÃO - Estão contra a morte de um filho pela própria mãe. A prisão da mãe não é tão forte como a morte do filho. Os milhões que o Estado prevê para fazer abortos (dinheiro de todos os cidadãos) deve ser canalizado para ajuda das mães grávidas, para evitar ou dissuadi-las de enveredarem pelo genucídio do aborto.
 





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