BASES DE INTELIGIBILIDADE DO NÃO QUE PROCLAMAMOS

O "post" que se segue é grande, maçador e faz pouco apelo a recursos estilísticos. Mas, afigura-se essencial, porque só depois de criado um quadro mínimo de inteligibilidade podemos conversar. O debate segue dentro de momentos. Até lá, fiquem com estas notas.

O aborto é um problema complexo que, como qualquer outro problema, pode ser abordado sob diversas perspectivas. Quer religiosas, quer morais, quer científicas, quer jurídicas. Pode ser questionado em termos amplos ou em termos restritos. A nós não nos interessa criar uma tertúlia que a ele se dedique, mas interessa-nos, isso sim, esgrimir argumentos que possam fundar uma resposta a uma questão concreta: a pergunta que vai ser submetida a consulta popular em data a marcar pelo Sr. Presidente da República.


Dito isto, o nosso enfoque privilegia a vertente jurídica. Porque, quer se goste, quer não se goste, do que se trata é de discutir se o aborto até às 10 semanas deve ou não ser considerado crime. Sem que isso, obviamente, implique uma qualquer forma de autismo que nos afaste da contemplação dos dados lançados pelas descobertas científicas ou pelas indagações sociológicas acerca do fenómeno. Mas implicando, outrossim, que não pretendemos impor uma qualquer visão religiosa do mundo ou uma certa moral pessoal.


Se a nossa questão é jurídica, o primeiro problema que temos de enfrentar é o de saber até que ponto o direito pode intervir nesta matéria. O mesmo é questionar em que medida é legítimo ao Estado resolver, através dos mecanismos próprios do ordenamento jurídico, o problema.
Para tanto, relembramos sumariamente – e em termos gerais – quais as condições de emergência do direito. Para que é que ele serve? Até onde pode ir? Ora, acho que todos percebemos que o direito existe para ordenar condutas sociais. O mundo é um só e nós somos muitos, cada um com a sua mundivisão e com a percepção exacta da escassez de recursos que aquele viabiliza. Mas, ordens reguladoras há muitas e nem todas podem ser consideradas ordens jurídicas. A Máfia também tem as suas regras de conduta, o regime nazi era uma ordem (para mais assente numa legitimidade popular). Apesar disso, nenhum destes regimes pode verdadeiramente ser concebido como uma ordem jurídica. É que para se falar de direito há que ter em conta uma outra condição de emergência – a chamada condição ética. Para que haja direito é necessário que algo funde as normas que mobilizamos para resolver os problemas concretos. E esse algo é – no estado actual de desenvolvimento da nossa civilização – a ética.


Pressupomos uma ética. Pressupomos a dignidade do ser humano, visto como pessoa, e todo o sistema se alicerça nesse pilar fundamental. É certo que outros tentaram uma neutralidade axiológica, mas isso não só se afigura inalcançável (a própria neutralidade é em si mesma um valor pressuposto), como nos pode conduzir a graves consequências, na medida em que todos ficaríamos reféns do poder tendencialmente arbitrário do legislador do momento. Mas para obviar divagações filosóficas e metodológicas, ao mesmo tempo que se tenta obter algum consenso viabilizador do diálogo, deixem-me relembrar-vos que nada disto é metafísico. A Constituição da República Portuguesa tem como pórtico de entrada essa mesma ideia: a dignidade da pessoa humana.


A primeira conclusão que podemos retirar é essa mesma: o direito está onde se ponha um problema de partilha do mundo – ou seja, onde em conflito surjam dois ou mais sujeitos – que urge resolver com apelo a um quadro axiológico.
Não vou explicar, porque gerador de dissenso, a diferença que separa o indivíduo da pessoa. Ainda que possa chamar à colação um acervo de argumentos que me levem a aderir à segunda em detrimento do primeiro, para o que quero explicar basta-me que aceitem esta ideia.


Voltemos, então, ao aborto. Temos de um lado a mãe e do outro lado o embrião. Se o direito se pronunciar sobre o tema do aborto não está a impor a moral a quem quer que seja. E não está porque não se trata de regular uma relação entre mim e a minha consciência, mas entre mim e outra vida humana (espero que ninguém recuse que o embrião é vida e, dentro da categoria de vida, vida humana. Se eventualmente recusarem, podem sempre pedir a um médico que explique que há ali células vivas). Há mais do que um indivíduo. Há uma relação de alteridade. Logo, a moral não tem nada a ver com o assunto, sendo o nosso problema unicamente jurídico.


Dir-me-ão. Mas está a impor valores e uma ética. Pois, sim. Pois estou. Da mesma forma que se impõe uma ética – a do respeito pelo próximo – quando se proíbe o homicídio ou a pedofilia. Reparem em dois pontos: mesmo inconscientemente e acriticamente, há sempre a fundamentar qualquer norma do nosso sistema um valor, um princípio. Sem ele a responsabilidade que, aos diversos níveis, se impõe à pessoa ficava sem suporte e seria meramente arbitrária. E não me falem em consenso, porque este obtém-se sempre a posteriori e nunca é generalizável (pensem que, por exemplo, na Holanda surgiu há pouco tempo um partido político cujo programa inclui a defesa da pedofilia). O nosso ordenamento jurídico terá de ter um suporte. E esse suporte – volto a repetir – é a dignidade da pessoa humana, que nunca poderá ser posta em causa (para facilitar, mesmo que não concorde inteiramente com a formulação individualista e a densifique com apelo à pessoalidade, relembro: eu só posso ir até ao ponto em que não lese direitos alheios).


Chegados a este ponto, antevejo berros, choro e ranger de dentes. Acalmem-se. Não quero impor nenhuma visão pessoal, desarreigada do direito que já existe. Hoje concedo tudo só para ver se consigo fazer entender-me. Por isso nem vou falar no plano do dever ser. Falar-lhes-ei apenas do plano do direito que já é. Pois bem. O nosso direito civil reconhece que o embrião (o nascituro, para usar a designação aí acolhida) é pessoa e trata-o como tal.


Sim, eu sei. Não tem personalidade jurídica, mas esta não se confunde com a personalidade humana, tanto que as associações, sociedades e fundações têm personalidade jurídica e não são seres humanos.
Quando digo que o direito civil reconhece no nascituro uma pessoa humana, digo que o artigo 70º CC, que consagra a tutela geral da personalidade física e moral do indivíduo, inclui no seu âmbito de protecção os nascituros.
Não sou só eu que o digo. Outros antes de mim o disseram, pelo que passo a citar:
“O artigo 70º CC acolhe uma protecção geral da personalidade física e moral dos nascituros concebidos (…). Os concebidos são seres vivos humanos intra-uterinos dotados de uma estrutura e dinâmica próprias, e, como tais, são indivíduos dotados de uma naturalística personalidade físico-moral. Aliás, a ratio legis do artigo 70º vale também para os concebidos porque também carentes de uma protecção geral contra ofensas à sua personalidade, não só para nascerem com vida e ilesos, mas também para que a própria gestação se processo no modo próprio” (Capelo de Sousa, Teoria Geral do Direito Civil, pp. 269)
“Embora não tenha personalidade jurídica plena, é, para efeitos do artigo 70º, um indivíduo – e até mais do que isso uma pessoa – e tem uma personalidade física e moral” (Capelo de Sousa, ob. cit., pp. 270)
“O nascituro é um bem jurídico autónomo, porquanto o concebido não é um nada humano, mas já um embrião, uma firmada spes vitae” (Orlando de Carvalho, Teoria Geral da Relação Jurídica Civil, pp. 171 e 185)
Isto quer dizer que se o embrião, o nascituro, sofrer alguma lesão na sua integridade física durante a gravidez da mãe, ele tem direito a uma indemnização. Novamente citando:
Castro Mendes (Direito Civil, Teoria Geral I, Lisboa, 99. 228) confere um direito de indemnização a uma criança que nasce defeituosa por virtude de um acidente sofrido pela sua mãe por culpa de terceiro.
Orlando de Carvalho considera que o direito à integridade física abrange o direito a não sofrer lesões mesmo na fase intra uterina ou embrionária (Ob. Cit., pp. 187)
Pereira Coelho afirma que “em face das regras de responsabilidade civil, o nascituro pode adquirir um direito de indemnização por danos sofridos antes do nascimento” (Direito das Sucessões, pp. 193)
E olhando para a jurisprudência (vulgo, decisões dos Tribunais) nacional e estrangeira, vemos que a orientação é a mesma. O Supremo Tribunal Federal Alemão (BGHZ 8, 243) reconheceu um direito de indemnização a uma criança nascida com sífilis inata, porque a sua mãe foi infectada com tal doença através de uma transfusão de sangue. Entre nós, a Relação de Lisboa já confere, desde 1977, indemnizações aos nascituros por danos que tenham sofrido, não só por lesões na sua integridade física, como moral.
Ademais, os civilistas têm entendido que o poder paternal (os poderes e deveres que os pais têm em relação aos filhos) se estende aos nascituros. Novamente citando, “a expressão ainda que nascituros do actual nº1 do artigo 1878º CC (…) reporta-se não apenas à representação destes pelos pais mas também aos deveres dos progenitores do concebido de velar pela segurança e saúde deste (…), ou seja, às obrigações de defesa do concebido” (Capelo de Sousa, op. cit. pp. 269)


Neste ponto, devo recordar que ainda não falei de moral, religião, mas que me estou a ater ao sistema de direito tal-qualmente ele existe.


Concluímos que o embrião é considerado – e tutelado – como pessoa pelo nosso ordenamento jurídico civil.
Mais do que isso, podemos pensar no artigo 24º CRP e interpretá-lo no sentido de integrar naquela expressão “direito à vida” a vida do nascituro, do embrião.


Esperando ter encontrado algum consenso, vamos dar mais um pequenino passo para não nos confundirmos todos novamente.
Para o direito penal ser legítimo temos de preencher duas categorias: a dignidade do bem jurídico e a eficácia.
Quanto à dignidade do bem jurídico, acho que estamos conversados (mesmo os penalistas que admitem a descriminalização ou despenalização do aborto aceitam sem problemas essa dignidade. V.g. Costa Andrade). Espero que depois de tanta citação não continuem a berrar que estamos a impor uma moral.
Resta-nos a eficácia. Considera-se que o direito penal só é eficaz quando não haja outro meio menos gravoso de tutela daquele bem jurídico. Ora, por mais que me esforce eu não consigo arranjar nenhum.
Permitir que a mãe aborte implica desproteger totalmente o embrião. Dir-me-ão que há casos em que é possível abortar sem que haja crime. Pois há. Tal como há casos em que é possível matar sem que haja crime. Mas são casos excepcionais em que entram em conflito com o direito à vida do filho outros direitos da mãe e se estabelece uma ponderação prática dos mesmos. Ou casos em que as circunstâncias envolventes permitem concluir por uma especial atenuação ou exclusão da culpa da mulher. Nenhuma dessas explicações colhe quando o aborto seja feito a pedido daquela, sem causa justificativa. Menos colhe a ideia de liberdade da mulher, porque essa foi exercida a montante, ou seja, no momento da prática do acto sexual.


Comentários:
Muito bem.
 
Se não entenderem agora, não entendem nunca.
Admiro especialmente o teu discurso moralmente neutro, sem qualquer alusão a concepções axiológicas pessoais mas apenas a conceitos jurídicos e à ética do direito.
 
Parece estar tudo dito... Bem dito!...
Mas porque é que os nossos políticos não entendem isso?
 
"O nosso direito civil reconhece que o embrião (o nascituro, para usar a designação aí acolhida) é pessoa e trata-o como tal." ; "
"Concluímos que o embrião é considerado – e tutelado – como pessoa pelo nosso ordenamento jurídico civil."


Não fosse o azar de o referendo ser relativo a direito penal nada teria a acrescentar. Mas como não é, respondo-lhe:
Partir de um considerado civil e transpo-lo, sem mais para o penal é demagogia barata. Você faz um non-sequitur entre as considerações civis em relação à personalidade (difusa) dos nascituros e as considerações penais em apreço. Ninguém duvida que um nascituro pode ser sujeito de direitos civis(embora so os possa exercer depois do nascimento, completo e com vida) e penais (em que até existe uma antecipação da personalidade "completa" para o momento das primeiras contrações da parturiente). Mas da mesma forma, também ninguém duvida que um nascituro (antes das tais contrações) não é considerado pela lei penal como uma pessoa (nascida). E é isso que a Mafalda confunde (ou, como desconfio, quer que os outros confundam).

"Quanto à dignidade do bem jurídico, acho que estamos conversados."
Quanto à dignidade do bem jurídico sim, todos concordamos, quanto ao alcance da protecção que ele deve ter, não estamos. Sim senhor, o bem jurídico "vida intra-uterina" é certamente digno de protecção (se encontrar algum grupo de pessoas relevante que defenda a total desprotecção desse bem, avise. Eu não conheço ninguém a pedir a despenalização de abortamentos em qualquer estadio da gravidez). O que está em causa é a protecção que ele deve ter exactamente, a partir de quando e em que circunstâncias. E não desvie para canto com "absolutismos éticos", pois a a lei já faz exactamente isso nas disposições em que afasta a ilicitude de certas práticas abortivas. Despenalizar uma interrupção voluntária da gravidez (aqui, a expressão "IVG" parece-me adequada, para sublinhar o "voluntário") não é destutelar o bem jurídico "vida intra-uterina". O referendo é uma inquirição perfeitamente legítima acerca de um bem jurídico susceptível de uma interpretação subjectiva (a que a ciência e a filosofia têm sido incapazes de dar resposta cabal), por muito que "eticamente" lhe doa a si.
Será que é desta que percebe que os seus interlocutores não são todos burros? Um abraço.
 
