Vamos Falar de Ciência?

Meus senhores e minhas senhoras, dispamo-nos de preconceitos, e ouçamos uma especialista em Medicina Fetal pronunciar-se: a Dra Marina Correia do Vale, autora da recolha da ecografia 4D que já publicámos. Ela apresenta-se convictamente a favor do Não. Mas espero que isso não impeça nem os mais radicais defensores do Sim de «ouvir» os seus argumentos:
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Sou médica, ginecologista obstetra e nos últimos dez anos tenho-me dedicado à nova especialidade emergente, a medicina fetal (www.fetalmedicine.com). Os meus dias são passados a ver fetos, como o pediatra vê crianças. Tenho por eles um profundo respeito, pois desde cedo percebi que a relação médico-doente que se impunha nesta especialidade, se envolve de contornos diversos da relação médico-doente corrente. O feto nunca nos pede para ser visto, ou tratado, limita-se a revelar-nos sinais ténues do seu bem-estar, que muitas vezes, só um escrutínio clínico muito atento permite identificar. Vejo-os desde os seus 4mm de tamanho, quando ainda são reduzidos, pelas imagens da tecnologia moderna do ultra-som, a pequenos pontos brancos em fundo escuro, mas onde já oiço o seu coração. Vou acompanhando a sua evolução e por último alguns meses depois (34 semanas depois da primeira vez que os vi) oiço o seu primeiro, desejável e estridente choro. Esta evidência da continuidade de vida intra-uterina, com a extra-uterina, é tão clara para mim, que quando os vejo pela primeira vez no ecrã do meu ecógrafo, já os imagino de chucha na boca, porque é isso que invariavelmente lhes sucede 7 meses depois.
Reconheço que amar e respeitar o ser humano no abstracto, é um exercício ético difícil, mas o embrião, ou o feto, assim o exigem. É mais fácil defendermos o que tocamos, o que grita como nós, o que se defende com códigos conhecidos, de igual para igual, e expressa a sua vontade – por esses lutamos com a certeza de que nos reconheceram.
Várias coisas se modificaram nos últimos anos:
1) Franca melhoria dos cuidados de saúde materno-fetais e infantis, que corresponderam a uma franca diminuição da mortalidade materna e infantil. Hoje as crianças concebidas têm franca possibilidade de chegar à idade adulta e o risco de uma gravidez para as mães, não é o mesmo do dos séculos passados. Criança concebida, criança nascida, é uma quase total certeza nos dias de hoje.
2) O acesso à anti-concepção e as técnicas disponíveis, está hoje longe da realidade dos anos 60 /70 /80 em Portugal. Desde o último referendo, houve um incremento substancial, com a introdução da pílula do dia seguinte, em que qualquer jovem ou mulher pode ter uma relação esporádica e por isso não protegida, e agir sobre ela à posteriori, recorrendo à venda livre nas farmácias da pílula do dia seguinte.
3) O aumento da taxa de desemprego, ou ainda o aumento do emprego precário entre os mais jovens, e o desinvestimento do estado na segurança social. Um patronato pouco sensibilizado para a maternidade, que condiciona as mulheres no mercado de trabalho, e que tem dificuldade em assumir a maternidade, como um direito, esse sim, inquestionável.
4) A crescente visibilidade do feto como outro igual, que nos é oferecida pelas novas tecnologias e que não nos permite, em consciência, ignorá-lo, mesmo para aqueles que precisam de ver para crer.
Sou uma acérrima defensora da autonomia, entendo que o fim último da nossa existência, o que verdadeiramente nos separa dos outros animais, é exactamente a capacidade para alcançarmos uma autonomia plena, fruto de uma consciência verdadeiramente livre. Mas esta autonomia consciente e racional diferencia-se da autonomia animal irracional, na medida em que nos permite aceder ao bem e ao mal, em consciência, e escolher livremente, porque conscientemente, entre o bem e o mal. A autonomia não é um direito do ser humano, é um dever que está inscrito no Genoma de toda a humanidade e é o resultado prático da acção da consciência, característica estritamente humana.
