Postas pescadas

Pela sua relevância, publico um texto que me chegou, da autoria de Estevão Nascimento da Cunha


O ABORTO E A LIBERDADE DA MULHER

A Constituição garante a vida humana em qualquer fase do seu desenvolvimento

O Tribunal Constitucional, no seu recente acórdão sobre o referendo ao aborto decidiu não julgar inconstitucional ou ilegal a pergunta que foi submetida à sua apreciação: “Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas de gravidez, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?” Tratava-se, pois, de decidir sobre a constitucionalidade de uma pergunta que pode levar a que o aborto até às dez semanas deixe de ser crime, e que portanto possa ser livremente praticado pela mulher, à qual seria assim reconhecido o correspondente direito de abortar. ---
Segundo decidiu o Tribunal, a possibilidade de uma mulher livremente abortar em estabelecimento de saúde legalmente autorizado até às dez semanas, independentemente de qualquer justificação, não implicaria a violação do art. 24º, nº 1 da Constituição, que prescreve que “a vida humana é inviolável”. O Tribunal Constitucional não nega que a Constituição proteja a vida humana em gestação até às dez semanas. Afirma mesmo que vida humana intra-uterina é um bem constitucionalmente protegido, “independentemente do momento em que se entenda que esta tem início”, como não poderia deixar de ser, face ao teor do preceito constitucional. E reconhece que o feto é tutelado em nome da dignidade da vida humana, embora não lhe reconhecendo um próprio “direito” à vida pois, segundo afirma, o feto não é pessoa, pelo que a sua vida humana é protegida como um valor constitucional objectivo, não subjectivado (ainda) numa pessoa.Reconhecendo o Tribunal que a Constituição protege a vida intra-uterina, incluindo nas primeiras dez semanas de existência, como é possível que chegue, a final, à conclusão de que a lei pode permitir a supressão livre dessa mesma vida, até à dez semanas, sem desrespeito pela Constituição?Conflito entre a vida humana intra-uterina e a liberdade da mulher: qual deve prevalecer?O Tribunal resolve esta questão encarando o problema como uma situação de conflito de direitos. Considera o Tribunal que estão em causa dois tipos direitos ou valores constitucionais em conflito: a vida humana intra-uterina, por um lado, e por outro vários direitos da mulher, invocando-se especificamente o direito “ao livre desenvolvimento da personalidade, englobando a autonomia individual e a autodeterminação e assegurando a cada um traçar o seu próprio plano de vida”, e o direito a uma “maternidade consciente”. Invoca, ainda, genericamente, outros direitos da mulher, como o seu direito à vida e à integridade física. Não são, no entanto, estes os direitos que a questão levada a referendo especificamente põe em causa, dado que a pergunta se refere a uma permissão genérica de abortar desde que essa seja a “opção” da mulher, isto é, sem que ela tenha que invocar quaisquer justificações, nomeadamente de perigo de vida ou para a saúde, as quais já se encontram contempladas na legislação penal actualmente em vigor. Para o Tribunal a principal questão a resolver é a da resolução desse conflito, solução que diz ter que passar por “uma harmonização, concordância prática, coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito, de forma a evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros”. Acaba, no entanto, por resolver o conflito mediante uma prevalência absoluta até às dez semanas dos invocados direitos da mulher sobre a vida humana em desenvolvimento, renunciando, afinal, à solução de ponderação e de harmonização que ao princípio dizia adoptar, contradição que é veementemente apontada em quase todas as declarações de voto dos Conselheiros vencidos: se até às dez semanas a liberdade da mulher prevalece em geral, abstractamente, em todos os casos, então onde está a ponderação entre os valores em causa? Onde estará a busca da harmonização entre eles? O que há é uma pura e simples anulação de um – a vida humana intra-uterina - que deixa de ter qualquer protecção jurídica face ao valor que aqui é considerado supremo: a liberdade da mulher. O impensável começa a tornar-se realidade: não é a vida que prevalece sobre a liberdade, mas a liberdade que prevalece sobre a vida… Existirá verdadeiro conflito?A existência de um conflito é apresentada como um pressuposto evidente pelo Tribunal, pelo que no Acórdão nem sequer se chega a questionar a real existência de tal conflito. Tem sido, aliás, com base neste pressuposto que têm sido feitas as mais diversas análises, jurídicas, sociais, antropológicas, sobre problema do aborto.Mas será que o conflito existe verdadeiramente?Será que se pode dizer que a liberdade da mulher ter um filho está em conflito com a vida em desenvolvimento? Será que estamos perante um verdadeiro caso de conflito de direitos numa situação em que se pretende salvaguardar a liberdade de traçar um plano de vida próprio frente à realidade de uma gravidez? Será que os dois bens jurídicos referidos – ambos de indesmentível existência e óbvia importância – se encontram aqui numa relação de oposição ou de incompatibilidade entre si?A resposta já foi indiciada pela pergunta: não existe verdadeiro conflito. Entre a vida e a liberdade de procriação, ou o direito à maternidade consciente, ou à autonomia individual da mulher e a consequente liberdade de traçar o seu plano de vida, não pode haver verdadeiro conflito.Com efeito, a garantia da subsistência e do desenvolvimento da vida intra-uterina não entra em recta de colisão com nenhum direito de liberdade da mãe, porque não estão ambos no mesmo plano. A liberdade da mulher simplesmente não está – não pode estar – já em causa, porque essa liberdade abrange apenas e só à própria mulher, não a outros. Se a liberdade não é exercida apenas sobre si própria, mas sobre outros, então deixa de ser liberdade, passando a ser imposição e violência. A salvaguarda da liberdade de planear uma vida sem filhos, ou, mais rigorosamente, sem aquele filho em especial, coloca-se a montante da verificação da gravidez, portanto, da existência da vida humana intra-uterina. A liberdade de determinação do próprio modo de vida, a liberdade de procriação e o direito a uma maternidade consciente jogam-se no momento do acto de procriação que despoleta todo o processo de desenvolvimento da nova vida humana. O mesmo é dizer que o exercício daquela liberdade de procriação ocorreu nessa ocasião determinante. E não pode repetir-se ou ser retomado vezes sem conta como se esse direito fundamental, essa liberdade, não tivesse sido efectivamente exercido. A possibilidade abstracta de exercer determinado direito sobre determinado objecto concreto só subsiste até ao seu concreto exercício. Dizer o contrário seria negar a própria existência dessa liberdade, e a autonomia do seu titular, uma vez que a manutenção ad aeternum da possibilidade de se retomar uma mesma escolha concreta retiraria quaisquer consequências à decisão tomada em primeiro lugar. Tal decisão não teria, assim, nenhum efeito, nem perante o próprio nem perante os outros. Nem sequer se poderia falar de escolha livre. Não haveria qualquer liberdade.Repare-se que o que está em causa é a prática totalmente livre do aborto. Nem sequer se exige, como condição, que a concepção tenha sido forçada ou, de qualquer forma não pretendida: basta somente que a mulher queira abortar. Não há, portanto, que indagar a questão da existência de conflito no caso de o acto de procriação não ter sido livre ou inteiramente esclarecido, pois a permissão pedida pela pergunta submetida a referendo abrange qualquer caso, qualquer situação, incluindo as de concepção totalmente esclarecida ou livre. Contracepção depois da concepção?A mulher não pode invocar o direito a não procriar quando efectivamente já procriou. A existência de uma vida, a existência de uma gravidez, não contende com qualquer direito a evitar a gravidez: num plano seriam duas rectas paralelas que nunca se encontram e, portanto, nunca chocam entre si. Uma vez existente a vida, já não existe direito a evitar que ela surja. Existirão outros direitos: a cuidados de saúde, a auxílio financeiro, a protecção no trabalho: mas não existe o direito de voltar atrás no tempo.A lógica contrária, mantendo depois de iniciada a gravidez as mesmas opções que existiam antes desse início, escancara inadmissivelmente a porta para se considerar o aborto como sendo ainda um método de planeamento familiar, apenas mais um método contraceptivo, dado que se estaria ainda a exercer um direito a “evitar” ter o filho, uma liberdade de (não) procriação.Cair-se-ia no total absurdo de praticar a contracepção após a concepção.