Gostava que me explicassem isto:
O TC declarou a conformidade constitucional da pergunta ao referendo do Aborto.
Gostaria de perguntar aos Senhores Juízes Conselheiros se consideram que a pergunta do referendo está de acordo com o projecto-lei subjacente ao mesmo, que permite o aborto até aos 4 meses por razões socio-económicas...?
Para que fique claro: a pergunta do referendo é instrumento formal de apreciação de um projecto-lei que deverá ser aprovado em caso de vitória do SIM: ora, se perguntamos aos portugueses se estão de acordo com o aborto até às 10 semanas, como legalizamos a prática até às 16 por razões socio-económicas (que também gostaria que especificassem o que são)?
Kate, blogue pelo não
 
E agora que comentei as questões prévias, um comentário ao "sumo" do seu post:

"Dir-me-ão que há casos em que é possível abortar sem que haja crime (...)
Mas são casos excepcionais em que entram em conflito com o direito à vida do filho outros direitos da mãe e se estabelece uma ponderação prática dos mesmos. Ou casos em que as circunstâncias envolventes permitem concluir por uma especial atenuação ou exclusão da culpa da mulher. Nenhuma dessas explicações colhe quando o aborto seja feito a pedido daquela, sem causa justificativa."


Nice try Mafalda, mas acontece que só o facto de uma pessoa querer ter o domínio sobre o seu próprio corpo já é uma causa justificativa. Uma mulher que não quer ter dentro do seu próprio corpo um outro corpo que não seu (chame-lhe o que quiser, "feto", "bébé", "pessoa", whatever) deseja exercer a sua soberania sobre a sua pessoa física, direito que a todos devia assistir. Isso em si mesmo (a soberania sobre o próprio corpo) é uma causa justificativa. Um pai que não doe medula ao seu filho com leucemia, que morrerá sem um transplante, não está obviamente sujeito a sanções penais. Da mesma forma, as mulheres não deviam ser pelo estado obrigadas a transportar e sustentar dentro do seu corpo um ser quando não o queiram fazer.
Você insinua que um abortamento por livre vontade de uma mulher é pura e simplesmente um exercício cruel e sem causa justificativa sobre um feto, coisa que não é certamente. Mas mesmo assim, nice try.

Uma nota final:
"Chegados a este ponto, antevejo berros, choro e ranger de dentes. Acalmem-se."
Eu, chegado a esse ponto, arranquei os cabelos todos, fugi para França e alistei-me na Legião Estrangeira. A minha cabeça quase explodiu! O efeito da Mafalda nos seus oponentes é ainda maior do que aquele com que a Mafalda sonha!
 
Mafalda "Dir-me-ão. Mas está a impor valores e uma ética. Pois, sim. Pois estou."


Concordo inteiramente.
Mas não lhe admito legitimidade para me impôr ( pu a qum quer que seja) a sua visão particular de concepções jurídicas.
 
Cara bluesmile,
À falta de melhor, nos últimos comentários que tem vindo a fazer, arremessa com um suposto argumento de autoridade, evitando contraditar o que por aqui se tem escrito.
 
Meus caros,

os meus interlocutores não são todos burros, obviamente.
Limitam-se a não querer entender o que é o fundamento transpositivo do direito. Lanço uma questão. Se abdicarem de todo e qualquer fundamento ético, como justificam que seja crime a pedofilia? Ou o homicídio a pedido? Ou o incitamento ao suicídio?

Quanto ao direito civil, a tutela de bens da personalidade existe independentemente do nascimento da pessoa. O artigo 66º, nº2, do CC só se aplica aos direitos patrimoniais (posição de diversos autores que não eu.. Podem continuar a ler Capelo de Sousa).

Não transpus a lógica do direito civil para o direito penal. Explicitei bem as condições de legitimidade do direito penal.

E já agora, responda-me à questão que deixei à Fernanda Câncio.
 
Michael night: antes de mais explique o que é que quer dizer, por exemplo, com isto: "Despenalizar uma interrupção voluntária da gravidez (aqui, a expressão "IVG" parece-me adequada, para sublinhar o "voluntário") não é destutelar o bem jurídico "vida intra-uterina". O referendo é uma inquirição perfeitamente legítima acerca de um bem jurídico susceptível de uma interpretação subjectiva"... argumentar é mais do proferir palavras esteticamente bem articuladas e ordenadas no contexto da frase...

E já agora desfaça a sua própria contradição (não sei se se dá ao luxo de só se preocupar com a coerência de cada um dos seus comentários, mas nesse caso, poor try!) quando afirma que "Quanto à dignidade do bem jurídico sim, todos concordamos, quanto ao alcance da protecção que ele deve ter, não estamos" e depois defende que "Você insinua que um abortamento por livre vontade de uma mulher é pura e simplesmente um exercício cruel e sem causa justificativa sobre um feto, coisa que não é certamente."... e já agora responda: qual é o bem jurídico? reconhece a existência de bem jurídico? assumindo que vai responder que o bem jurídico é a vida, qual o motivo relevante para o distinguir da vida extra-uterina? E já agora, perante o reconhecimento da tirania de uma mãe que tudo pode sobre o seu corpo, até atentar contra a vida que se desenvolve dentro dela, qual é a protecção que faz do bem jurídico, se é que reconhece que existe algum?

Bluesmile: continua a difundir o disparate jurídico e mais grave do que isso a não perceber a diferença entre ética e moral!

Miguel
 
Caro Maiquelnaite,

Claramente não leu, ou não quis ler, o que a Mafalda escreveu.
1. A Mafalda não transpõe conceitos civis para o direito penal. Usa o direito civil para mostrar que o ordenamento jurídico, no seu todo, protege o bem jurídico "vida intra-uterina". Claro que isso não é suficiente para legitimar a intervenção do direito penal: falta a eficácia. Mas consegue encontrar outro ramo do direito que proteja eficazmente a vida intra-uterina para além do direito penal? Se consegue, agradeço que a partilhe connosco.

2- A causa justificativa é o corpo da mulher? Oh por favor! Leia o texto todo e vai perceber que JURIDICAMENTE se trata de um ser humano diferente da mãe, merecedor de tutela jurídica nos diversos ramos do direito. E a liberdade da mãe cessa onde começa o direito à vida do ser humano intra-uterino. O facto desse feto "invadir" o corpo da mãe é consequência do exercício do direito à auto-determinação sexual da mulher, direito por que tem de ser responsável.

Cumprimentos
 
Bluesmile,

Começo a não perceber a sua embirração com a Mafalda e com a sua necessidade de a contraditar sem apresentar para isso qualquer argumento e, pior, sem ler correctamente o que a Mafalda explica.

Cumprimentos,
 
Meus caros Afonso e Miguel,

obrigada por tentarem explicar NOVAMENTE que
1- o embrião é considerado uma pessoa pelo ordenamento jurídico (o apelo ao direito civil servia apenas para o comprovar com apoio no sistema positivo. Da mesma forma que, quando em causa estão os crimes contra a propriedade, se faz apelo a conceitos civilísticos);
2- Se exige a eficácia como condição de legitimidade do direito penal, o que, no caso, se verifica (dado não existir outro modo de garantir a protecção do embrião);
3- O embrião, sendo uma pessoa, distingue-se da sua mãe e não pode ser visto como um invasor, até porque só habita o seu ventre porque ela exerceu livremente o seu direito à autodeterminação sexual. Aliás, os comentadores de serviço entram em contradição quando admitem (espero que finalmente) que o embrião é uma pessoa e a vida intra uterina um bem jurídico e depois voltam a argumentar como se em causa estivesse só e apenas um eventual direito da mulher ao seu corpo. O corpo da mulher não é causa justificativa de nada. Até porque, mesmo que fosse, ele entraria em conflito com outro direito - o direito à vida do embrião - e, juridicamente, os conflitos de direitos resolvem-se de acordo com uma ponderação prática em que não se põe em causa o núcleo essencial do bem hierarquicamente superior, pelo menos sem atender a circunstâncias relevantes (sim, eles parecem esquecer-se que, caso a alteração à lei seja aprovada, a vida do embrião, durante 10 semanas, pode ser posta em causa por motivos tão nobres como "hoje não me está nada a apetecer ter um filho". Parecem esquecer-se, de facto, que a lei, sendo geral e abstracta, tem de permitir abarcar todas as situações, cabendo ao juiz, posteriormente, atender às especificidades do caso concreto. Notem que este papel do juiz derruba o argumento do fado da desgraçadinha a que já nos habituamos, mas adiante...)

Cara Bluesmile,

A Bluesmile desconhece (entre outras coisas) as regras básicas da argumentação. Desconhece, por exemplo, que, quando se pretende convencer o nosso interlocutor, não basta dizer "é mentira, eu não concordo, isso é a sua opinião". Desconhece a diferença entre uma premissa e um argumento. Desconhece o que é o ónus da contra-argumentação e, à falta de melhor, como bem diz o Rui Castro, diz o primeiro disparate que lhe vem à cabeça.
No dia em que quiser voltar a argumentar connosco, aqui estaremos para a ler e responder. Até lá, vá-se divertindo, porque a minha resposta será o silêncio.
 
Maiquelnaite,
Uma mulher que não quer ter dentro do seu próprio corpo um outro corpo que não seu (chame-lhe o que quiser, "feto", "bébé", "pessoa", whatever) deseja exercer a sua soberania sobre a sua pessoa física, direito que a todos devia assistir.

Registo o facto de o maiquelnaite admitir que o "feto", "bébé", "pessoa", whatever é vida e um corpo separado do da mulher (apesar de se desenvolver dentro deste) e que, portanto, lhe reconhecerá direitos, nomeadamente os direitos mais fundamentais como p.e. o direito à vida.

Mas tenho algumas questões que gostaria que esclarecesse:
1) Se a mulher não quer esse corpo dentro do seu, por que razão, por acção ou omissão deliberadas, o deixou gerar?
Ao fazê-lo, não aceitou tacitamente a responsabilidade por levar essa geração a termo?

2) Como relaciona o ponto 1 do artigo 1874º (Deveres de pais para filhos) do Código Civil (Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência.) e o ponto 1 do artigo 200º (Omissão de auxílio) do Código Penal (Quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por (...) situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida (...) de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 120 dias.) com o aborto a pedido?

3) Se advoga que a mulher tenha o direito de recusar "manter dentro do seu corpo um outro corpo que não seu", defenderá naturalmente "a despenalização de abortamentos em qualquer estádio da gravidez". Ou, para si, esse direito termina às 10 semanas? Se sim, porquê?
 
Claro...


"o embrião é considerado uma pessoa pelo ordenamento jurídico"


Hum... Uma Pessoa sem direitos fundamentais???

No nosso ordenamento jurídico?

Interessante.

Nem admira que o silêncio envergonhado seja a vossa resposta...
Há tanta falta de honestidade inteclectual na vossa pseudoargumentação ...
 
Mafalda Já lhes explicou como se fossem pessoas inteligentes; depois explicou-lhes como se não fossem lá muito espertos; a seguir explicou-lhes como tivessem 5 anos; finalmente explicou-lhes como se fossem muito, muito burros. Será possível ir mais longe?... Duvido.
 
«E não está porque não se trata de regular uma relação entre mim e a minha consciência, mas entre mim e outra vida humana (espero que ninguém recuse que o embrião é vida e, dentro da categoria de vida, vida humana. Se eventualmente recusarem, podem sempre pedir a um médico que explique que há ali células vivas). Há mais do que um indivíduo.»

É aqui onde se pode discordar, em toda a lógica. Claro que um embrião é vida, e vida humana. No entanto não decorre daí que é um indivíduo, um sujeito. Quais são os critérios que usa para que o seja, e como legitima-os?
 
Várias respostas a vários interlocutores:

#1 - Miguel
"Michael night: antes de mais explique o que é que quer dizer, por exemplo, com isto: "(...)" argumentar é mais do proferir palavras esteticamente bem articuladas e ordenadas no contexto da frase...
R:É mais do que isso, sim senhor. Perceber um texto também é mais do que simplesmente lê-lo. Mas para si, esmiuço um pouco, a tal frase podia ter sido escrita assim: "deixar de mandar para a prisão as mulheres que abortam (segundo as condições estabelecidas na lei) não é desproteger todos os fetos, nem deixar de lhes reconhecer quaisquer direitos. O referendo apenas pergunta às pessoas que esclareçam que protecção e a partir de que altura querem exactamente dar (em apelo à sua consciência e "mundivisão") aos fetos. Parece-me uma pergunta legítima." Espero que tenha ficado esclarecido.