A ética é um conjunto de comportamentos biológica e evolutivamente seleccionados, que foram permitindo ao longo dos tempos, a sobrevivência da sociedade humana. O homem é eminentemente um ser social, e depressa percebeu que só em sociedade sobreviveria, e o nível elevado da sua capacidade de comunicação, fruto da consciência apurada do mundo que o rodeia, permitiu-lhe criar códigos de comunicação social, excepcionais e verdadeiramente superiores aos dos demais animais, conduzindo ao sucesso indiscutível das sociedades humanas sobre as outras sociedades animais. De uma forma simplista, é mau o que prejudica a sociedade, é bom o que beneficia a sociedade.
O desenvolvimento humano, da primeira célula ao adulto, à semelhança de todos os processos biológicos, é caracterizado pela continuidade, não se podendo estabelecer momentos definitivos e demarcados no desencadear de todo o processo, porque, uma vez iniciado, cada momento é imparável e consequente, dinâmico e teleológico, confluindo para um fim, o de estabelecer a vida para continuar a Vida. Não tenho a certeza, nesta fase do conhecimento, de que o ser humano tenha inicio na concepção ou fecundação, mas em contrapartida, até à data, é para mim certo que o aparecimento do indivíduo, no sentido da unidade e unicidade, coincide com o aparecimento da linha primitiva no final da nidação (14ºdia pós-fecundação). Para trás, da fecundação à nidação, não encontro dados que me possam garantir a sua existência, enquanto indivíduo, que não seja o seu único e irrepetível código genético, mas igualmente não tenho nenhuma prova da sua inexistência; por isso, e porque sempre assumo a minha humilde e limitada condição humana, no que respeita à omnisciência, prefiro dar lugar à duvida e assumir que, até prova em contrário, a vida humana começa com a fecundação.
Assim, os pressupostos de que parto são:
A autonomia é um dever, e tem como fim último a escolha livre entre o bem e o mal.
A vida humana tem carácter individual desde o início, e seguramente desde o 14º dia após a fecundação.
O embrião, o feto, a vida humana intra-uterina, não é um projecto de vida, não é uma potencialidade de vida, porque ela é, sim, uma vida em trajecto, trajecto para um fim ultimo, atingir a autonomia plena, e só é plena a autonomia embebida de uma consciência livre, ditada pelo dever de ser Homem.
Abordemos o dever da mulher, que não se encontra em trajecto para a autonomia como o feto, mas está já na posse dessa autonomia plena. Concordo que a mulher é dona do seu corpo. Hoje, a mulher dispõe de várias formas, de, no gozo pleno da sua autonomia, vigiar e controlar o seu corpo, para não o colocar à disposição de um terceiro, que o ocupe. Sermos donos de algo significa que tomamos conta desse bem e dispomos dele como entendemos, mas sempre com a responsabilidade de não prejudicar terceiros. Isto significa que ser dono confere o direito da posse, mas igualmente o dever responsável de gestão do que possuímos. Por exemplo, quando somos donos de uma empresa, temos direitos de propriedade sobre ela, mas temos o dever de a gerir bem, de forma não danosa, evitando colocar em risco todos os que dela dependem. A gestão danosa, portanto, é motivo para retirar a tutela da empresa ao seu dono. No século XXI, ser mulher em pleno gozo da sua autonomia é seguramente tudo fazer ao seu alcance, para evitar uma gravidez não desejada. A mulher do século XXI tem o privilégio de dispor de múltiplas e eficazes ferramentas de gestão do seu corpo, no que respeita ao pleno gozo da sua autonomia reprodutiva. Estudos demonstram que a maior parte das mulheres que abortam está no intervalo etário dos 17 aos 37 anos, e não se encontravam a fazer anti-concepção, na altura em que engravidaram. É a mulher que, ao não gerir convenientemente a sua propriedade, a deixa livre para ser ocupada por um terceiro, que não faz mais, do que cumprir o dever de se desenvolver, no sentido da sua própria autonomia. (Há excepções, mas não se fazem leis para excepções.)
