Postas Pescadas - II

De Leonor Rogado, bióloga, que acompanha activamente a campanha e o BdN a partir da Alemanha, recebemos este testemunho:
A pergunta do referendo no fundo engloba várias questões, o que a meu ver é grave porque baralha as coisas: 1 a despenalização das mulheres; 2 a despenalização de quem se dedica ao negócio (deste modo o aborto clandestino vai continuar e até aumentar porque muitas continuam sem querer dar o nome no Serviço Nacional de Saúde); 3 a liberalização total e absoluta do aborto até às 10 semanas sem necessidade de invocar quaisquer razões (o que torna as mulheres muito mais vulneráveis às pressões dos familiares e entidades patronais); 4 a obrigatoriedade do estado em financiar o aborto (em detrimento de outros tratamentos médicos à população em geral, que como sabemos já é muito mal servida).
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Porque é que estou contra ? A questão fundamental é porque desde a concepção que está ali uma pessoa, seja ela perfeita ou não, seja ela desejada ou não. Não temos o direito de a matar em qualquer circunstância, no meu entender nem mesmo no caso de violação. Para mim o aborto só se devia praticar em caso de risco de vida para a mãe. O aborto também não é um método de contracepção. Não acredito que haja alguém que não saiba, hoje em dia, que pode engravidar se tiver relações sexuais. As pessoas arriscam e pensam que não vai acontecer com elas e assim continua a desresponsabilização.

No entanto sei que é impossível impor esta posição, que seria a ideal, pois a maioria das pessoas vê as coisas do ponto de vista imediato.

O que acontece se o Não ganhar ? Mantém-se a lei actual que, embora como já disse, não seja para mim a lei ideal, é uma lei equilibrada.

Em primeiro lugar o que acontece às mulheres ? A lei actual prevê para as mulheres que praticam aborto a pena máxima de 3 anos. No entanto, apresenta várias excepcões: mal-formação do feto, violação, risco de vida para a mãe e risco de saúde incluindo a saúde psíquica, o que permite invocar um leque muito grande de razões. Uma mulher que neste quadro jurídico se proponha abortar falará do seu problema com os técnicos de saúde que na situação desejável a tentarão ajudar a ponderar. Nao tenho a certeza que isto funcione da melhor forma mas pelo menos é melhor do que fazer as coisas a despachar e sem qualquer reflexão.
O que tem acontecido às mulheres que praticam aborto clandestino ? À portuguesa, muito poucas foram julgadas e tanto quanto sei nenhuma foi incriminada. Portanto todo esse alarido à volta das mulheres é desproporcionado. A lei actual confere assim maior protecção ao feto.

O que acontece a quem se dedica ao negócio ? Aqui a lei actual tem mão pesada e a meu ver muito bem. Pois se as razões para provocar aborto legal são bastante abrangentes não se justifica o aborto ilegal. E as parteiras, essas sim, põem de facto em grande risco, se não a vida, pelo menos a saúde física e psíquica das mulheres.

Também não concordo que o Estado pague a quem fazer o aborto só porque sim.

A nossa lei actual é semelhante à que existe pelo menos em Espanha e Alemanha. A que se pretende aprovar que eu saiba não tem paralelo na Europa.

Eu também não consigo julgar uma mulher que pratique aborto. Se alguém viesse ter comigo com esse problema, tentaria demovê-la de fazê-lo e tentaria ajudá-la o mais possível. Se mesmo assim persistisse e o fizesse, nem por isso deixaria de lhe oferecer apoio e amizade. Esse caso nunca se me apresentou directamente. Provavelmente conheço algumas que o escondem de tudo e de todos porque particar aborto é mesmo uma coisa traumática. Por outro lado, conheço várias mães solteiras que tiveram a coragem de continuar com as suas gravidezes e nenhuma se arrependeu, por mais difícil que tenha sido a situação. Todas estão contentes com as suas crianças, mesmo que actualmente a vida lhes seja difícil. Uma parte delas casou com outros homens que perfilharam as crianças como suas.

A vida tem muito mais saídas que a morte, que é irremediável.

Por tudo isto voto NÃO no dia 11.

Comentários:
Parabens a este blog!

Muito bem feito.
 
Acerca do ponto 2), pelo contrário: neste momento, vale tudo; com esta alteração, passa a estar escrito que é possível SÓ em estabelecimentos autorizados.
 
Sr. Fuckitall: acredita portanto que as parteiras "de vão de escada" e as clinicas que praticam abortos a qualquer altura vão magicamente desaparecer dia 11 caso o "sim" ganhe?
 
fuckitall,
SÓ em estabelecimentos autorizados, mas sempre que nos apetecer, sem ter de dar cavaco, pago por todos, e a ignorando que ali está um indivíduo humano.
 