"(...)E já agora desfaça a sua própria contradição (não sei se se dá ao luxo de só se preocupar com a coerência de cada um dos seus comentários, mas nesse caso, poor try!) quando afirma que "Quanto à dignidade do bem jurídico sim, todos concordamos, quanto ao alcance da protecção que ele deve ter, não estamos" e depois defende que "Você insinua que um abortamento por livre vontade de uma mulher é pura e simplesmente um exercício cruel e sem causa justificativa sobre um feto, coisa que não é certamente."...
R:Não vejo qualquer contradição, explique-se se fizer favor.
Quanto ao aparte "não sei se se dá ao luxo de só se preocupar com a coerência de cada um dos seus comentários" respondo-lhe que não me preocupo demais com isso mas que você se devia preocupar um pouco mais que os seus comentários tivessem sentido, já que, como lhe disse não há qualquer contradição onde você diz que ela existe. O meu conselho para si Miguel: um pouco de sentido primeiro, da coerência você trata depois.

"(...)e já agora responda: qual é o bem jurídico?(...)"
R:O bem jurídico é a "vida intra-uterina", era só ler o que escrevi (várias vezes).

"(...)reconhece a existência de bem jurídico?(...)"
R:Reconheço a existência de um bem-jurídico sim senhor, é a "vida intra-uterina", era só ler o que escrevi (várias vezes).

"(...)assumindo que vai responder que o bem jurídico é a vida, qual o motivo relevante para o distinguir da vida extra-uterina(...)"
R:Assume mal, é a "vida intra-uterina", era só ler o que escrevi (várias vezes).
Quanto a motivos relevantes para a distinguir da vida extra-uterina posso dar-lhe vários, no entanto vou exortá-lo a que enderece esta pergunta à sua "compagne de route" Mafalda. É que caso não imagine, essa distinção é feita desde há muito, muito tempo. Sério. Pegue num Código Penal (Livro II, Título I, Capítulo II, arts 140º a 142º) e esclareça-se com a Mafalda.

"(...)E já agora, perante o reconhecimento da tirania de uma mãe que tudo pode sobre o seu corpo, até atentar contra a vida que se desenvolve dentro dela, qual é a protecção que faz do bem jurídico, se é que reconhece que existe algum?"
R:Tirania de uma pessoa que tudo pode sobre o seu corpo?! A "mãe tirana" está a decidir o que fazer com o seu próprio corpo?! Malvada!!!
Não se esqueça (e isto é um bocado fundamental, faça um esforço por tentar fixar isto) que a tal vida está, passo a citar, "dentro dela". Dentro da mãe, está a ver? Você não defende sanções penais para um pai que não doe medula a um filho que morre sem o transplante. Não exige que um homem abdique do seu domínio individual sobre o seu corpo e integridade física, e note que neste caso o filho nem seuqer está dentro do corpo do pai. Mas já defende que as mulheres sejam obrigadas a abdicar do seu controlo sobre o seu ser físico para sustentar o desenvolvimento de um feto, sob pena de ir parar à choldra. Uma palavra começada por "H" e acabada em "ipicocrisia" vem-me à mente...
Ou dito de outra forma, para endereçar o seu psedo-jargão legal quanto à protecção do bem-jurídico em questão: "perante o reconhecimento da tirania de um pai que tudo pode sobre o seu corpo, até atentar contra a vida do seu filho com leucemia, qual é a protecção que faz do bem jurídico, se é que reconhece que existe algum?"

Um abraço.
 
Mafalda,

Com que então o que está na origem do direito penal é a transposição de uma ética.

Muito bem, vamos a isso.

Porque é que a mulher violada tem direito a abortar sem que essa conduta seja crime e a mulher não violada não tem, para o mesmo número de semanas (aliás, a mulher ciolada até tem mais umas quantas ...) ?

Não responda a tolice que já vi escrita neste blog de que a saúde psiquica ou o atentado sexual de que a mulher é vitima se sobrepõem ao direito à vida do feto.

Bem vê, para quem acha, como V., que o feto tem protecção (civil e penal) desde a concepção (não discuto isso, acho errado, mas admito a benefócio de raciocínio), é um pedaço dificil defender que a vida do nascuituro pode ser sacrificada no altar da ofensa sexual sofrida pela mulher.

Ou os filhos de violação são menos filhos do que os outros ?
 
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
 
Caro anónimo das 15:04,
Diz:
"Não responda a tolice que já vi escrita neste blog de que a saúde psiquica ou o atentado sexual de que a mulher é vitima se sobrepõem ao direito à vida do feto".

Não sei se está a chamar tolo ao reputados penalistas deste país... Também já lhe disse que em alguns casos só está em causa a exclusão da culpa.
 
#2 - Afonso Patrão:

"Claramente não leu, ou não quis ler, o que a Mafalda escreveu.(...)"
Li sim senhor, se me permite a ousadia digo-lhe que o afonso é que leu nas palavras da Mafalda aquilo que quis ler.

"(...)A Mafalda não transpõe conceitos civis para o direito penal. Usa o direito civil para mostrar que o ordenamento jurídico, no seu todo, protege o bem jurídico "vida intra-uterina".(...)"
Permita-me que discorde. O ordenamento jurídico, no seu todo, não protege o bem jurídico "vida intra-uterina" pelo simples facto de que essa protecção a bens jurídicos só existe ultima ratio no Direito Penal. O que o ordenamento jurídico no seu contexto civilista faz é reconhecer direitos civis a nascituros (e atente bem nisto, só depois do nascimento completo e com vida é que esses direitos se efectivam). Dizer que o ordenamento jurídico no seu todo reconhece aos fetos um estatuto sequer parecido com o dos nascidos é demagogia baratíssima (além de mentira). Fazer uma introdução acerca dos direitos que civilmente são reconhecidos a nascituros para a partir daí inferir conclusões a nível penal foi, no caso do texto da Mafalda, uma infeliz tentaiva de manipulação. Alhos e bugalhos deliberadamente misturados, com um objectivo claro.

"(...)Claro que isso não é suficiente para legitimar a intervenção do direito penal: falta a eficácia. Mas consegue encontrar outro ramo do direito que proteja eficazmente a vida intra-uterina para além do direito penal? Se consegue, agradeço que a partilhe connosco.(...)
Peço desculpa mas não percebi a sua afirmação. Está-me a dizer que basta que o ordenamento jurídico no seu todo proteja um qualquer interesse para que ele deva ser penalmente tutelado? Não é verdade.
Quanto à questão da eficácia, ela é estranha à discussão: não estamos a discutir a melhor maneira de proteger a vida intra-uterina, estamos a discutir quando é que essa protecção deve assumir carácter penal.

"(...)Leia o texto todo e vai perceber que JURIDICAMENTE se trata de um ser humano diferente da mãe, merecedor de tutela jurídica nos diversos ramos do direito.(...)"
JURIDICAMENTE, já que faz tanta questão, um nascituro não é uma pessoa nem no ramo civil. Confira o claríssimo nº1 do artº 66 do Código Civil.

"(...)E a liberdade da mãe cessa onde começa o direito à vida do ser humano intra-uterino. O facto desse feto "invadir" o corpo da mãe é consequência do exercício do direito à auto-determinação sexual da mulher, direito por que tem de ser responsável."
A liberdade sobre a integridade física do corpo de cada um é absoluta. Você atropela culposamente uma velhota e depois recusa-se a dar-lhe sangue, que ela precisa desesperadamente. A sua liberdade sobre o seu corpo (o seu sangue) acaba onde começa o direito à vida da pobre senhora? Não, não terá nenhum fardo penal adicional por essa recusa (se quiser dar o sangue, óptimo, mas se não der ninguém o prende [até 3 anos] por isso). Você até era culpado de um acto grave e socialmente proibido. Se essa liberdade absoluta sobre o domínio do seu corpo não cessa em actos dessa natureza porque raio havia de cessar em relação a actos perfeitamente legítimos e livres como as relações sexuais?
 
Maiquelnaite,

a sua resposta ao Afonso esclareceu-me. Não percebeu nada.

1. "Permita-me que discorde. O ordenamento jurídico, no seu todo, não protege o bem jurídico "vida intra-uterina" pelo simples facto de que essa protecção a bens jurídicos só existe ultima ratio no Direito Penal." Esta sua frase não faz qualquer sentido. Nenhum mesmo.
Nem sequer linguisticamente, quanto mais juridicamente. ~

2. Quer queira quer não, os nascituros têm direitos. Depois falar de direito civil não é o mesmo que falar de direitos civis.

3. O artigo 66º CC fala de personalidade jurídica e não de personalidade humana.

4. Sabia que a omissão de auxílio é crime?
2. N
 
Caro Maiquelnaite,

Transleu tudo o que eu escrevi, e tenho pena. Espero ter paciência para lhe explicar, mais uma vez, o que escrevi.

1: Não há apenas bens jurídicos no direito penal. Desculpe que lhe diga, mas isso é uma barbaridade. Um bem jurídico é, sem grandes preocupações de rigor - (dada a minha exaustão, não me apetece explicar isto com a minúcia que a perfeição exigiria. Mas se quiser, terei todo o gosto em indicar-lhe bibliografia) , um valor juridicamente tutelado, que o direito protege por entendê-lo fundamental.

Ora, nem todos os bens jurídicos são penalmente tutelados. Para haver tutela penal é necessário haver 2 coisas: dignigade penal do bem jurídico (pois há bens jurídicos SEM dignidade penal, como já expliquei) e necessidade de eficácia, isto é, é necessário que nenhum outro ramo do direito consiga proteger o bem jurídico para que o direito penal intervenha.

2- Ou seja, eu não disse que todos os bens jurídicos são penalmente tutelados: quem o disse foi você. Leia por favor o que escreveu.

3- E muito menos eu disse que basta um bem jurídico para que haja intervenção do legislador penal. O que eu disse foi precisamente o contrário: que era necessária, para a intervenção do direito penal, que nenhum outro ramo do direito conseguisse tutelar eficazmente o bem jurídico.

4- Por isso, terminei dizendo que eu não vislumbro qualquer outra forma de tutelar o bem jurídico vida intra-uterina. Se Maiquelnaite consegue, agradeço que mo exponha, pois esse meio afastará a legitimidade da intervenção penal.

5- Não pode fazer a confusão inocente de equiparar personalidade jurídica, ou o momento da sua aquisição, a pessoa humana. São noções que não se confundem. A personalidade jurídica adquire-se no nascimento completo e com vida, mas como o próprio Maiquelnaite admitiu, o ordenamento jurídico confere direitos a nascituros que, como sabe, ainda não adquiriram a sua personalidade jurídica.
A sua equiparação não faz sentido, uma vez que as pessoas colectivas gozam de personalidade jurídica e, que eu saiba, não são pessoas humanas.

Espero tê-lo esclarecido. Se não consegui, peço desculpa. Estou já cansado de explicar e não me fazer entender o que será, com certeza, um problema meu.
 
E os embriões gozam dos direitos de personalidade??
 
#3 - Joaquim Amado Lopes:

"(...)Registo o facto de o maiquelnaite admitir que o "feto", "bébé", "pessoa", whatever é vida e um corpo separado do da mulher (apesar de se desenvolver dentro deste) e que, portanto, lhe reconhecerá direitos, nomeadamente os direitos mais fundamentais como p.e. o direito à vida.(...)"
Não atire já foguetes. Um corpo é um corpo é um corpo. Para o raciocínio que eu estava a fazer é indiferente a natureza do corpo em questão, leia a frase de onde tirou essa citação e confira. Quanto à questão de eu lhe reconhecer direitos, entre os quais a vida, penso que a minha opinião global sobre o assunto pode bem ser aferida pelo resto do comentário.

"Mas tenho algumas questões que gostaria que esclarecesse:
1) Se a mulher não quer esse corpo dentro do seu, por que razão, por acção ou omissão deliberadas, o deixou gerar?(...)"

Certamente não pensa que as gravidezes não desejadas acontecem todas pela mesma razão! A sua pergunta "por que razão (...) o deixou gerar?" indica nesse sentido.
E não pense que sequer há sempre uma "acção ou omissão deliberadas" da mulher que resulta em gravidez. Uma mulher esquece-se de tomar a pílula, é uma acção ou omissão deliberada da mulher? Um rapaz influencia a sua namoradinha de 13 anos (a quem a sociedade nem reconhece desenvolvimento psicologico para conduzir um carro, votar ou até dar o seu consentimento para a relação sexual) a não usarem preservativo, é uma acção ou omissão deliberada da mulher? Uma mulher é violada, é uma acção ou omissão deliberada da mulher? Um preservativo rompe-se, é uma acção ou omissão deliberada da mulher?

"(...)Ao fazê-lo, não aceitou tacitamente a responsabilidade por levar essa geração a termo?(...)"
Não, não necessariamente. Há muitos casos (possivelmente a maioria) em que existe pura e simplesmente negligência de planeamento familiar (e não deixa de ser tristemente irónico que a ignorância generalizada neste campo seja consequência de políticas ferrenhamente defendidas por boa parte dos apoiantes do "Não"), mas isso não implica que tenha existido qualquer aceitação de uma gravidez. Uma coisa é aceitar as consequências de um acto, outra bem diferente é não considerar os resultados. Julgo que na larguíssima maioria das gravidezes indesejadas esta representação do resultado nem sequer existe. Por isso a resposta à sua pergunta é "não".