A interrupção voluntária da gravidez, aborto, é uma interrupção consciente de um trajecto de um nosso semelhante, no sentido da sua autonomia, fim último da existência humana. Autonomia é o estádio do desenvolvimento humano que, uma vez atingido, permite ao Homem ser o único animal à face da terra capaz de decidir de forma consciente, e por isso verdadeiramente livre, entre o bem e o mal. Abortar é impedir que o nosso igual, sempre fruto do exercício da nossa autonomia sexual, conclua o seu trajecto para a sua própria autonomia, fim último da sua existência, na sua qualidade de humano.
Não pode uma sociedade justa aceitar, e espelhar nas suas leis, que à força do dever que o embrião ou feto contém em si mesmo de se desenvolver até atingir o fim último da sua própria existência, tornar-se adulto autónomo e conscientemente livre, se sobreponha a autonomia de uma mãe que não soube em tempo adequado salvaguardar os deveres de gestão do seu corpo.
A sociedade e o estado moderno (pós-revolução francesa), chamam a si a responsabilidade de zelar pelos direitos dos mais frágeis. É um direito inviolável do embrião o de cumprir o seu dever genético, construir-se como Homem.
A lei que criminaliza o aborto é uma lei de protecção à maternidade, e é porque ela tem sido lida desta forma pelos tribunais, que não tem havido mulheres presas, pela violação da lei, e isto não é uma hipocrisia, mas tão somente uma forma muito sensata de decisão dos nossos tribunais, baseada na mediação deste conflito entre mãe e filho, e que espelha aliás o querer dos portugueses.
Seria óptimo que a pergunta do referendo fosse sobre descriminalização, mas não é. Só nos foi dado a escolher a despenalização.
As indicações da ONU para o combate ao aborto clandestino, substituindo-o pelo aborto assistido em meio hospitalar, dirige-se aos países do Terceiro Mundo, porque para países com o grau de desenvolvimento como o de Portugal, o que está indicado é um forte investimento na prevenção da gravidez não desejada.
Só a resposta do não nos permite defender o filho e proteger as mães. Isto é, reunir mais esforços na prevenção das gravidezes não desejadas, e tornar desejadas, as que o não são por motivos socioeconómicos.
Ser desejado não é condição necessária para ser feliz, mas existir, é.
Os outros não existem para satisfazer o nosso desejo, mas porque têm uma agenda própria e única, como fins em si mesmos.
Portugal precisa de um incremento de solidariedade e de compromisso social.
Portugal tem a oportunidade de não de ser o último a dizer sim, à legalização do aborto livre, mas o primeiro no séc. XXI, a dizer não, porque estou convicta de que outros se lhe seguirão.
Pela salvaguarda da autonomia de todo o meu semelhante, na esperança de que a solidariedade entre as autonomias plenas e responsáveis defenda e proteja a autonomia dos mais frágeis, construindo um mundo melhor, voto NÃO.
Tenho um sonho! Que o século XXI, seja o século dos direitos do feto, e por esse sonho me baterei até ao fim. À semelhança dos descobrimentos onde abrimos pontes, da Europa para o desconhecido de outras civilizações, acredito que, mais uma vez, podemos abrir pontes ao encontro de nós próprios, na nossa alteridade máxima, que se constitui como o princípio de cada um.