Estêvão Nascimento da Cunha

Comentários:
Se os portugese sao livres,eles iram votar SIMMMMMM, issosim e liberdade, nao moralizar e condenar asmulheres na sua sexualidade. ninguem mexe na sexualidade de ninguem..seja deus seja o estado..ninguem..se sao portugeses livres eles deverao escolher com consciencia humana de liberdade total..

aborto sim, a mulher e livre e deve ser respeitada!!!
 
É quase impossível visitar o vosso blogue sem que este não se apresente cheio de gralhas (ã0§). Mesmo descarregá-lo sucessivamente não resolve o problema. Deviam fazer algo para evitar permanentemente isto, se querem manter um mínimo de acessibilidade.
 
Deixamos esta sugestão do nosso grupo cívico: um tema composto pela Banda Jota que apela à vida. Visitem para ouvir:

http://guardavida.blogspot.com
 
vão a este blog http://kouzaselouzas.blogspot.com/.. não sendo um blog especifico do sim tem um colaborador e fundador que se trave-se a defender o não... até de capado já lhe chamam, mas o gajo (Shrek)não desiste e como sempre, ataca a direita ou esquerda (tanto lhe faz) Mas tem uns texto não muito elaborados mas que exprimem a opinião do povo simples e de ideias firmes. leiam alguns dos postes dele e entenderam o que quero dizer.
 