"2) Como relaciona o ponto 1 do artigo 1874º (Deveres de pais para filhos) do Código Civil (Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência.) e o ponto 1 do artigo 200º (Omissão de auxílio) do Código Penal (Quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por (...) situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida (...) de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 120 dias.) com o aborto a pedido?
Não é uma má pergunta, mas é de fácil resposta.
O primeiro artº que invoca é do Código Civil, esta questão é do foro penal, estamos a discutir a dignidade penal de um comportamento e não uma questão civil. Alhos e bugalhos.
Já o artº 200 do Código Penal não tem apenas o número 1 que você cita, tem lá um número 3 que diz: "a omissão não é punível quando se verificar grave risco para a vida ou integridade física do omitente ou quando, por outro motivo relevante, o auxílio lhe não fôr exigível". A meu ver o domínio que uma pessoa tem sobre a integridade do seu corpo é motivo mais do que relevante para não punir penalmente as mulheres que querem terminar uma gravidez. Como é que o Joaquim relaciona esses mesmos artigos com uma situação em que um pai atropela o seu próprio filho e depois o Direito Penal não lhe exija (sob pena de prisão até 3 anos) que doe sangue ao miúdo?

"(...)3)Se advoga que a mulher tenha o direito de recusar "manter dentro do seu corpo um outro corpo que não seu", defenderá naturalmente "a despenalização de abortamentos em qualquer estádio da gravidez". Ou, para si, esse direito termina às 10 semanas? Se sim, porquê?"
"Defenderá naturalmente"? Não, faça o favor de não me pôr palavras no teclado. Defendo a despenalização de abortamentos até ao momento em que seja, de acordo com a ciência disponível, impossível que o feto sobreviva fora do corpo da grávida. Se o feto pode viver fora do corpo da grávida e ela não o quer mais, provoque-se o nascimento e acolha-se o ser de forma a proporcionar-lhe a sobrevivencia. Um abortamento (ou seja, um acto que impeça o subsequente desenvolvimento do "bébé") nesta fase é, na minha modesta opinião, passível de censura penal. Mas se a gravidez se encontra numa fase em que ainda não existe qualquer hipotese de viabilidade do feto sem o sustento dado pelo corpo da grávida, o acto de interromper a gravidez não deve ser, na minha opinião, passível de consequência penal.
Um abraço.
 
#4 - mafalda:

"(...)Esta sua frase não faz qualquer sentido. Nenhum mesmo.
Nem sequer linguisticamente, quanto mais juridicamente. ~"

O bem jurídico "vida intra-uterina" enquanto tal, só é protegido no Direito Penal. Melhor assim? Mea culpa, mea culpa.

"2. Quer queira quer não, os nascituros têm direitos.
Certo, aparentemente eu "não quero que os nascituros tenham direitos". Ou pelo menos assim você insinua. Adiante.

"(...)Depois falar de direito civil não é o mesmo que falar de direitos civis.(...)
Pois não é... não estou é a ver onde quer chegar com tal afirmação. Mas não me preocupo muito, tenho a certeza de que a Mafalda nos vai proporcionar outras frases ainda mais crípticas e desprovidas de sentido para eu ocupar a cabeça.

"3. O artigo 66º CC fala de personalidade jurídica e não de personalidade humana."
Certo, mas o afonso dizia que JURIDICAMENTE (assim tudo em maiúsculas) tínhamos um ser humano. Limitei-me a sublinhar que JURIDICAMENTE não é um ser humano com os direitos destes. Nem sequer no ramo civil tem a qualidade de "pessoa". Estou certo de que percebeu onde eu queria chegar. Já eu não percebi onde a Mafalda quer chegar, importa-se de me dar uma referência que JURIDICAMENTE estabeleça um critério para "personalidade humana"? Estou certo de que vai conseguir.

(...)4. Sabia que a omissão de auxílio é crime?
Sabia. A Mafalda sabe qual é a consequência penal para um pai que recuse dar sangue a um filho que dele necessita? Pode, em poucas palavras por favor (e de preferência usando muitas vezes a expressão "transpositivo") dizer o que penalmente acontece a tal pessoa? Agradece-se com ansiedade que nos diga quais as penas e sua duração.

Finalmente, sobre o começo do seu comentário:
"Maiquelnaite, a sua resposta ao Afonso esclareceu-me. Não percebeu nada."
Googlei o seu nome e verifiquei que é professora de direito civil na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Tenho imenso respeito científico pela instituição e digo-lhe que só o facto de ser assistente em tal lugar é imeiatamente um atestado de competência técnica elevadíssima. Mas não é, nem de perto nem de longe, um atestado de razão em questões de direito. E sobretudo não é um atestado para possa que tratar todos como se fossem os seus alunos. Estou longe de não ter percebido "nada", por muito que isso lhe custe. Percebo muito bem ao que vem, de onde vem e de forma tenta advogar a sua tese. Percebo a sua posição, os seus argumentos e o porquê da sua dificuldade em responder a perguntas directas.
Mas há de facto coisas que não percebi. A sua resposta à pergunta da Fernanda Câncio. Se defende uma agravação das penas para o crime de aborto. Se acha que a lei actual é de alguma forma eficaz na protecção da vida intra-uterina. Se essa lei é a solução disponivel mais adequada. Se considera que devia ser punível o abortamento nos casos em que a gravidez resulte de uma violação. Se considera o domínio de cada um sobre a sua integridade física um valor "transpositivo" do Direito. E finalmente, ainda não percebi porque raio é que a Mafalda julga que ninguém a percebe.
Um abraço.
 
afonso patrão:
Tem toda a razão, tresli de facto o que escreveu, provavelmente por ter várias respostas acabei a confundi-las. Assim que possa (estou muiiiiito atrasado para um compromisso) retomarei este diálogo, tentarei responder àquilo que realmente escreveu e não ao que eu imaginei que tivesse escrito. Aceite um sentido pedido de desculpas por lhe ter imputado afirmações que não fez, e um abraço.
 
caro Maiquel: Excelente análise, excelente argumentação. Sucinta, irreprensível do ponto de vista teórico e, sobretudo muito inteligente, ao "desmontar" as motivações por trás do discurso metajurídico e ao põr a nu certos tiquezinhos de autoritarismo tão típico dos "assistentes" da DFUC...
Uma vénia.
 
Maiquelnaite,

1) Quanto à questão de eu lhe reconhecer direitos, entre os quais a vida, penso que a minha opinião global sobre o assunto pode bem ser aferida pelo resto do comentário.
Defendo a despenalização de abortamentos até ao momento em que seja, de acordo com a ciência disponível, impossível que o feto sobreviva fora do corpo da grávida.

Interessante e tenho a certeza que, para si, isto faz todo o sentido. Lamento ter que reconhecer que para mim não.

Em primeiro lugar, como se determina o momento até ao qual é impossível que o feto sobreviva fora do corpo da grávida? Por defeito ou por excesso?
E como se conjugam diferentes opiniões de diferentes especialistas? Pela média?

Certamente já ouviu falar de prematuros que sobreviveram com uma qualidade de vida bastante reduzida, havendo uma parte que nem sequer sobrevive mais do que alguns meses.
Quando escreve "provoque-se o nascimento e acolha-se o ser de forma a proporcionar-lhe a sobrevivencia", a qualidade de vida do "ser" entra na equação? E a duração da sua vida?
E se a criança não sobreviver ao "parto provocado por opção da mulher"?

2) Também não consigo aceitar muito bem o conceito de a gravidez ser terminada, por opção da mulher, a qualquer momento. Antes do momento em que o "ser" possa sobreviver é aborto, depois é nascimento provocado.
Em qualquer caso, o interesse do "ser" é completamente desvalorizado e apenas a vontade da mulher interessa.

3) Em relação às acções ou omissões deliberadas, tem razão em que o deliberadas será excessivo.
Mas, como o maiquelnaite saberá, os métodos contraceptivos são bastante seguros. Não é por se se esquecer de tomar a pílula uma vez que se engravida, quanto mais não seja porque, tendo-se esquecido de tomar a pílula, pode sempre recorrer ao preservativo ou à pílula do dia seguinte. Se a mulher tiver propensão para se esquecer de tomar a pílula, pode usar antes o implante contraceptivo.

A "namoradinha de 13 anos", além de ser inimputável, pode recorrer ao aborto através da Lei actual, assim como a mulher violada.

Quanto ao "preservativo roto", se o aborto é uma decisão assim tão difícil e a mulher está mesmo decidida a não engravidar, não se justificará "protecção reforçada" (p.e. dupla)? Ou o aborto não é uma decisão assim tão difícil que justifique os cuidados adequados?
E, novamente, haverá alguma razão para não recorrer à pílula do dia seguinte?

Pensando bem, devo dizer que, afinal, acções ou omissões deliberadas não é assim tão excessivo. Afinal, é precisamente a esses casos que se aplicará o aborto a pedido.

4) Quanto ao pai (que) atropela o seu próprio filho e depois o Direito Penal não lhe exija (sob pena de prisão até 3 anos) que doe sangue ao miúdo, não percebi se o maiquelnaite defende que o pai devia ser obrigado a doar sangue ao miúdo ou não.
Além de que o pai não será a única pessoa a poder doar sangue ao filho mas a grávida é a única que pode continuar a gestação do feto.

Um abraço.
 
bluesmile,

Eu sei que não devia mas o tom do seu comentário é irresistível.

O bluesmile percebeu sequer alguma coisa do que o maiquelnaite escreveu (além de que defende a despenalização do aborto a pedido) ou basta esse pormenor para a argumentação ser "excelente", "sucinta", "irrepreensível" e "muito inteligente"?
 
Bluesmile,

leu o que eu escrevi sobre os direitos dos nascituros?
Então tenho uma notícia para lhe dar. Nascituro é aquele que já foi concebido e ainda não nasceu. Logo, o embrião é um nascituro. Consegue agora responder à sua questão "e os embriões têm direitos de personalidade" ou vai pedir esclarecimentos adicionais?
 
Joaquim Amado Lopes:

"(...)Em primeiro lugar, como se determina o momento até ao qual é impossível que o feto sobreviva fora do corpo da grávida? Por defeito ou por excesso?
E como se conjugam diferentes opiniões de diferentes especialistas? Pela média?(...)"

A resposta ponderosa será "por excesso". Mesmo que exista uma limitação da liberdade sobre o domínio corporal da grávida, facilmente se entende a diferença entre uma ou duas semanas e nove meses. Ainda assim este ponto parece-me completamente irrelevante para a discussão actual já que o que vai ser referendado são as 10 semanas, limite com bastante "excesso" em relação a fetos viáveis. Que eu saiba (embora não seja especialista) a viabilidade de um feto é estabelecida em termos temporais às 24 semanas, longe das 10 que estão em causa e facilmente verificáveis empíricamente. Sabendo que há fetos que sobrevivem às 21, 22 semanas, não me choca que existisse cautela no estabelecimento de um limite, do género: "se a gravidez é levada, por livre vontade, até às 20 semanas o nascimento provocado só pode ocorrer às 24".

"(...)Certamente já ouviu falar de prematuros que sobreviveram com uma qualidade de vida bastante reduzida, havendo uma parte que nem sequer sobrevive mais do que alguns meses.
Quando escreve "provoque-se o nascimento e acolha-se o ser de forma a proporcionar-lhe a sobrevivencia", a qualidade de vida do "ser" entra na equação? E a duração da sua vida?
E se a criança não sobreviver ao "parto provocado por opção da mulher"?(...)"

Logicamente que a qualidade de vida entram na equação. Da mesma forma que a liberdade individual da grávida entra na equação. Porque se haveria de desconsiderar algum destes factores? Novamente remeto-o para o que está em cima da mesa, 10 semanas de gestação, limite mais do que suficiente para assegurar a não viabilidade do feto. E para a minha proposta pessoal de limite cauteloso de acordo com a vontade da grávida.

"(...)2) Também não consigo aceitar muito bem o conceito de a gravidez ser terminada, por opção da mulher, a qualquer momento. Antes do momento em que o "ser" possa sobreviver é aborto, depois é nascimento provocado.
Em qualquer caso, o interesse do "ser" é completamente desvalorizado e apenas a vontade da mulher interessa.(...)"