Comentários:
então e os direitos aos embriões congelados? ninguém fala nisso?
cada vez mais escandalizada com os argumentos do Não.
Já não bastava os negros e brasileiros do post mais abaixo...
 
Pelos visto não é só no blog sim ao referente que não permite contraditório, o post de joão távora acabou de lhe seguir o exemplo...
que tal seguir outros exemplos tb?
 
Para a Rute:

Notícia da Rádio renascença de 06-06-2006 0:00

As assinaturas e o referendo

Foi há dias entregue no Parlamento o primeiro pedido popular de referendo da nossa história constitucional.

Cerca de 80 mil portugueses solicitaram a realização de um referendo sobre a procriação medicamente assistida.

Algumas técnicas que a ciência oferece para ajudar a ter filhos suscitam graves problemas de ordem moral.

É o caso da instrumentalização de embriões humanos ou da possibilidade de uma criança ter um pai biológico desconhecido.

Daí o pedido de referendo, certamente discutível, mas legítimo.

A maioria dos deputados preferiu, porém, ignorar o pedido de referendo e, logo após este ter sido entregue, aprovou uma lei sobre a matéria.

O que, sendo legal, é politicamente estranho, pois revela desinteresse pela vontade das pessoas.

Agora, alguns deputados levantam a hipótese de o pedido de referendo nem sequer chegar a ser apreciado na Assembleia da República porque - pasme-se! - a lei já foi aprovada.

Se tal acontecesse seria uma grave manifestação de má fé.

E poria em causa a possibilidade de, por iniciativa de cidadãos, se organizarem referendos.

Uma possibilidade prevista na Constituição mas que, na prática, seria assim desprezada da maneira mais cínica.

Esperemos que tal hipótese absurda se não concretize.

Até para evitar que o prestígio dos deputados sofra mais um rude golpe.

RR
 
Definitivamente, há gente do Sim que consegue arranjar ainda mais argumentos para o Não. Vejam AQUI!
 
"quando os vejo pela primeira vez no ecrã do meu ecógrafo, já os imagino de chucha na boca, porque é isso que invariavelmente lhes sucede 7 meses depois."

Ena, esta médica nunca teve grávidas com abortos espontâneos!
 
Confesso que em 98 votei sim, a informação que tinha na altura era insuficiente pensava somente num lado sem pesar o outro.

No entanto decidi que em 2007 haveria de ser diferente, haveria de me informar e de debater exaustivamente o assunto. Assim, ao contrário de 98, li, vi e aprendi o mais que pude sobre o aborto, li e vi imagens e actos que jamais mesmo que na maior das barbáries ousaria pensar serem possiveis pela humanidade. De certa forma nada para mim saiu mais afectado do que a fé que tinha na humanidade. Quero acreditar que ninguém se predispõe a matar uma vida inocente seja por D&A, D&C, D&E ou D&X... mas infelizmente não consigo! A Humanidade é capaz de coisas tais que fariam o próprio demónio corar de vergonha ou sentir-se um santo.

Se há algo que tenho a agradecer a este novo referendo é o de, em vida, poder corrigir o meu erro de 98 e votar desta vez pela razão e não pelos argumentos espalhafatosos, votar NÃO. NÃO ter os gritos silenciosos de almas apagadas na minha consciência. Obrigado àqueles que votaram contra mim nessa altura e peço-vos que me perdoem, não desistam e votem comigo desta vez.

Se me dizem que morreram 3 mulheres nos últimos 30 anos por aborto clandestino, o que é que isso abona? Se por hipótese se fizeram menos 10.000 abortos do que se fariam se este fosse legal e desses 10.000 poucos morreram em crianças, portanto o saldo mantêm-se positivo ao NÃO por pouco menos de 9.997 pessoas.

E essas abortantes, será que o fizeram até às 10 semanas? Só posso especular, em todo o caso pagaram com a vida um crime que sabiam ser arriscado. Porquê ter pena delas? Acaso quando um ladrão de alumínio fica pregado a um poste de alta-tensão alguém tem pena dele? Ou o aborto é assim tão mais aceitável que roubar?
 
E se uma grávida lhe disser: "eu não quero matar o feto, apenas quero que o tire cá para fora?"
 
Caro Anónimo:

Os abortos espontâneos não são o mesmo que abortos induzidos, é evidente.

Quanto a este post não se espere grande argumentação dos discordantes, eles estão mais no campo da filosofia e do subjectivismo.
 
Bruno: e... daqui a pouco vão proibir maturbação... tanta vida que se perde...

p.a:
há gente parva em todo o lado, vejamos um post abaixo com o titulo de "Modernices"
 
"Criança concebida, criança nascida, é uma quase total certeza nos dias de hoje."

vs.