Um comentário encontrado em http://antiaborto.blogspot.com

«O argumento de que o corpo é meu, portanto eu faço o que quero é pura e simplesmente falacioso.
Investiguem com mais detalhe, mas a dica fica aqui: Se quiser doar um rim à sua prima, ao seu namorado, ou tio; NÂO o pode fazer. As doações que não passam pelas listas de espera, são apenas as doações entre familiares directos. Ou seja de pais, para filhos, de mulher para marido, ou entre irmãos.
Inacreditável como se pode ser inconsciente ao ponto de dizer que no meu corpo mando eu!!!
Se bem que um embrião, um feto, ou uma coisa humana, não são o corpo da mulher, mas apenas um "hospede" de 9 meses.»
 
Muitos Parabéns!
O blog está excelente: o aborto NÃO pode ir para a frente!
 
PORRA! mas vocês não percebem o que vos dizem?
O Sr. fuckitall só está a dizer que a "Srª Leonor Rogado, bióloga, que acompanha activamente a campanha e o BdN a partir da Alemanha" está equivocada quando diz no seu ponto 2 que a pergunta ENGLOBA "a despenalização de quem se dedica ao negócio" a pergunta diz precisamente o contrário! Não está a dizer que vai desaparecer o aborto clandestino!

Já agora... dêem-me os parabéns... pelas minhas contas devo fazer anos por esta altura… já que nasci a 1 de…. OUTUBRO!
 
Querem maior estupidez do que assumir a estupidez do outro...?
Precisamente porque o aborto clandestino não vai acabar, nem mesmo antes das 10 semanas, é que a bióloga, no seu ponto 2, chama a atenção para o facto da pergunta englobar "a despenalização de quem se dedica ao negócio". O que não deverá acontecer em hipótese alguma.
E agora, percebeu, anónimo das 3:54?
 
É fantástico verificar a postura dos defensores do sim.


Senão vejamos a psotura da nossa "amiga" fuckittall, que para vir aqui ao BdN rebater os argumentos do não usa este nickname, mas para fazer parte de um blog que apoia a sim, usa o seu nome própri, ou seja Inês Meneses.

Por mais que tente compreender o que motiva uma pessoa a assumir diferentes identidades a única explicação que me vem á cabeça é que tem uma postura consoante o sítio onde está. Faz-me lembrar as pessoas que só cumprimentam de vez em quando, e dependendo do sítio onde estão.

Nunca gostei deste tipo de postura pois releva que só se assumem as coisas conforme as conveniências.

Mas pensando bem, é isto que defendem no "sim", agir mediante a conveniência...

Cara Fuckitall, parabéns pela sua coerência!

PS - Só um pormenor que talvez a possa ilucidar:_ o que está em causa é mesmo uma 3ª vida e não um estilo de vida em que a mulher pode optar só porque sim. Torna-se irrelevante quem decide pois o que importa é que não pode haver sequer a ponderação sobre acabar com uma 3ª vida só porque sim
 
Não acredito que o vão de escada desapareça; mas continua ilegal. O que se legaliza é só o aborto feito em estabelecimentos autorizados. Não é em qualquer lado. Foi só isso que comentei.

Mas aproveito para dizer a/ao kiko que o aborto para a frente já vai, a questão é em que condições. A questão é se lutamos contra o mercado clandestino, portanto totalmente livre, do aborto, que é o que temos, e contrapomos um aborto em condições devidamente controladas.

E sou mulher, já agora.

Inês Meneses, aka FuckItAll
 
cara inês menezes (aka o que quiser, quando quiser, para quem quiser e, já agora, quando quiser)

Depreende-se que o seu voto sim não visa acabar com o aborto clandestino. Ora, como o aborto em estabelecimentos autorizados já é permitido, em algumas situações, o seu voto sim pretende apenas que as "excepções" sejam alargadas.
É isso?
 
Inês Meneses: suponho que ouviu, como eu, o Sr. Ministro da Saúde a dizer que quem não se quiser identificar não poderá fazer abortos no SNS. Pelo que suponho que concluiu, como eu, que o aborto clandestino continuará.
Posso deduzir, do que disse aqui em cima, que considera que essas mulheres(aquelas que não podem ir a Espanha e não têm dinheiro para clínicas privadas) devem ser penalizadas?
Espere, espere, então... repita lá tudo outra vez: afinal por que é que vota sim?
IF
 
Mas pode ter a certeza que diminui... pelo menos deixa de encher tanto os bolsos aos medicos que os fazem nas suas clinicas privadas.
 