Se quer entrar em detalhes (e repare que são mesmo apenas especificidades sobre a minha tese, pouco interesse têm em relação ao referendo em causa), posso dizer-lhe que também me causa algum desconforto (irracional, mas ainda assim está lá. Como é um desconforto completamente subjectivo, não me parece que seja fundamento para impôr comportamentos) a possibilidade de terminar a gravidez a qualquer momento. Uma das chatices destes debates de barricada é o afastamento redical entre pessoas que afinal não têm pensamentos assim tão diferentes. Uma solução, a meu ver não a mais adequada mas ainda assim aceitável do ponto de vista da liberdade individual, seria a impossibilidade de interrupção da gravidez depois de haver uma aceitação da mesma por parte da grávida. Basicamente, uma mulher teria a oportunidade de abortar durante um certo tempo, depois de saber que estava grávida. Se aceitasse a gravidez teria de a concluir. Esta solução respeitaria ainda a liberdade individual da grávida sobre a sua integridade física (não na medida em que eu o defendo, mas ainda assim...)e ao mesmo tempo estabeleceria uma grande cautela em relação aos "direitos" (entre aspas apenas porque falamos de algo que é alvo de grande dissenso) do gestante. Não seria a solução ideal, mas seria de longe melhor do que a lei que temos hoje. E acautelaria as reservas que o joaquim aponta.

"(...)3) Em relação às acções ou omissões deliberadas, tem razão em que o deliberadas será excessivo.
Mas, como o maiquelnaite saberá, os métodos contraceptivos são bastante seguros. Não é por se se esquecer de tomar a pílula uma vez que se engravida, quanto mais não seja porque, tendo-se esquecido de tomar a pílula, pode sempre recorrer ao preservativo ou à pílula do dia seguinte.(...)"

Uma mulher que conheço engravidou porque (segundo me disse e não tenho motivos para duvidar) se esqueceu de tomar a pílula 2 noites.

"(...)Se a mulher tiver propensão para se esquecer de tomar a pílula, pode usar antes o implante contraceptivo.(...)"
As mulheres que tem propensão para se esquecer de tomar a pílula descobrem-no, boa parte das vezes das vezes, quando engravidam. O que fazer? Esconder a cabeça na areia e fingir que estas coisas não acontecem?

"(...)A "namoradinha de 13 anos", além de ser inimputável, pode recorrer ao aborto através da Lei actual(...)"
"Pode" no sentido "existe essa possibilidade" e não no sentido "pode, se o quiser". É necessário que o abortamento seja o "único meio de remover perigo de (...) grave e irreversível lesão (...) para a saúde psíquica da (...)" rapariguinha. Não é bem a mesma coisa.

"(...), assim como a mulher violada.(...)"
Sim sim. Exactamente porque não há qualquer vontade "deliberada".

"(...)Quanto ao "preservativo roto", se o aborto é uma decisão assim tão difícil e a mulher está mesmo decidida a não engravidar, não se justificará "protecção reforçada" (p.e. dupla)?(...)"
Um amigo meu verificava todos os preservativos depois de os usar, enchendo-os de água. Mais do que uma vez verificou que rompiam. Quanto à questão da "protecção reforçada" remeto-o para as suas próprias palavras: "como o maiquelnaite saberá, os métodos contraceptivos são bastante seguros". É isso mesmo, os métodos são hoje em dia muito seguros, as pessoas no mundo real não praticam sexo com protecção reforçada. Acha mesmo que vão começar a fazê-lo (com os custos adicionais em termos emocionais, económicos e relativos ao prazer sexual) quando a probabilidade de uma gravidez é tão pequena? Se a sua resposta a esta pergunta é "não, mas deviam", note que a sua resposta na verdade é "não. No mundo real isto não vai acontecer".

"(...)E, novamente, haverá alguma razão para não recorrer à pílula do dia seguinte?(...)"
Talvez porque às vezes no mundo real, as mulheres não sentem a concepção. Ou porque os efeitos secundários destas pílulas são tão horríveis que numa situação de risco de gravidez de 1 hipotese em 100, a mulher prefere arriscar (os farmaceuticos avisam sempre: "veja lá se tem a certeza, olhe que isto deixa-a muito mal durante uma data de tempo"). Ou porque a pilula não está dísponivel (por exemplo, tente arranjar uma numa aldeia de Serra da Estrela. Ou em Coimbra nas manhãs da Queima das Fitas). Ou porque não há dinheiro. Posso continuar se quiser, mas acho que até você reconhece que estas coisas acontecem muitas vezes, sem qualquer culpa das mulheres.

"(...)Pensando bem, devo dizer que, afinal, acções ou omissões deliberadas não é assim tão excessivo. Afinal, é precisamente a esses casos que se aplicará o aborto a pedido...(...)"
Pois, mas então das duas uma. Ou as mulheres adoram andar a abortar por aí sem condições, e querem é aborto a pedido por motivos fúteis. (não me parece que seja o caso, nunca ouvi ninguém dizer "adorei abortar").
Ou então as mulheres na verdade são é umas irresponsáveis que não antevêem uma gravidez futura e se marimbam no momento em que podiam evitá-la, usando a pílula do dia seguinte (e se fôr o caso, as mulheres sendo irresponsáveis, é porque não têm "responsabilidade [duh], logo não há acção "deliberada"). Uma terceira opção será abrir os olhos e dizer que há muitos motivos diferentes para as gravidezes indesejadas, em alguns casos há descuido, noutros há negligência e noutros ainda as coisas acontecem sem qualquer responsabilidade das mulheres.
Em suma, você diz que uma gravidez é um resultado possível de praticar sexo por isso quem o pratica deve conformar-se com isso. A mulher que engravida fá-lo sempre deliberadamente. Faça o tal favor de abrir um pouco os olhos ao mundo que o rodeia.

"(...)4) Quanto ao pai (que) atropela o seu próprio filho e depois o Direito Penal não lhe exija (sob pena de prisão até 3 anos) que doe sangue ao miúdo, não percebi se o maiquelnaite defende que o pai devia ser obrigado a doar sangue ao miúdo ou não.(...)"
Obviamente que não defendo que exista sanção penal pelo facto de recusar dar o seu sangue. O seu corpo é seu, sempre.

"(...)Além de que o pai não será a única pessoa a poder doar sangue ao filho mas a grávida é a única que pode continuar a gestação do feto.(...)"
Pois, mas e fôr um tipo de sangue raro e não houver outro dador disponível? Existe alguma sanção penal? Ou, para supor um caso menos excepcional, um pai que recusa dar medula quando é o único dador possível? Existe alguma sanção? Aguardo a sua resposta.

Um abraço.
 
Maflada:
Vou concerteza pedir esclarecimentos adicionais...

a) A deixa parte do seu património, em testamento ao nascituro de B, uma protegida jovem em idade fértil.

Após a morte d A , B engravida de C , um embrião.

Em seguida tem um aborto.

B tem direito a herdar parte do património de A???

E porque não?

E se em vez de ser um embrião, C fosse uma criança e morresse..

B teria direitos sucessórios ou não?

Ma então o C embrião e o C crinça não eram uma Pessoa, precisamente com a mesma tuitela jurídica plena?


b) Se o embrião tem integralmente todos direito os direitos de personalidade , questiono eu, será que as ecografias e a amniocentese não violam claramente o direito à imagem e mesmo à reservar da vida privada???
E que acha da sua utilização pra fisn publicitários sem o consentimento do embrião???
EStas técnicas deviam ser proibidas?
 
Quim Lopes:

Uma resposta sucinta: percebi.
 
maiquelnaite,

Relativamente a a mulher poder abortar à vontade enquanto o feto não puder sobreviver fora do útero, concordo consigo que não é isso que está em jogo neste referendo e podemos passar à frente. Mas fico a compreender por que defende a despenalização do aborto a pedido até às 10 semanas: o maiquelnaite não reconhece ao feto qualquer direito até ele poder sobreviver fora do útero e, portanto, é natural que considere que a mulher possa decidir livremente sobre continuar ou terminar (não é o mesmo que interromper) a gravidez.
Não posso concordar de forma alguma com a sua opinião mas cada um tem direito a ter a sua opinião própria, por mais insustentável que pareça aos outros. Passemos à frente.

Uma mulher que conheço engravidou porque (segundo me disse e não tenho motivos para duvidar) se esqueceu de tomar a pílula 2 noites.
Pois eu sei um bocadinho sobre o assunto (não muito mas o suficiente) e posso dizer-lhe, sem qualquer margem para dúvidas, que essa afirmação não pode de forma alguma corresponder à realidade.

Nenhuma mulher engravida por se esquecer de tomar a pílula, seja durante 2 dias ou 2 anos.
Quanto muito, essa sua conhecida terá engravidado por se ter esquecido de tomar a pílula 2 dias seguidos, ter mantido relações sexuais desprotegidas (que, além de constituir um comportamento de risco é extremamente fácil de evitar) e não ter recorrido à pílula do dia seguinte (que é vendida sem receita médica nas farmácias e pode ser tomada até 72 horas depois da relação sexual).

O maiquelnaite pode achar que estou a ser picuinhas mas não é bem assim.
A realidade é que, a ter sido como referi, a sua conhecida ter-se-á esquecido de tomar a pílula (o que é perfeitamente natural) mas, perante o risco de uma relação sexual desprotegida, decidiu não se precaver contra uma possível gravidez e, perante o facto consumado da relação sexual desprotegida, decidiu não garantir que uma possível gravidez era terminada logo no início.
Assim, estamos perante uma situação de duas omissões deliberadas consecutivas.

A namoradinha de 13 anos.
Creio que seria bastante fácil encontrar um médico que considere que uma criança de 13 anos não está fisica nem emocionalmente desenvolvida para levar uma gravidez a termo. Mas essa é apenas a minha convicção.

"(...)E, novamente, haverá alguma razão para não recorrer à pílula do dia seguinte?(...)"
Talvez porque às vezes no mundo real, as mulheres não sentem a concepção.

Pois não mas sentem de certeza a relação de risco. E, se estão tão decididas a não ter uma criança que até estão dispostas a sujeitar-se a uma experiência tão traumatizante e difícil quanto um aborto, seria natural não quererem arriscar.

Quanto aos efeitos secundários das pílulas do dia seguinte serem horríveis, está muito enganado (excepto no caso de uso repetido) e recomendo-lhe vivamente que se informe sobre essas pílulas.
Diria mesmo que, se os efeitos secundários da pílula do dia seguinte fossem assim tão horríveis, o Estado nunca permitiria a sua venda sem qualquer tipo de controlo médico. Além de que, quaisquer que sejam os efeitos secundários dessas pílulas, os efeitos secundários do aborto são de certeza muito piores.

Mas compreendo o seu ponto. As pessoas são irresponsáveis e preferem correr riscos. Assim, deve-se facilitar-lhes a vida, removendo as consequências dessas escolhas e objectivamente dizendo-lhes que não há problema em terem comportamentos de risco que o Estado, que p.e. até quer impôr taxas moderadoras para internamentos para cirurgia, cá estará para resolver o problema de forma gratuita, discreta e segura.

Quanto ao conselho para abrir um pouco os olhos ao mundo que o (me) rodeia, devolvo-o.
Dos muitos motivos diferentes para as gravidezes indesejadas, só conseguiu listar descuido (facilmente resolvido a menos que se opte por arriscar), negligência (que eu referi como omissão deliberada) e as coisas (que) acontecem sem qualquer responsabilidade das mulheres (violação, uma das excepções da Lei actual, e...?).
Se o maiquelnaite abrir um pouco os olhos ao mundo que o rodeia, perceberá que as mulheres engravidam porque o querem, porque não estão para se chatear a procurar evitá-lo ou porque não sabem como o evitar. O primeiro caso não vem a propósito, o segundo é omissão deliberada (e tornam-se responsáveis pelas consequências dessa omissão) e o resultado deste referendo será irrelevante para o terceiro. É que quem não conhece os métodos contraceptivos, não tem acesso a eles e/ou tem demasiada vergonha para os obter e usar continuará a engravidar sem o desejar e a não resolver essa gravidez nas primeiras 10 semanas nem através do SNS.

Quanto a haver sansão legal para um pai que é objectiva e deliberadamente responsável por tentar matar o filho e, sendo a única hipótese de o salvar, se recusa a fazê-lo, duvido seriamente que exista tal sansão. E, afastando-me um pouco mais do assunto em discussão, digo-lhe que nem sequer devia haver sansão mas sim a obrigatoriedade efectiva de tal auxílio, mesmo que à força e/ou à custa da vida do agressor. Mas essa é outra discussão.

Enfim, já percebi a sua posição. O maiquelnaite acha que o feto não tem quaisquer direitos e, portanto, não há qualquer implicação ética ou violação de direitos de outros em uma mulher decidir, unilateralmente e apenas porque sim, terminar a gravidez. Eu não concordo.
Como a nossa divergência reside na premissa e não nos argumentos, não nos convenceremos um ao outro. Mas gostei de discutir consigo.

Um abraço.
 
Só mais uma achega: há mais do que um motivo para se votar "sim" e mais do que um motivo para se votar "não".

E pode-se responder sim à pergunta que vai a referendo e, de forma coerente, votar "não" no referendo.
O João Miguel Tavares explicou como, no DN.
 
Joaquim Amado Lopes,

O João Miguel Tavares esqueceu-se da parte final da pergunta do referendo: "(...)em estabelecimento de saúde legalmente autorizado".
Parece mesmo que vamos ter de responder a várias perguntas. Mas só podemos dar uma única resposta.
 
Não acredito que o João Miguel Tavares se tenha esquecido de coisa alguma. Simplesmente terá preferido não complicar a apresentação de um argumento que não precisa de ser complicado.