"Cerca de 25% das gravidezes terminam em abortos espontâneos antes das 6 semanas, muitas vezes sem que a mulher tenha sequer conhecimento que estava grávida, depois deste prazo cerca de 8% das gravidezes terminam em aborto espontâneo." (Prospective studies using very sensitive early pregnancy tests have found that 25% of pregnancies are miscarried by the sixth week LMP (since the woman's Last Menstrual Period).[5][6] The risk of miscarriage decreases sharply after the 8th week, i.e. when the fetal stage begins.[7] Clinical miscarriages (those occurring after the sixth week LMP) occur in 8% of pregnancies.[6])
wikipedia - podem consultar as referências.
 
"Os abortos espontâneos não são o mesmo que abortos induzidos, é evidente."

que tem isso a ver? A Dra. Marina é que diz que "invariavelmente" as gravidezes seguidas por ela chegam a termo!
 
Inês:

Pensava que a esta altura da campanha já não havia dúvidas sobre o que é um espermatozoide e um embrião, mas pelos vistos ainda há pessoas que precisam de ser esclarecidas, informe-se, vai ver que depois de perceber já não vai poder justificar a si própria o seu voto no Sim senão com o argumento de que temos o direito de decidir que há seres humanos que conforme as circusntâncias tem mais valor que outros.
 
Resposta ao anónimo

"Hoje as crianças concebidas têm franca possibilidade de chegar à idade adulta e o risco de uma gravidez para as mães, não é o mesmo do dos séculos passados."

Bastava ter lido mais algumas linhas do artigo.
 
bruno: essa da ines é para mim????
já que não há nenhuma ines que tenha falado em maturbação calculo que seja para mim, por isso..
quando eu falo em maturbação, e como percebo que é inteligente, entendo que interpretou da minha resposta que cada vez mais andamos se olha para os primordios da vida, do feto, ao embrião, ao gametas até ao dia em que para além da igreja, tb o movimento Não aliado ao codigo penal, conderá não só mulheres como homens por praticarem a masturbação e utilizarem qq tipo de contracepção.

E desta forma, não entendo o porque da sua resposta...
 
Mais uma cientista com artigo publicado na Lancet? Ou esta já tem o prémio Nobel?

antonio
 
maturbação?!?
 
estamos num país onde a impunidade impera...
Tudo e todos, sem olhar a meios estão ao serviço da ideologia do poder...ai se fosse um gverno de direita o que não diriam os radicais de esquerda, os comunas, os frustrados do sistema marxista, os gays, as feministas radicais, os "padres" sem exercerem o ministério etc..vejamos mias umexemplo:
http://expresso.clix.pt/Dossies/Interior.aspx?content_id=377093&name=Referendo%20sobre%20o%20Aborto
 
Nobel, Nobel, com certeza em estudos a favor da despenalização!!!
 
PLN - leia o meu comentário das 3:13.
 
Apesar de já ter definido o meu sentido de voto no referendo do próximo dia 11 de Fevereiro, entendo que devo deixar um comentário para tentar exprimir a minha opinião sobre esta questão fracturante da sociedade portuguesa.

Todavia, importa desde já esclarecer que esta participação para demonstrar os meus argumentos é pontual e excepcional, uma vez que, e independetemente dos meus argumentos serem válidos ou inválidos, resultam de uma análise fria e ponderada sobre este assunto, análise essa que não é, e de modo algum, respeitada por inúmeros dos defensores do "sim".

Feita esta pequena introdução, um dos motivos que me levam a votar da forma que irei votar, é o facto de não ser atribuído qualquer direito a que o Pai da criança tenha direito na escolha.

Ou seja, atribuí-se única e exclusivamente à Mulher o direito de exercer ou não um direito, sendo que a opinião da outra parte interessada não tem qualquer relevância.

Outro argumento consiste no facto de Portugal não se resumir a Lisboa ou ao Porto. Imaginemos o seguinte caso hipotético. Após a vitória do "sim" no referendo a legislação é alterada no sentido pretendido pelos defensores do "sim", uma jovem desloca-se a um estabelecimento de saúde legalmente autorizado para realizar esse acto médico. Porém, e lá chegado, não o pode realizar uma vez que sente o peso por parte dos funcionários do hospital, dos membros da sua comunidade em realizar esse acto médico. Tem duas opções. Ou recorre ao estrangeiro ou recorre às situações ditas clandestinas.

