O aborto clandestino continuará mesmo se o sim ganhar!

Os defensores do sim não se cansam de repetir que, com a posição que proclamam, apenas pretendem acabar com a humilhação das mulheres que, fruto de condicionantes económicas ou de constrangimentos familiares, não vislumbram outra solução que não seja a morte do embrião.
A simplicidade denotada pelo raciocínio, para além de pouco consentânea com a intencionalidade jurídica que preside à cominação de uma sanção de tipo penal, peca pela incompreensão da realidade material que subjaz à eventual previsão normativa.
Na verdade, não só se afigura gritantemente errado pensar que, ao abrir a porta à possibilidade de aborto a pedido, sem invocação de qualquer razão justificativa, apenas as situações convocadoras do sentimento de compaixão ali se vão acantonar, como, ainda que assim fosse, a perversão da dimensão solidarística da sociedade e do Estado se torna chocante. Diante de um problema, prefere-se encaminhar a mulher para o aborto, optando-se por utilizar o dinheiro público para aniquilar embriões em detrimento da prestação de auxílio material às mães com carências financeiras.
E se a suposta e hipotética razão do aborto – que, a ser aprovada a alteração legislativa, nunca conheceremos, pelo que a mesma se tornará insindicável – não se colimar numa espécie de eugenismo socio-económico, mas radicar, outrossim, numa eventual fuga à autoridade paternal ou, mais amplamente, familiar, então a questão já não é só de princípio – pela inadmissível desresponsabilização incompatível com a pessoalidade que nuclearmente nos predica – mas também prática. Ainda que o sim ganhe no referendo, o aborto só não será crime se praticado em hospitais públicos ou clínicas. Ora, e estribando-nos até nas mais recentes declarações do Sr. Ministro da Saúde, dificilmente uma mulher menor conseguirá realizar um aborto nessas condições sem que os pais tomem conhecimento da situação. Continuará, portanto, a recorrer ao aborto clandestino, considerado crime. Pelo que se pergunta aos defensores do sim – esperando que desta feita não se furtem a responder a uma questão concreta – o que farão relativamente a estes casos.

Sócios à força

A CRESCER

"Os cerca de 20 movimentos de defesa do «não» à despenalização do aborto em constituição por todo o país reuniram já mais de 120 mil assinaturas" (diário digital)

É preciso não desistir!