"em estabelecimento de saúde legalmente autorizado" significará SNS ou clínicas/hospitais particulares. De qualquer das formas, a intenção do Governo é que os abortos sejam sempre pagos pelo Estado. Ora, o Estado pagar abortos em clínicas particulares quando não faz o mesmo para cirúrgicas necessárias é igual a desviar meios hospitalares do Estado dessas intervenções para realizar abortos.
E recordemo-nos que o Estado até quer implementar taxas moderadoras para internamentos para cirurgia. Ou seja, obriga quem precisa de uma cirurgia a pagar uma parte do internamento mas quer pagar os abortos de quem aborta por opção (só o primeiro, um por ano ou quantos a mulher optar por fazer?).

E fica por se ver qual será o empenho com que o Estado irá garantir a aplicação do "até às 10 semanas", considerando que quem já se mostrou interessado em instalar tais clínicas em Portugal faz tábua rasa da Lei em Espanha, realisando abortos a pedido até muito depois das 10 semanas, quando a Lei proíbe esses abortos seja qual fôr o prazo.
 
Joaquim Amado Lopes:
(os bolds nas suas citações são acrescentados por mim, para maior claridade)

"(...)Mas fico a compreender por que defende a despenalização do aborto a pedido até às 10 semanas: o maiquelnaite não reconhece ao feto qualquer direito até ele poder sobreviver fora do útero e, portanto, é natural que considere que a mulher possa decidir livremente sobre continuar ou terminar (não é o mesmo que interromper) a gravidez.(...)"
Engana-se, mais uma vez. Não é que não reconheça qualquer direito ao feto, acontece é que advogo que quaisquer direitos que o feto tenha (e a moldura de direitos que um feto tem são alvo de debate, por isso não entro aqui em mais especificidades sobre o assunto, por serem irrelevantes para o argumento) eles não devem sobrepôr-se ao direito que uma pessoa tem sobre a sua integridade física individual (a grávida). Não é a mesma coisa, nem nada que se pareça.

Quanto às suas mirabolantes considerações acerca de fertilidade e contracepção:
1 - não fale do que não sabe ou não conhece. O caso da minha conhecida aconteceu, falo com conhecimento de causa: ela esqueceu-se de tomar a pílula durante dois dias, durante os quais manteve relações sexuais com o marido. Quando, ao terceiro dia se aperecebeu do esquecimento tomou as diligências necessárias para não engravidar. Ao contrário do que o joaquim afirma ela não se esqueceu uma vez, apercebeu-se do esquecimento e foi ter sexo. Esqueceu-se e quando se apercebeu do facto, retomou a precaução. Engravidou na mesma. Há aqui alguma acção deliberada?! Evite falar do que não sabe, especialmente se vai adoptar um tom moralista.
2 - Mesmo que considere um esquecimento uma omissão deliberada (meu Deus!), em condições perfeitas os contaceptivos orais são eficazes em quase 99% dos casos. Ainda assim isso significa que em cada cem mulheres que tomem a pílula sem falhas, no espaço de um ano uma delas engravidará na mesma. Há aqui alguma acção ou omissão deliberada? Responda se fizer favor.
3 - "(...)Além de que, quaisquer que sejam os efeitos secundários dessas pílulas, os efeitos secundários do aborto são de certeza muito piores.(...)"
Com uma probabilidade pequena de engravidar, entre uma pilula do dia seguinte e arriscar, a escolha não é fácil. Pergunte às mulheres que conhece se preferiam tomar uma pílula do dia seguinte ou fazer um abortamento, arrisco que todas dirão que preferiam tomar a pílula. Mas se assim é, como é que se pode inferir que as mulheres deliberadamente preferem engravidar e abortar a tomar a tal pílula? É porque ganham juízo quando empranham? Ou porque acidentes acontecem?
Quanto ao fármaco em si, lamento abortar as suas concepções sobre o mesmo. Assisti numa farmácia a uma compra de uma pílula do dia seguinte e ouvi o aviso do farmacêutico que lhe descrevi no comentário anterior. Uma amiga minha tomou uma e vomitou durante 3 dias (e peço-lhe encarecidamente que não faça novamente especulações com ares de certeza acerca de um caso que o amigo desconhece, sobre uma pessoa que eu conheço). Pode verificar os efeitos secundários associados a este fármaco aqui:
http://en.wikipedia.org/wiki/Emergency_contraception#Side_effects
E para finalizar este tópico, lembro-lhe (embora aparentemente seja esforço em vão, porque o joaquim não quer ver as evidências) que a pílula do dia seguinte tem uma falibilidade muito maior que os outros contraceptivos orais, chegando em certas condições de utilização aos 40 %. Mais omissões deliberadas, não é?

"(...)Assim, deve-se facilitar-lhes a vida, removendo as consequências dessas escolhas e objectivamente dizendo-lhes que não há problema em terem comportamentos de risco(...)"
Para si as gravidezes indesejadas são um "problema" devido a "comportamentos de risco". E eu a pensar que o sexo consensual e com parceiro fixo não era considerado "comportamento de risco"... sou um romântico.

"(...)que o Estado, que p.e. até quer impôr taxas moderadoras para internamentos para cirurgia, cá estará para resolver o problema de forma gratuita, discreta e segura."
Gostava de saber quem lhe disse que eu defendo que os abortamentos sejam feitos no SNS. Quanto à segurança, de facto só mesmo uma pessoa malvada pode querer que as grávidas não fiquem mutiladas ou morram por fazerem um aborto... (maiquel rebola tanto os olhos que começa a falar de si na terceira pessoa...)

"(...)Se o maiquelnaite abrir um pouco os olhos ao mundo que o rodeia, perceberá que as mulheres engravidam porque o querem, porque não estão para se chatear a procurar evitá-lo ou porque não sabem como o evitar.(...)"
Pois, porque nunca há acidentes... Continue a sonhar joaquim, continue a sonhar.

"(...)O primeiro caso não vem a propósito,(...)"
De acordo.

"(...)o segundo é omissão deliberada (e tornam-se responsáveis pelas consequências dessa omissão)(...)"
Está redondamente enganado, até fere a vista ler coisas destas.

"e o resultado deste referendo será irrelevante para o terceiro. É que quem não conhece os métodos contraceptivos, não tem acesso a eles e/ou tem demasiada vergonha para os obter e usar continuará a engravidar sem o desejar e a não resolver essa gravidez nas primeiras 10 semanas nem através do SNS.(...)"
Pfff, essa é muito boa. Uma rapariga que não sabe o suficiente para se precaver engravida. Você diz que ela de certeza que não vai querer terminar a gravidez quando toma conhecimento dela?! Você fala com umas "certezas" absurdas e perigosas, como se a sua cabecinha fosse o mundo. Evite arrogar-se "certezas absolutas" acerca da vida e das escolhas dos outros. O mundo não é você joaquim.

"Quanto a haver sansão legal para um pai que é objectiva e deliberadamente responsável por tentar matar o filho e, sendo a única hipótese de o salvar, se recusa a fazê-lo, duvido seriamente que exista tal sansão.(...)"
Pois não há sanção, não senhor. As grávidas são o único caso em que o Estado obriga cidadãos a fazerem o que não querem com a integridade física do seu corpo sob ameaça de sanção penal. A meu ver isto está errado e felizmente mudará se o "Sim" vencer. Eu sou pelo amor de mãe voluntário, lá está, devo ser um romântico.

"(...)E, afastando-me um pouco mais do assunto em discussão, digo-lhe que nem sequer devia haver sansão mas sim a obrigatoriedade efectiva de tal auxílio, mesmo que à força e/ou à custa da vida do agressor. Mas essa é outra discussão.(...)"
Esta sua afirmação nem merece comentário. Uma pergunta apenas: que pensa de castigos corporais, trabalhos forçados, pena de morte e tortura?

"(...)Enfim, já percebi a sua posição. O maiquelnaite acha que o feto não tem quaisquer direitos e, portanto, não há qualquer implicação ética ou violação de direitos de outros em uma mulher decidir, unilateralmente e apenas porque sim, terminar a gravidez. Eu não concordo.(...)"
Mais uma vez, não é isso que eu penso. Eu vejo um choque entre direitos: os do feto (embora reserve para outra discussão a exacta natureza, incidência e amplitude destes direitos) e o supremo direito ao domínio sobre a integridade física individual de todos, incluindo as mulheres grávidas. Não é mesma coisa, nem nada que se pareça.

"(...)Como a nossa divergência reside na premissa e não nos argumentos, não nos convenceremos um ao outro. Mas gostei de discutir consigo.(...)"
Não reside na premissa não senhor. Se quiser continuar pode endereçar a tese que realmente defendo, de que se trata de um choque de direitos. Ou responder às várias perguntas que lhe deixo neste comentário. Já para não falar da sua afirmação acerca da possibilidade do Estado mandar imperiosamente no corpo das pessoas, gostava que mais alguém do seu lado da barricada desta discussão se pronunciasse acerca do assunto. Espero (adivinho?) com sinceridade que a sua opinião seja mínoritária.

Um abraço.
 
maiquelnaite,

1) Aceito o esclarecimento relativamente à questão direitos do feto vs direito sobre a própria integridade física.

2) 1 - não fale do que não sabe ou não conhece. O caso da minha conhecida aconteceu, falo com conhecimento de causa: ela esqueceu-se de tomar a pílula durante dois dias, durante os quais manteve relações sexuais com o marido. Quando, ao terceiro dia se aperecebeu do esquecimento tomou as diligências necessárias para não engravidar. Ao contrário do que o joaquim afirma ela não se esqueceu uma vez, apercebeu-se do esquecimento e foi ter sexo.
Eu tento não falar do que não sei mas, por vezes, julgo saber e, na realidade, não sei. Não foi o caso desta vez, como o próprio maiquelnaite se encarregou de esclarecer. Mas o maiquelnaite necessita de ler com atenção aquilo a que responde.

O que escrevi foi:
Nenhuma mulher engravida por se esquecer de tomar a pílula, seja durante 2 dias ou 2 anos.
Quanto muito, essa sua conhecida terá engravidado por se ter esquecido de tomar a pílula 2 dias seguidos, ter mantido relações sexuais desprotegidas (que, além de constituir um comportamento de risco é extremamente fácil de evitar) e não ter recorrido à pílula do dia seguinte (que é vendida sem receita médica nas farmácias e pode ser tomada até 72 horas depois da relação sexual).

Em que é que isto é diferente do que o maiquelnaite escreveu?

3) Esqueceu-se e quando se apercebeu do facto, retomou a precaução. Engravidou na mesma.
O maiquelnaite talvez não saiba mas a sua conhecida sabe (ou devia saber) que a pílula é para ser tomada todos os dias e que, havendo um esquecimento, a protecção pode desaparecer e tornam-se necessárias precauções extra durante algum tempo. É que a função da pílula é impedir a ovulação. Com dois ou mais esquecimentos consecutivos, a ovulação pode ocorrer e a toma das pílulas seguintes não produz qualquer efeito.
Se quiser aprender mais sobre este assunto, recomendo esta página. Não fui eu que escrevi mas é algo que é explicado a todas as mulheres que começam a tomar a pílula com acompanhamento médico.

4) Há aqui alguma acção deliberada?!
Eu não escrevi acção deliberada. Escrevi Assim, estamos perante uma situação de duas omissões deliberadas consecutivas..

5) Evite falar do que não sabe, especialmente se vai adoptar um tom moralista.
Quanto a não saber sobre este assunto, creio que estamos esclarecidos.
Quanto a adoptar tom moralista, reforço a sugestão de reler com mais atenção aquilo a que responde. A informação que transmiti não tem nada de moralista, foi apenas técnica: no esquecimento da toma da pílula, não fazer sexo desprotegido e, tendo este ocorrido e não querendo correr o risco de engravidar, recorrer à pílula do dia seguinte.

6) Mesmo que considere um esquecimento uma omissão deliberada (meu Deus!),
Se tivesse lido com atenção, teria reparado em a sua conhecida ter-se-á esquecido de tomar a pílula (o que é perfeitamente natural). Também teria notado que duas omissões deliberadas consecutivas se refere a sexo desprotegido e não recorrer à pílula do dia seguinte.

7) verificar os efeitos secundários associados a este fármaco (pílula do dia seguinte) aqui: http://en.wikipedia.org/wiki/Emergency_contraception#Side_effects
Fui ver e li The most common side effects of emergency contraception pills are nausea, abdominal pain, fatigue, headache, dizziness, vomiting, and mastalgia. These side effects normally resolve within 24 hours.
Recomendo-lhe vivamente que verifique na Wikipedia os efeitos secundários associados à aspirina.

Não estou de forma alguma a dizer que a pílula do dia seguinte é inócua ou com efeitos comparáveis aos da aspirina. Limitei-me (antes) a responder ao seu comentário os efeitos secundários destas pílulas são tão horríveis que numa situação de risco de gravidez de 1 hipotese em 100, a mulher prefere arriscar.
A toma pílula do dia seguinte deve ser sempre feita com acompanhamento médico e nunca de forma repetida. Mas não tomar essa pílula porque o risco é baixo e preferir arriscar a ter que fazer um aborto parece-me uma escolha bastante simples.