Não concluí nada do género. As declarações do enhor ministro foram irresponsáveis, mereceram crítica da Ordem dos Médicos, e eu comentei-a na altura no meu blog.

(acho extraordinário que me interpelem e depois censurem a minha resposta, mas vocês é que sabem)
 
Ka, uso este nick há anos, e há muitos meses no meu blog pessoal.

Desde sábado, porque estou a participar num blog alargado, assino lá com o meu nome oficial, que está linkado para o blog onde assino FuckItAll. E fiz anúncio público, como FuckItAll, disso mesmo.

Vocês compreendem a diferença entre um pseudónimo, devidamente identificado e linkado, e estar anónimo? Ou não querem perceber?
 
fuckitall,
Não acredito que o vão de escada desapareça; mas continua ilegal. O que se legaliza é só o aborto feito em estabelecimentos autorizados. Não é em qualquer lado.
Ou seja, a despenalização do aborto a pedido não é para combater (e muito menos acabar) com o aborto clandestino. Só para que fique claro que a fuckitall chama mentiroso ao Senhor Primeiro-Ministro.

Interpretei bem as suas palavras?
 
fuckitall,
Não acredito que o vão de escada desapareça; mas continua ilegal. O que se legaliza é só o aborto feito em estabelecimentos autorizados. Não é em qualquer lado.
Ou seja, a despenalização do aborto a pedido não é para combater (e muito menos acabar) com o aborto clandestino. Só para que fique claro que a fuckitall chama mentiroso ao Senhor Primeiro-Ministro.

Interpretei bem as suas palavras?
 
Não, não interpretou; e francamente, porque não o tomo por pouco inteligente, duvido que numa leitura calma do que escrevi seja mesmo isso que retira.

Ninguém tem a veleidade de achar que há varinhas de condão para acabar com o aborto clandestino, por isso não acredito que acabe; mas será certamente muito diminuído se as mulheres puderem dirigir-se ao sistema de saúde, se puderem receber informação e apoio sem medo. Porque quem está a ponderar abortar, enquanto o aborto for ilegal, não irá chamar a atenção para o facto de estar grávida. Assim, despenalizar é criar condições (1) para quem quer de facto ter o filho mas não tem condições receber apoio e informação que lhe permitam reconsiderar, e (2) para quem de facto não tenciona tê-lo fazer aborto em condições mínimas de segurança.

Em suma, esta alteração não vai acabar com o aborto clandestino, mas vai combatê-lo muito; não vai certamente acabar com o aborto, mas vai dar oportunidade a pessoas que abortariam se não tivessem contacto com o sistema de reconsiderar a sua decisão.

Expliquei-me?
 
Fuckitall,

Quando ouço a expressão "o problema do aborto clandestino" fico sempre na dúvida se quem a usa vê o problema no aborto propriamente dito ou apenas no facto de ser clandestino.

Há quem diga que o aborto em si é um problema mas que irá sempre existir. É verdade. O aborto (clandestino ou não), tal como a pedofilia e os maus-tratos a crianças, irá sempre existir. Mas, como não vejo ninguém a propôr a despenalização da pedofilia ou dos maus-tratos a crianças, não vejo como isso possa ser um argumento.

Vai reduzir o número total de abortos? A experiência e o senso comum demonstram que não. Que a despenalização do aborto a pedido tem como consequência o aumento do número total de abortos, em alguns casos de forma brutal. Que é a informação e educação social, o planeamento familiar e o apoio social que reduzem o número de abortos.
Vai reduzir o número de abortos clandestinos? É provável que sim. Mas faz sentido que, para atenuar marginalmente um problema, se aumente dramaticamente outro?

Assim, quem defende a despenalização do aborto a pedido, necessariamente vê o problema em ser clandestino, não no aborto em si.
Considerando o que é um aborto (acabar com uma vida humana), as consequências directas (a nível psicológico, p.e.) para quem aborta, a promoção que representa da desresponsabilização pelas consequências de comportamentos que dependem de escolhas pessoais e as consequências sociais da desvalorização objectiva da vida humana, não compreendo como alguém se concentre no "clandestino" e não no "aborto".

O Estado não devia desistir. O Estado não devia demitir-se das suas responsabilidades. A vida humana, mesmo a de quem ainda não se pode manifestar e depende totalmente de outro ser humano, não devia poder ser acabada apenas pela "opção" de alguém, sem outras razões além dessa. Pelos vistos, uma parte dos portugueses não concorda comigo.
 





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