Esta situação acarreta duas questões. O facto dos médicos poderem ser objectores de consciência, assim como o facto a sociedade de uma qualquer cidade, vila ou aldeia do interior ou litoral fora de Lisboa ou Porto condenar socialmente a mulher que realiza esse acto médico.

Porém, nunca vi qualquer menção dos defensores do "sim" a estas questões.

Paralelamente, entendo que o Estado, que e no fundo somos todos nós, não se deve demitir das suas funções sociais e assegurar que o aborto seja utilizado em último caso.

Por fim, entendo igualmente que o Código Penal e o Código de Processo Penal já possuem mecanismos para evitar que as mulheres sejam condenadas por praticar esse acto, assim como entendo que os homens são tão responsáveis como as mulheres, pelo que a Lei deverá igualmente penalizar os homens que induzem as suas mulheres, namoradas ou companheiras a praticar esse acto.

Obrigado
 
Argumento do pai - não sei porquê! Geralmente são eles que se auto-excluem!


Argumento da jovem provinciana - se não puder fazer na localidade por obj. consc. do médico, deverá ser encaminhada para outro (o distrital, p.ex.)

Não tenho tanta certeza do "condenar socialmente a mulher que pratica a IVG". E mesmo que sim a mulher tb não precisa de andar a badalar que o fez!

A sua consideração final não se percebe: já existem os mecanismos?? onde??
 
"Não tenho a certeza, nesta fase do conhecimento, de que o ser humano tenha inicio na concepção ou fecundação.." não tem? Mas devia. A fecundação é o início do tal "processo de continuidade" que menciona. Fusão entre gametas.
 
Caro anonymus,

Quanto ao pai, e principalmente por se auto-excluírem, e no âmbito da vigência da lei actual também devem ser responsabilizado, seja pela positiva ou pela negativa.

O seu papel não é meramente de procriação, mas sim o ter um papel responsável.

Paralelamente, e quanto à jovem de fora de Lisboa ou do Porto, (prefiro esta expressão, não tem uma carga pejorativa tão acentuada como "jovem provinciana"), apenas refiro que as mentalidades desses locais diferentes daquelas que existem em Lisboa ou no Porto.

Portanto, esta jovem poderá sentir-se pressionada a realizá-lo noutro local que não no estabelecimento de saúde da área da sua residência, ou então, e caso não possa, realizar de forma clandestina.

Relativamente à condenação social da mulher que pratica a IVG, é certa que existe!!!

Os mecanismos que existem estão previstos no Código Penal e no Código de Processo Penal, e poderão ser aplicados tanto pelo Ministério Público como pelo Juiz.
 
Caro Pedro,

Diga-me lá se faz algum sentido ter uma lei que está condenada a não ser aplicada!
 
Caro Anonymus,

Relativamente às mulheres que abortam não faz sentido absolutamente algum, não devem ser penalizadas.

Porém, e no que diz respeitos às médicos, enfermeiras, parteiras e outras que realizam esses actos médicos de forma clandestina, faz todo o sentido.

Espero ter respondido à sua pergunta.

Cumprimentos,
 
Artigo 140.º do Código Penal

3 - A mulher grávida que der consentimento ao aborto praticado por terceiro, ou que, por facto próprio ou alheio, se fizer abortar, é punida com pena de prisão até 3 anos.

É disto que estou a falar.

Inês (Anónimo das 4:28)
 
Cara Inês,

É um facto. É a lei...

Mas a mulher não pode, e nem deve ser penalizada, pelo facto de o ter feito.
 
"O seu papel não é meramente de procriação, mas sim o ter um papel responsável." - devia ser, devia. Mas por enquanto ainda não vivemos no mundo ideal. E as mulheres têm problemas concretos a resolver, tipo - comida na mesa, dinheiro para pediatras, medicamentos, dentistas, roupa e calçado, por aí fora, às vezes com ordenado mínimo ou subsídio de desemprego (e às vezes nem isso)

Sim, as outras tb o fazem, mas ou não têm casa própria ou família que as apoie. Outras porque investiram fortemente na carreira profissional, não se sentem preparadas para um compromisso tão importante como é o de ter um filho - é irreversivel e para toda a vida!