8) E para finalizar este tópico, lembro-lhe (embora aparentemente seja esforço em vão, porque o joaquim não quer ver as evidências) que a pílula do dia seguinte tem uma falibilidade muito maior que os outros contraceptivos orais, chegando em certas condições de utilização aos 40 %. Mais omissões deliberadas, não é?
A falibilidade de qualquer método avalia-se apenas quando este é usado. E, se não se confia nesse método, procura-se evitar vir a ser colocado(a) na situação de ter que recorrer a ele. Mas isto deve ser demasiado moralista para si.

9) Para si as gravidezes indesejadas são um "problema" devido a "comportamentos de risco". E eu a pensar que o sexo consensual e com parceiro fixo não era considerado "comportamento de risco"... sou um romântico.
Não querer engravidar e fazer sexo desprotegido não é um comportamento risco? Bem, discordamos numa série de coisas portanto vamos concordar em que discordamos também nisto.

10) Gostava de saber quem lhe disse que eu defendo que os abortamentos sejam feitos no SNS. Quanto à segurança, de facto só mesmo uma pessoa malvada pode querer que as grávidas não fiquem mutiladas ou morram por fazerem um aborto...
Ninguém me disse nem eu o afirmei e só retirando o que escrevi do contexto se pode justificar o seu comentário.
De qualquer forma, no referendo não estamos apenas a responder ao que é perguntado mas a dar (ou não) o nosso aval aos resultados legislativos (mesmo que não perguntados directamente) que virão com o "sim". Nomeadamente, a gratuitidade dos abortos a pedido.

11) "JAL (...)o segundo (não estão para se chatear a procurar evitá-lo) é omissão deliberada (e tornam-se responsáveis pelas consequências dessa omissão)(...)"
(maiquelnaite) Está redondamente enganado, até fere a vista ler coisas destas.

Não estar para se chatear a procurar evitar uma gravidez não é uma omissão deliberada?! O maiquelnaite leu sequer o que eu escrevi?

A certos comentários seus (e ao tom, para ser sincero) prefiro nem sequer responder.

Um abraço.
 
Quando uma discussão se prolonga, é natural que derive para matérias laterais e que o tom das intervenções flutue. Assim, e para voltar ao essencial, renovo a afirmação de que a posição de quem não reconhece quaisquer direitos aos nascituros, nem sequer o direito à vida, ou que, reconhecendo-lhes o direito à vida, sobrepõe a esse direito o da mulher a decidir sobre o seu próprio corpo é, se sincera, absolutamente respeitável.

Para mim, a vida humana deve ser valorizada e defendida. Acabar com uma vida humana, mesmo que ainda em formação, apenas porque sim não é aceitável.

As mulheres têem todo o direito a decidir sobre o seu corpo. Mas, nesta discussão, esse direito realiza-se a montante da gravidez, através do recurso (ou não) à contracepção ou outros meios que permitam evitar essa gravidez. A partir do momento em que esta se confirma, passa a existir outra vida humana envolvida e essa deve ser defendida pelo Estado. Na medida do razoável, naturalmente.
 
Quim Lopes:
Logo no caso de uma violação ou um lafomação fetal, deve-se sempre impór á mulher a violência d euma gravidez nestas circunstãncias?
Sim ou Não?
 
A ver se não continuam os defensores do NÃO a fingir que não ouvem a pergunta:

Porque é que a mulher violada tem direito a abortar sem que essa conduta seja crime e a mulher não violada não tem ?

Porque é que uma mulher gr´qvida de um filho com deficiência tem direito a abortar sem que essa conduta seja crime e a mulher grávida de um filho são nã otem ?

Talvez o joaquim amado lopes possa esclarecer a minha dúvida, agora que escreveu que essa coisa da gravidez se evita com preservativos e pílulas e diafragamas e o método das temperaturas e essas coisas assim e que, uma vez a mulher grávida, o Estado deve defender o feto.

E por favor, por favor, não respondam com as construções do Direito ou o que V. acham que são as construções do Direito: respondam com a vossa moral e a vossa ética !
 
bluesmile,

Nota prévia: assino com Joaquim Amado Lopes, portanto é suposto ser esse o meu nome; como não nos conhecemos, tratar-me, já mais do que uma vez, por "Quim Lopes" (ou qualquer outra derivação) soa a provocação; trate-me por "Joaquim", por "Joaquim Amado Lopes", até mesmo por "Amado Lopes" (o meu apelido) ou identifique-se para eu saber que o que parece uma provocação é na realidade familiaridade; isto se quiser que eu lhe volte a responder.

Logo no caso de uma violação ou um lafomação fetal, deve-se sempre impór á mulher a violência d euma gravidez nestas circunstãncias?
Se quiser que lhe respondem (independentemente da forma como se lhes dirija), convém fazer uma pergunta que se entenda.

Não sendo possível perceber o que está a perguntar, reparo em "violação" ou "malformação fetal". Se acha que, para prever esses casos, a Lei precisa de ser mudada de modo a permitir o aborto a pedido, recomendo-lhe vivamente que consulte a Lei actual.
 
Não se entende a insistência da questão do anónimo acima...

Neste referendo não está em causa a revogação das excepções à Lei, ou está? O facto de se defender a não alteração da Lei não nos obriga a subscrever as suas excepções, ou obriga? Cada coisa no tempo certo e o que agora está em causa é a colocação de um ser vivo à mercê da arbitrariedade da sua progenitora. Tão somente isto.

Você e outros como você andam a criar manobras de diversão para desviar a discussão do assunto em causa. Mal grado aqueles que lhe cedem à picardia...
 
Anonymous,

Antes de acusar os outros de fingirem não ouvir a pergunta, não acha que devia deixar de fingir que não ouviu a resposta?

Além de que a Lei actual não vai ser referendada, pelo que a posição de cada um relativamente às excepções actuais é irrelevante para esta discussão.
 
joaquim amado lopes, uma resposta rápida aos seus vários pontos:

ponto 1 - Aceita o meu esclarecimento, mas pelos vistos opta por não contrapôr argumentos. Para quem disse que gostou de discutir comigo noto uma certa falta de vontade de o fazer de facto. Se quiser fazer essa discussão, afinal de contas o cerne da questão e a razão de ser de comentar neste blog, cá estarei de bom grado.

pontos 2 a 9 - Agradeço os seus esclarecimentos (mesmo os que não precisava) em relação a contraceptivos. O que retive das suas explicações foi: a minha conhecida foi descuidada e isso é a mesma coisa que engravidar deliberadamente; quem não toma a pílula do dia seguinte engravida deliberadamente; e mesmo quem toma a pílula do dia seguinte e ela falha engravida deliberadamente porque as pessoas podem não ter sexo se não quiserem. É mais ou menos isto? Caso tenha treslido o que disse, faça o favor de me corrigir. Noto ainda que numa resposta de 11 pontos você usa 8 a explicar-me que a minha conhecida, tal como todas as mulheres em todas as situações, engravidou deliberadamente. Claro que se lhe perguntar, ela lhe dirá, em consciência, que engravidou contra a sua vontade. Mas isso são detalhes, especialmente para quem tem tanta certeza dos estados de espírito dos outros em todas as ocasiões.

ponto 9 - Não querer engravidar e fazer sexo desprotegido não é um comportamento risco?
Aqui estamos claramente a falar de "comportamentos de risco" de tons diferentes. Eu quando oiço a expressão "comportamentos de risco" vem-me à cabeça aqueles senhores da televisão que falam sobre drogas ou as enfermeiras da pré-entrevista quando se vai dar sangue. Nesses contextos a expressão "comportamentos de risco" tem um tom claramente pejorativo. É claro para mim agora que o joaquim falava do "risco de engravidar", usando a expressão de maneira menos gravosa. Tudo ok, afinal.

ponto 10 - De qualquer forma, no referendo não estamos apenas a responder ao que é perguntado mas a dar (ou não) o nosso aval aos resultados legislativos (mesmo que não perguntados directamente) que virão com o "sim". Nomeadamente, a gratuitidade dos abortos a pedido.
Pois a questão da gratuitidade já não me é perguntado no referendo. Para essa questão em particular usarei o meu voto legislativo. Acredito no entanto que em face da importância da questão proposta, essa aspecto assume um carácter bem menos relevante. Até porque se pode fazer o exercício ao contrário, também se pode arguir que à pergunta é implícito um aval ao "uso do nosso dinheiro para perseguir criminalmente mulheres que abortem". Tem piada que ninguém vê isto desta maneira.

ponto 11 - Mais uma vez o joaquim argui que toda a gravidez de uma mulher adulta que não é violada é voluntária, quaisquer que sejam as circunstâncias. Não posso concordar de forma alguma, desculpe que lhe diga mas esta sua ideia parece-me mirabolante. Já abandonei qualquer esperança de o chamar à razão neste aspecto de as "gravidezes serem sempre deliberadas". Ficamos assim, portanto, até porque em relação ao pensamento que defendo esta questão é relativamente secundária.

"(...)A certos comentários seus (e ao tom, para ser sincero) prefiro nem sequer responder."
Imagino que isto seja em (não-)resposta à minha inquirição sobre o que pensa de "castigos corporais, trabalhos forçados, pena de morte e tortura". Talvez ache excessivo o meu comentário, mas talvez desconheça também que alguns dos mais importantes fundamentos jurídicos modernos contra estas práticas se fundam exactamente no príncipio da soberania do individuo sobre o seu corpo. Ou, mais concretamente, que ao Estado nunca é reconhecida necessidade de intervenção suficiente (porque se deve restringir ao mínimo suportável a manietação da liberdade dos individuos por parte do Estado) que justifique interferir com a integridade física das pessoas. Ora esse é exactamente o principio que me leva a defender a despenalização do aborto. O joaquim defende, por seu lado, que o Estado deve fazer essa interferência em determinadas situações. Como vê, embora tivesse tom claro de provocação, o meu comentário não vinha a despropósito e sem justificação.

Nota final: se quiser deixar as questões laterais da discussão e debruçar-se comigo sobre o essencial da mesma, dê notícias.

Um abraço.
 
maiquelnaite,

ponto 1:
O maiquelnaite acha que o direito da mulher a dispôr do seu corpo se sobrepõe ao direito à vida do feto, eu acho que o direito à vida do feto se sobrepõe ao direito da mulher a dispôr do seu corpo, quando este direito se concretiza na morte do feto apenas porque sim. Esta é uma questão de princípio e, na minha opinião, não há quaisquer argumentos a apresentar. Eu aceito a sua posição, o maiquelnaite aceite a minha se quiser.

Se achar que consegue explicar por que razão o direito da mulher em dispôr do seu corpo se sobrepõe ao direito à vida do feto, esteja à vontade.

pontos 2 a 9:
O tom da resposta anterior levou-me a acreditar que não era o mesmo maiquelnaite. Pelos vistos é e optou por continuar a pôr no meu teclado palavras e expressões que não escrevi. O maiquelnaite não tresleu, simplesmente não leu o que afirma ter lido.

a) Folgo em verificar que deixou cair totalmente a questão dos efeitos secundários horríveis da pílula do dia seguinte.

b) Não reconhece o seu erro ao ler "acções deliberadas" quando o que escrevi foi "omissões deliberadas". Mais, insiste nessa confusão
O maiquelnaite já demonstrou anteriormente que é suficientemente inteligente e informado para saber que "acção deliberada" é "faço isto porque sei que assim acontece aquilo" enquanto que "omissão deliberada" é "sei que se fizer isto aquilo não acontece e se não fizer isto aquilo pode acontecer mas, apesar de não querer que aquilo aconteça, não vou fazer isto". É a diferença entre tentar que aconteça e não tentar evitar que aconteça.

A sua amiga, depois de não ter procurado garantir que não engravidava, dizer que "engravidou contra a sua vontade" é o mesmo que alguém conduzir em velocidade excessiva e com más condições de tempo e de piso dizer depois que não "queria ter nenhum acidente".
Ela não tentou engravidar. Só não tentou realmente não engravidar.

c) Para sustentar o seu argumento, apresentou o caso de uma sua conhecida que, tendo-se esquecido de tomar a pílula, não tomou quaisquer precauções para evitar uma gravidez que não desejava e, tendo mantido relações sexuais não protegidas, não fez nada para garantir que de tais relações sexuais não resultava uma gravidez.
Agora, escreve mesmo quem toma a pílula do dia seguinte e ela falha engravida deliberadamente porque as pessoas podem não ter sexo se não quiserem.
Além de pretender colar-me a uma moralidade bacoca que não manifestei nem defendi, apresente-me o caso de alguém que tenha realmente tomado as devidas precauções para evitar engravidar e mesmo assim tenha engravidado e podemos discuti-lo.