No Diário de Notícias de 5 de Janeiro, Pedro Rolo Duarte explicava, com um certa nota de desapontamento e amargura, que se via compelido a votar “sim” no referendo. Votaria “sim” porque não acreditava nas capacidades e no empenho do Estado e da sociedade civil para mudarem o estado das coisas. Porque tinha esperado por essa mudança depois do referendo de 98 e via que nada tinha acontecido.
Há duas notas que gostaria de deixar.
1. A primeira para concordar com Pedro Rolo Duarte quando se refere ao Estado - pouco fez de 98 para cá (embora se possam apontar iniciativas conexas, por exemplo na área da adopção) - mas para discordar quando se refere ao papel da sociedade civil, nomeadamente através das instituições privadas. Perguntei-me mesmo se viveríamos no mesmo país. É que, se há coisa que aconteceu de 98 para cá foi a mobilização de muita gente na constituição e desenvolvimento de instituições de defesa da vida e apoio da maternidade e no aprofundamento do papel de outras. Não é verdade que no dia a seguir ao referendo todos tenham “recolhido a bandeira” e tudo tenha voltado ao mesmo. Acho mesmo curioso que o autor dê como assente que não houve sequer o mínimo reflexo da acção dessas instituições no número de abortos, quando não dados fidedignos sobre o aborto clandestino nem pré nem pós 98. Também eu não posso afirmar que esse abaixamento é real, mas posso seguramente aconselhar o autor a contactar as instituições que desconhece e a visitá-las e pedir dados sobre o número de mulheres e de bebés que acompanham. Estou certa de que ficará surpreendido. Devemos andar num país diferente, pois durante estes anos muito ouvi falar de diversas dessas instituições, quanto mais não fosse quando, apresentando objectivos e resultados, apelavam à generosidade dos outros para poderem cumprir a sua missão.
Para facilitar o trabalho, deixo aqui alguns contactos: Ajuda de Berço (www.ajudadeberco.pt), Ajuda de Mãe (www.ajudademae.com); Ponto de Apoio à Vida (21 757 09 41); Associação Portuguesa e Maternidade e Vida (www.maternidadeevida.org), Mulheres em Acção (www.mulheresemaccao.org), Juntos pela Vida (www.juntospelavida.org); Associação Vida Universitária (www.vidauniversitaria.loveslife.com); Movimento de Defesa da Vida (www.mdvida.pt).
2. A segunda nota para rejeitar essa visão que vai grassando (e de inspiração hegeliana, diria) segundo a qual “como já experimentámos a penalização e não resolveu vamos agora experimentar o oposto, pois seguramente será melhor”.
Entendamo-nos quanto aos objectivos. Se o que se pretende é dar condições de higiene e segurança para a prática do aborto, então é inegável que a liberalização terá esse efeito (embora, como todos sabemos, não prive a mulher do grave trauma que o aborto constitui). Mas se o que se pretende é diminuir o número de abortos em Portugal (o que me parece ser a perspectiva do autor), então não é verosímil que isso venha a acontecer com a liberalização.
Não se desista de exigir ao Estado o que ele deve dar. Canalize-se os recursos que o Estado se dispõe a gastar com o aborto (nas contas do Ministro da Saúde, entre 350 e 700 euros por aborto) para uma séria política de prevenção da natalidade e de apoio à maternidade. Apoie-se as instituições já existentes e estude-se a melhor maneira de estender a sua acção. Entenda-se o papel do Estado como promotor indeclinável de uma cultura de responsabilidade e de solidariedade. É preciso acreditar que o Estado, directa ou indirectamente, irá assumir o seu papel de apoio às mulheres e famílias carenciadas. É preciso insistir para que isso aconteça (e convenha-se que a liberalização do aborto, com o custeamento por parte do Estado, é um incentivo claríssimo em sentido inverso). É preciso valorizar o papel da sociedade civil e incentivar para que mais faça nesta área. Enfim, é preciso que a luta continue pela promoção de uma sociedade mais responsável, mais solidária, mais fraterna. E isso não é compromisso só de alguns, deve ser de todos!

"PELO FIM DA HUMILHAÇÃO", DIZEM ALGUNS DEFENSORES DO SIM

JUNTOS, VAMOS CONSEGUIR

A Plataforma "Não, obrigada" entregou ontem na CNE as assinaturas necessárias para intervir como movimento cívico na campanha que se avizinha. No "movimento" a favor do "não" coexistem pensamentos muito diversos sobre a questão do aborto. E ninguém anda a policiar o que o vizinho do lado, da mesma causa, possa dizer. Temos a ideia de que, todos, somos uma única mensagem independentemente das respectivas proveniências. O correcto político, que se imagina dono da subtileza e da liberdade, vê em cada defensor do "não" um perigoso beato e uma ameaça aos "direitos". Como de costume, enganam-se. Também o "sistema" - falo do SNS e da sua tutela política - se engana. Com os hospitais públicos em transe - tesos, indisciplinados e incapazes de responder às maleitas dos portugueses que os pagam - Correia de Campos faz continhas ao que não é prioritário e despreza o essencial. Mesmo que a lei actual fosse alterada, e para além da consolação de meia dúzia de "militantes causalistas" que vêem no aborto a consagração de mais um método anticonceptivo, o que é que verdadeiramente mudava? Nada ou muito pouco. Os abortos clandestinos acabavam? Não. Pelo contrário, a vitória do "não" obrigaria finalmente o Estado a criar as condições para que, sempre que seja necessário, as excepções legais à criminalização da prática da interrupção voluntária da gravidez, aprovadas há tantos anos, possam ocorrer sem dramas institucionais ou pessoais. Conquistar a abstenção previsível para esta evidência, é um dos muitos trabalhos que temos pela frente até ao dia 11 de Fevereiro. Sem ironia, furtemos ao adversário um bom slogan: juntos, vamos conseguir.