A jovem que não é de Lisboa ou Porto e portanto é da província - eu não quis ofender ninguém, eu própria fui uma jovem provinciana e não tenho qualquer problema nisso! - pq não há-de fazer a intervenção no hospital distrital? Pq há-de ir p/ o clandestino! Non capisco!!

No meu círculo de amigos e conhecidos não há condenação por quem fez um aborto. Há sim compreensão e amizade. Que tipo de pessoa condena "socialmente" outra por fazer um aborto? Só talvez as beatas mais velhinhas! E até 10 semanas não se tem barriga, só se sabe se andarmos com um badalo a dizer que abortámos!!

Se os tais mecanismos dependem do critério ou "humores" do juiz, estamos na mesma!! :-)
 
Caro Anonymus,

E que tal se trabalharmos para mudar a situação actual, em vez de nos andarmos a consumir e degladiar com argumentos que apenas servem para chegar a uma conclusão, todos têm a sua razão...

Já agora, e quanto ao comentário relativamente ao juiz, aconselho vivamente a leitura de um ofício do Ministério da Justiça relativamente a esta problemática.

Aqui vai o link:
http://www.oa.pt/upl/{a4ee3fc1-8f08-41e9-b674-554d4d2f0cea}.pdf

Cumprimentos
 
realmente este assunto fez mexer um bocado o universo politico nacional e num pais cada vez mais resignado com a politica (ou falta dela)até é bom verificar que ainda ha lugar a reflexão. A minha intenção de voto é SIM e tambem sou cientista. No meu intimo espero nunca ser obrigado a participar num aborto, como pai ou como simples informado mas faz-me confusão ouvir tantas pessoas a julgarem-se capazes de julgar os outros. Por vezes acho que ha uma facilidade incrivel de emitir juizos de opiniao, do pedestal de um bom nivel de vida, de um salario chorudo, de um conceito de familia perfeita.
Nao acredito que nenhuma mulher recorra a um aborto como meio anticoncepcional nem que tome uma decisão destas de animo leve. Vivemos num país de hipocritas em que parece que os assuntos deixam de existir se a eles nao se fizer referencia. Entao e a educação sexual nas escolas prevista na nossa lei ha 20 ANOS? onde é que ela funciona? Apoio as maes solteiras? Deixem-me rir para nao chorar. Parece-me que ha pessoas que vivem noutro país. Mais uma vez e a frase ja está gasta, não estamos a votar a favor do aborto mas sim a sua despenalização.
Quem sou eu ou qualquer outra pessoa para obrigar alguem que nao se sente em condiçoes de ter um filho a te-lo? E outra coisa para quem defende tanto a vida dizendo que a lei actual ja preve as excepcoes certas? Que culpa tem um feto que o pai seja um violador? Nao tera esse direito a vida? quem e que determina isso? E um feto com malformação congenita tambem nao tem direito a vida? Essa entao e de um mau gosto extremo. Sejam consistentes com os argumentos que usam ja que se acham no direito de emitir juizos.
 
Pedro, obrigada pelo link.

Verifico que o Ministro da Justiça acha que a dissuasão do abortamento até às 10 semanas deve ser do âmbito da protecção social excluindo a aplicação de pena. ;Muito bem. Verifico que o Ministro fala na primeira pessoa; pergunto então: e quando mudarmos de Ministro?

O quadro anexo é muito interessante, vejo que desde 97 houve 37 arguidas ou mais (pois os pontinhos podem representar casos) ou seja, dezenas de mulheres que tiveram de se sijeitar às perícias judiciárias nas suas "partes íntimas".

No mínimo 17 foram condenadas, eis a palavra chave CONDENADAS!

o resto é à base de pontinhos, ou seja não se sabe ao certo se nãohouve casos ou se eram inferiores a 3.