Quanto ao engravidou deliberadamente, a sua insistência em pôr no meu teclado expressões/frases que eu não escrevi já nem sequer levanta suspeitas: confirma-as.

ponto 10:
O resultado do referendo é irrelevante para o "uso do nosso dinheiro para perseguir criminalmente mulheres que abortem". É que a despenalização proposta é apenas até às 10 semanas.
Tem sido avançado e nunca questionado por si que todos os processos já julgados ou a serem julgados se referem a abortos feitos após as 10 semanas.

ponto 11:
Volta a ignorar deliberadamente o que escrevi e a trocar estrategicamente algumas palavras para desvalorizar os meus argumentos. Na realidade, está apenas a desvalorizar algo que eu não escrevi.
Pretender que defendi que "as gravidezes são sempre deliberadas" para depois desistir de me chamar à razão já se tornou ridículo.

ponto 12:
Quanto aos "castigos corporais, trabalhos forçados, pena de morte e tortura", algo claramente lateral à discussão e sem responder se concordo ou não, há uma diferença fundamental que lhe dará jeito ignorar: não permitir (penalizando criminalmente) que uma mulher acabe com uma vida humana em formação apenas porque sim não é nenhum castigo por um crime cometido, ainda menos quando a mulher, não querendo engravidar, o pode evitar.

Nota final:
O que preferi não responder antes foi ao tom e ao tipo de comentários que o maiquelnaite repetiu nesta sua última resposta. Decidi isso por não querer que este debate se tornasse agressivo. Com a sua última resposta, verifico que estou sózinho nesse desejo.

É que o maiquelnaite, apesar de no início ter demonstrado inteligência, argumentos fundamentados (mesmo que não concordemos com eles) e capacidade para manter uma discussão interessante, facilmente caiu na superficialidade ("engravidou porque se esqueceu de tomar a pílula dois dias" e "verifique na Wikipedia as consequências horríveis da pílula do dia seguinte") e na demagogia hipócrita (confundir "omissões deliberadas" com "acções deliberadas" ou pretender que defendo que "toda a gravidez de uma mulher adulta que não é violada é voluntária, quaisquer que sejam as circunstâncias").

Quando se decidir a pôr de lado a superficialidade (deiberada porque não é constante), a demagogia hipócrita e a condescendência paternalista completamente deslocada, dê notícias. Até lá, fique bem.

Um abraço.
 
(...)O maiquelnaite acha que o direito da mulher a dispôr do seu corpo se sobrepõe ao direito à vida do feto, eu acho que o direito à vida do feto se sobrepõe ao direito da mulher a dispôr do seu corpo, quando este direito se concretiza na morte do feto apenas porque sim(...)"
Substitua o "porque sim" por "porque quer dispôr livremente do seu corpo" e a sua afirmação torna-se exacta e não tendenciosa. Ccom as palavras que usa há um claro afastamento daquilo que defendo ser o fundamento da não penalização: a vontade individual. As suas palavras indiciam que não há motivo para a "interrupção" da gravidez quando o meu argumento é o de que a vontade individual é justamente esse motivo. De resto e de momento, nada a acrescentar.

"(...)Folgo em verificar que deixou cair totalmente a questão dos efeitos secundários horríveis da pílula do dia seguinte.(...)"
Folgue o que quiser, os três dias de vómito e náusea ninguém os tira à minha amiga. Se me quer chamar de mentiroso, faça favor, se não, deixe lá o joaquim de tentar passar a ideia de que não existe a possibilidade séria de uma toma do fármaco causar efeitos horríveis. (se quiser pode instruir-me em que situações a palavra "horrível" deve ser apropriadamente utilizada, mas agradecia que não fizesse por essa ser uma discussão estéril.)

"(...)Não reconhece o seu erro ao ler "acções deliberadas" quando o que escrevi foi "omissões deliberadas". Mais, insiste nessa confusão.(...)"
Para esclarecer de uma vez esta nossa "divergência" acerca de "omissões", "acções" e equivalentes: "acção" e "omissão" são duas formas de "comissão", ou seja, duas formas igualmente idóneas a produzir um resultado. Se a "omissão" tem normalmente associada uma conotação menos gravosa em termos de culpa, não deixa de ser uma forma tão apropriada a produzir um resultado como uma acção. Ou seja, essa aura de menor "gravidade" ou "intenção de cometer" é apenas aparente. Pode o joaquim querer realmente afirmar que a essas "omissões" de que fala corresponde mais um carácter de negligência do que corresponderia a uma "acção" (que nas situações em apreciação seria a "relação sexual"). Se fôr esse o caso, não fale de "omissões deliberadas" (pois não passam de uma forma de produzir um resultado com dignidade igual a uma "acção") mas de "negligência" (em qualquer das suas formas, incluindo a "consciente"). Será talvez benéfico para a discussão, já que fico com a ideia que ou estamos a falar de coisas diferentes ou o joaquim não joga com o baralho todo. Para simplificar a questão, peço-lhe que me responda a estas perguntas:
a)todas as mulheres que engravidam fazem-no de forma deliberada?
b)todas as mulheres que engravidam de forma não deliberada, fazem-no por resultado de negligência própria?
Se responder "não; sim" como suspeito que fará estamos os dois a falar e "negligência" embora o joaquim até agora tenha grafado "omissão deliberada". Cuido que será o caso.

"(...)O resultado do referendo é irrelevante para o "uso do nosso dinheiro para perseguir criminalmente mulheres que abortem". É que a despenalização proposta é apenas até às 10 semanas.(...)"
Se quer mesmo, passo a clarificar: a pergunta do referendo pode ser interpretada como uma forma de avalizar o "uso do nosso dinheiro para perseguir criminalmente e sustentar no cárcere mulheres que abortem até às 10 semanas". Do lado do "Sim" não conheço ninguém que tenha feito esta interpretação, tão legítima quanto a inversa (acerca dos contribuintes pagarem os abortamentos no SNS). Se alguém o fez parece-me que errou, pois a questão de pôr ou não pessoas na prisão parece-me bem mais importante do que o dinheiro em causa. Julgo que terá entendido o alcance do que afirmei, se não, espero tê-lo esclarecido agora.

"(...)Quanto aos "castigos corporais, trabalhos forçados, pena de morte e tortura", algo claramente lateral à discussão e sem responder se concordo ou não,(...)"
Tenho sincera pena que não responda pois um dos pontos principais da minha argumentação passa exactamente pelo respeito a um dos principais principios que proíbem tais práticas no Direito moderno. Saber se concorda com esse principio e se o aceita na sua total abrangência é essencial para que possa apresentar-lhe e defender a minha tese. Se o joaquim não aceita esse principio, serei o primeiro a desistir de discutir consigo o assunto da penalização abortamento. Respeitarei, na medida do possível, as suas ideias mas recusar-me-ei a perder tempo consigo.

"(...)há uma diferença fundamental que lhe dará jeito ignorar: não permitir (penalizando criminalmente) que uma mulher acabe com uma vida humana em formação apenas porque sim não é nenhum castigo por um crime cometido (...)"
Peço desculpa mas não percebi. Está a afirmar que criminalizar um comportamento não é impôr-lhe um castigo?
(Ou estará apenas a dizer que uma "pena" no Direito moderno não é um castigo. Se fôr o caso estou esclarecido quanto ao conteúdo da sua afirmação mas absolutamente perdido quanto à intenção da inclusão desta frase no seu comentário. Que uma pena não é, juridicamente, hoje em dia um castigo, é senso comum. Se por outro lado quis dizer "castigo" no sentido corrente, que juridicamente tomo a liberdade de traduzir para "fardo", então não percebi mesmo, pois criminalizar um comportamento é justamente prever a aplicação de um castigo a um comportamento.)

"(...)O que preferi não responder antes foi ao tom e ao tipo de comentários que o maiquelnaite repetiu nesta sua última resposta. Decidi isso por não querer que este debate se tornasse agressivo. Com a sua última resposta, verifico que estou sózinho nesse desejo.(...)"
Ná, deixe-se lá disso, que eu até posso ferrar o dente de vez em quando mas não sou má pessoa. E o joaquim também não me parece má pessoa, a cordialidade é das qualidades que mais aprecio e isso você tem. Com cordialidade me despeço. Aguardo a sua réplica (nos vários sentidos da palavra).

Um abraço.
 
EScreveu o Lopes:


"eu acho que o direito à vida do feto se sobrepõe ao direito da mulher a dispôr do seu corpo"

As leis de Ceasescu e do Terceiro Reich em todo o seu esplendor.
 
maiquelnaite,

(...) Folgue o que quiser, os três dias de vómito e náusea ninguém os tira à minha amiga. (...)
Tem toda a razão. Entre a mais ou menos remota possibilidade de três dias de vómito e náusea e a mais ou menos remota possibilidade de engravidar, com o resultado de ter que optar entre levar a termo uma gravidez que não se deseja (com todas as consequências para a vida da mulher) e abortar (com mais ou menos remotas possibilidades de consequências para a saúde da mulher muitíssimo mais graves do que vómitos e ou náuseas), alguns compreenderão que a mulher opte pela segunda: arriscar uma gravidez indesejada. Eu não compreendo mas o problema deve ser meu.

De qualquer forma e no caso em concreto, a opção por não tomar a pílula do dia seguinte foi antecedida da opção de ter relações sem usar preservativo, numa situação em que sabia poder não estar protegida contra uma gravidez indesejada.

Para esclarecer de uma vez esta nossa "divergência" acerca de "omissões", "acções" e equivalentes: "acção" e "omissão" são duas formas de "comissão", ou seja, duas formas igualmente idóneas a produzir um resultado. Se a "omissão" tem normalmente associada uma conotação menos gravosa em termos de culpa, não deixa de ser uma forma tão apropriada a produzir um resultado como uma acção.
Tem consciência de que omissão tem normalmente associada uma conotação menos gravosa em termos de culpa do que acção mas (ou será por isso?), apesar de eu ter usado o termo omissão, o maiquelnaite insistiu que eu tinha usado o termo acção, tirando conclusões mirabolantes e fazendo comentários totalmente despropositados.
Creio que estamos conversados relativamente a respeito pelo interlocutor e a estar nesta discussão de forma séria.

a)todas as mulheres que engravidam fazem-no de forma deliberada?
b)todas as mulheres que engravidam de forma não deliberada, fazem-no por resultado de negligência própria?
Se responder "não; sim" como suspeito que fará estamos os dois a falar e "negligência" embora o joaquim até agora tenha grafado "omissão deliberada". Cuido que será o caso.

Já sabe quais são as respostas pelo que as perguntas são de retórica.

Quanto a "omissão" e "omissão deliberada", há uma diferença e eu usei o segundo termo precisamente por causa dessa diferença: as omissões não são todas deliberadas/conscientes.

"(JAL) (...)Quanto aos "castigos corporais, trabalhos forçados, pena de morte e tortura", algo claramente lateral à discussão e sem responder se concordo ou não,(...)"
(maiquelnaite) Tenho sincera pena que não responda pois um dos pontos principais da minha argumentação passa exactamente pelo respeito a um dos principais principios que proíbem tais práticas no Direito moderno. Saber se concorda com esse principio e se o aceita na sua total abrangência é essencial para que possa apresentar-lhe e defender a minha tese. Se o joaquim não aceita esse principio, serei o primeiro a desistir de discutir consigo o assunto da penalização abortamento. Respeitarei, na medida do possível, as suas ideias mas recusar-me-ei a perder tempo consigo.

Pela sua argumentação, há um pormenor que a sua tese pretende ignorar: "castigos corporais, trabalhos forçados, pena de morte e tortura" serão castigos por um crime cometido enquanto que impedir um aborto a pedido não é um castigo por ter engravidado mas a tentativa de impedir que se cometa o crime de acabar com uma vida humana em formação.

Ao procurar impedir que a mulher aborte sem outro motivo além de não querer levar a gravidez a termo, o Estado não está a tentar dispôr do corpo da mulher nem a impor-lhe qualquer condição.

(JAL) "(...)há uma diferença fundamental que lhe dará jeito ignorar: não permitir (penalizando criminalmente) que uma mulher acabe com uma vida humana em formação apenas porque sim não é nenhum castigo por um crime cometido (...)"
(maiquelnaite) Peço desculpa mas não percebi. Está a afirmar que criminalizar um comportamento não é impôr-lhe um castigo?

É claro que percebeu mas, tal como no caso de omissão vs acção, dá-lhe jeito fingir que não percebe.
"não permitir (penalizando criminalmente) que uma mulher acabe com uma vida humana em formação apenas porque sim" não é nenhum castigo por ter engravidado. Criminalizar o aborto a pedido é impôr um castigo ao crime de acabar com uma vida humana em formação fora do que a Lei permite, tentando dessa forma desincentivar a prática desse crime.

(...) eu até posso ferrar o dente de vez em quando mas não sou má pessoa (...)
Se é má pessoa ou não, não sei nem me interessa saber, até porque não sei quem o maiquelnaite é. Mas deturpar deliberadamente as palavras de outra pessoa, procurando colar-lhe opiniões que se sabe que esta não defendeu, para depois tentar ridiculariza-la por ter essas opiniões, não é ferrar o dente.

Um abraço.
 
JAL:
Ando demasiado ocupado para ter sequer os 15 minutos que preciso para lhe responder (prazos a cumprir, é uma chatice), espero poder fazê-lo na próxima semana. Se quiser voltar a esta caixa nesse período terá a minha réplica. Um abraço.
 





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