Quem são os membros do tribunal constitucional? Que sabem eles para além das leis que empinaram no curso de "direito". Têm alguma noção da vida em geral ou das Ciências que se desenvolvem aceleradamente a cada instante? Têm alguma percepção do que é o Humanismo? Sabem o que é o ser humano?
Até hoje, ainda não sei de nenhum, e conheci muitos, que não tenha recorrido - sempre com a possível discrição - a amigos para resolver e trabalhar sobre as muitas matérias que desconhecem em absoluto.
É impensável aceitar que a Sociedade Portuguesa se deixe conduzir por gente que, podendo ser competente no conhecimento das leis - e do tal "direito" - é profundamente ignorante, já não digo das mais elevadas preocupações do Homem mas da vida comum do dia a dia.
É uma lástima...
 
anonymous (12:14 AM),
Experimente, depois de aceder ao site, fazer o refresh (menu View - opção Refresh).


anonymous (7:07 AM),
É realmente uma lástima a facilidade com que certas pessoas debitam disparates como aqueles que aqui destilou.

Os membros do Tribunal Constitucional (conheceu assim tantos?) são pessoas como as outras, com vivência, experiência e humanidade. Como, no exercício das suas funções, são chamados a pronunciarem-se sobre Leis relativas a matérias muito diversas, é mais do que natural que, para decidirem da forma mais adequada, se aconselhem com especialistas nessas matérias específicas. Ninguém sabe tudo sobre tudo e é sinal de inteligência e humildade assumi-lo.
De qualquer forma, os juízes do Tribunal Constitucional pronunciam-se exclusivamente sobre a constitucionalidade de Leis pelo que é nessa área que se exige que eles sejam competentes.

Pelo que aqui escreveu, quem eu não queria ver no Tribunal Constitucional, ou em qualquer Tribunal ou função de responsabilidade, era o anonymous das 7:07 AM.
 
Joaquim Amado,
Pode ter por certo que nunca me verá no tribunal constitucional. Felizmente, não tive apetência para o "direito" que sempre considerei me limitaria a inteligência.
O que podemos constatar, através da constituição que temos - e que tiveram o cuidado de não referendar... - e das diversas "interpretações" que frequentemente são chamados a fazer, é o fraquíssimo grau de competência aliado a uma magistral ignorância.
 
Joaquim Amado,
Julgo que será pura perda de tempo voltar a dirigir-me a si, mas talvez o esforço compense.
Para perceber a idiotice das decisões do "seu" TC, pode consultar uma exposição bastante clara de Carlos Blanco de Morais no Alameda Digital. Se não chegar, há mais sítios que lhe poderei indicar.
 
Anonymous (4:25 AM e 8:12 AM),

As pessoas têem experiências e vivências diferentes. Duas pessoas, olhando para os mesmo factos, vêem duas coisas diferentes.
Há, de facto, posições e opiniões que são idiotas. Por exemplo, a ideia de que apenas está em jogo neste referendo as mulheres irem para a prisão por abortarem, a despenalização do aborto reduzir o número de abortos, às dez semanas o feto ser um mero aglomerado de células ou não ser humano, os médicos deverem ser obrigados a realizar abortos a pedido, o Estado dever pagar abortos motivados apenas pela opção da mulher, a aplicação estrita da Lei actual implicar que todas as mulheres que abortam iriam para a prisão e tantos, tantos disparates que temos ouvido e lido nos últimos meses.
Mas há posições e opiniões que não têem nada que ser consideradas idiotas. Derivam simplesmente de sermos diferentes uns dos outros e, muitas vezes, parecem idiotas simplesmente porque não as entendemos.

As questões que colocou (no seu primeiro comentário) relativamente ao que os Juízes do Tribunal Constitucional (TC) sabem ou não, que noções têem da "vida em geral", e outros disparates, demonstram bem que não seria o "direito" a limitar a sua inteligência. E fazem com que não mereça o mínimo crédito a sua pretensão de classificar as decisões do TC.

E, se não se importa, o meu nome não é Joaquim Amado, é Joaquim Amado Lopes. Se me quiser tratar pelo nome próprio, Joaquim, esteja à vontade. Se voltar a dirigir-se a mim usando um nome que já sabe não ser o meu, interpretarei isso como a indicação que está a escrever apenas para si.
 
Joaquim, ou
Joaquim Amado(como primeiro assinou) ou,
Joaquim Amado Lopes,
Fez-me sorrir - agradeço-lhe. :)
Continuamos nos antípodas, mas isso não tem qualquer importância.
Se quiser aceitar o meu julgamento do TC, óptimo. Se não quiser, paciência. Uma coisa é certa: eu não chamei idiota a ninguém - está a perceber a diferença?
Quanto a inteligência, estou a apreciar a que demonstra.
 
anonymous (5:11 AM),

Recomendo-lhe vivamente que leia com mais atenção aquilo a que responde.

Joaquim Amado(como primeiro assinou)
Em lado algum assinei como Joaquim Amado.

Uma coisa é certa: eu não chamei idiota a ninguém - está a perceber a diferença?
E eu nunca escrevi que o anonymous tinha chamado idiota a alguém. Escrevi, isso sim, "Há, de facto, posições e opiniões que são idiotas." O anonymous percebe a diferença?
 
Joaquim Amado Lopes,
Quem está à vista que não percebe nada de nada é você.
 





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