"E que tal se trabalharmos para mudar a situação actual, em vez de nos andarmos a consumir e degladiar com argumentos que apenas servem para chegar a uma conclusão, todos têm a sua razão..."

Perfeitamente! MUDAR, e para começar bem, MUDAR A LEI :-)
 
Caro Anonymus,

Caso não tenha reparado, o quadro não faz qualquer distinção quanto às mulheres.

Isto é, quanto às que sofreram o aborto como aquelas que, e fazendo disso um modo de vida (não conheço outra expressão mais simpática para dizer isso) o exerçam.

Ora, e conhecendo a atitude que os tribunais portugueses têm tido para com as mulheres que fizeram o aborto, chego à conclusão que as mulheres condenadas terão sido as do segundo tipo.

Cumprimentos
 
Eu sei, mas como deve calcular as "executoras" serão muito menos que as "executadas".

Segundo li, eram flagradas com 3 ou 4 ou mais mulheres, algumas em sala de espera, outras à saída, outras nas marquesas!!!

Por estas contas, calculo umas 30 abortantes e 7 abortadeiras, penso que corresponde à realidade.
 
P.S Pedro:

Retribuo os cumprimentos. Pelo menos o senhor é civilizado, dá gosto dialogar consigo.
 
Caro Anonymus,

Desde que se começou a falar sobre a possibilidade de se realizar o referendo, acho que esta foi a única vez que consegui ter um diálogo civilizado e construtivo com alguém.

E é claro incluo também os inúmeros debates ou entrevistas a que assisti na tv ou na rádio.

E é por isso que, e a título expcepional, quebrei a minha promessa, de falar sobre este assunto com alguém, uma vez que existiu dignidade na conversa.

Já me chegaram a dizer que nós, homens, nem sequer devíamos votar neste referendo... sic gloria transit mundi...

Já agora, e caso esteja curiosa, pode sempre ir ao meu blog e ler alguns dos textos que lá coloquei sobre o aborto.

Cumprimentos,
 
Pedro, duas pessoas de boa fé podem sempre ter debates civilizados, mesmo que estejam em desacordo (felizmente!)

Estamos de acordo em 80% ou mais, e quanto ao resto... teremos de concordar em discordar!

Pus o seu blog nos favoritos e qdo tiver tempo vou lá ver! OBG! E qualquer que seja o resultado no domingo, eu lutarei sempre por educação sexual a sério nas escolas (já que muitos papás e mamãs se estão marimbando), por contracepção acessível a todos, e por uma sexualidade responsável em que as partes não admitam ser chantageadas emocionalmente nem pressionadas. Como eu costumo dizer à minha filha, o direito a dizer Não quando não se está preparado é fundamental. Mesmo que isso doa na altura, é a única maneira de à noite ao pôr a cabeça na almofada estar-se de bem consigo e com o mundo. E de manhã ao olhar-se ao espelho não odiar a pessoa que lá se vê reflectida!

Tudo de bom para si, cumprimentos!
Anonymous (Atomina)
 
Cara Anonymus,

Após esta saudável troca de argumentos, reconheço que, e de um modo geral, estamos em acordo.

Porém, a única coisa em que discordamos, em princípio, é no sentido de voto

Ora, concordo inteiramente que exista uma verdadeira educação sexual, não só nas escolas, mas também mas nas associações de jovens, de pais, de apoio aos mais carenciados, sejam elas públicas ou privadas.

Mas uma educação sexual consciente e responsável e ministrada por quem tenha competência para isso.

Paralelamente, não me choca e até acho aconselhável que sejam distribuídos anticonceptivos a quem deles necessite.

Como também, o Estado não se pode demitir da sua função de apoio social aos mais carenciados.

E por fim, e mais importante do que tudo isso, que nos respeitemos todos e apoiemos que necessita de nós.

Já agora, no próximo domingo devemos ir votar, mas votar em consciência.

Cumprimentos,
 
Cá para mim esta Rute é da mesma laia que a Fernanda Câncio.
Comigo não vão aos figos (a Fernanda Câncio sabe isso muito bem e fica furiosa...)

hehehehe
 





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