Aí está ela

A caverna do "direito social" ao aborto

Se a moda pega o Estado nem para a estrada poderá ir roubar (3). Por AA.

Quando o campo do "não" ao referendo do Aborto finalmente se deixou dos socialismos em que estava enredado (anti-individualismo, socialismo familiar, anticapitalismo, etc), e saiu em força com o argumento liberal que o dinheiro das pessoas não lhes deve ser roubado para financiar causas morais com as quais não concordam— o SNS passar a realizar abortos pagos pelo Orçamento de Estado, como se de um "direito social" se tratasse—, sairam da caverna todos aqueles defensores do "sim" para quem o individualismo é um ferrão insuportável no seu iliberalismo militante.

Excesso de aspirinas provoca confusão mental!

Tendo na sua composição um ácido, o consumo de doses excessivas de aspirina pode causar alcalose, seguida por acidose metabólica, com respiração muito rápida e confusão mental.

Deve ser este o motivo da falta de percepção revelada por um tal de Luís quando, sem pensar antes de escrever, dispara contra alguns dos membros do Blogue do Não.
Na verdade, nós sabemos que afirmar que “o facto de criar uma criança sair mais caro que abortar é razão suficiente para liberalizar o aborto” é um asco. Mas não se insurja contra o João Vacas. Afinal a lógica foi veiculada por um adepto do sim. Sem que se tenha de amofinar. Ao constatar o asco, pode sempre mudar o seu sentido de voto.

Campanha pelo não já faz ao sublinhar a enormidade. Falta-lhe só perceber algumas evidências. Porque, apesar da verdade ser afirmada com a solenidade de um la Palice involuntariamente cómico, o Luís não foi, para já, capaz de logradamente a entender. Por efeito da sobredosagem anunciada, o nosso interlocutor de circunstância esquece-se que o espermatozóide ou o óvulo, sendo compostos por células vivas, não possuem um código genético autónomo que, estando presente no embrião, faz dele um ser humano único e irrepetível, diferente dos progenitores que o geraram. É a tal lógica de alguns defensores do sim que, pese embora o escondam, continuam alegres e contentes a acreditar na equiparação entre um filho e uma unha do pé.

Não o acuso, porém, de aldrabice, calúnia, falácia ou omissão. As aspirinas não permitem mais, logo a mais não é obrigado. Se até acha que a leitura de um jornal, em formato digital ou impresso, constitui uma descoberta fulminante, que podemos nós fazer? Limitar-nos a esperar por dias de melhor actividade cerebral ou elucidar o dito senhor que não temos culpa das palavras proferidas pelo Sr. Ministro da Saúde por mais incómodas que elas possam ser?

Talvez esteja na altura de utilizar o SNS, levando para o efeito um documento identificativo que lhe será exigido, de forma a tratar essa intoxicação medicamentosa.

Jogar às mentiras

Logo de manhã, ouvi a Joana Amaral Dias na crónica da TSF a criticar a campanha do "não" quando chama a atenção para os recursos que terão de ser canalizados para a prática do aborto.
Explicava que actualmente também o sistema nacional de saúde gastava muito dinheiro com o tratamento das complicações resultantes dos abortos clandestinos. Explicava também que o Estado gasta actualmente dinheiro com os processos judiciais resultantes da prática do aborto.
Não sou adepta do argumento económico para a defesa de um ou outro lado, acho que há razões muito mais válidas para ambos os lados, mas não posso deixar de tecer dois comentários:
- diz o "sim" que há 20, 25 ou 30 mil abortos clandestinos por ano em Portugal. Não sei se é verdade. Ninguém sabe (neste ponto, mais avisado é o Ministro da Saúde quando afirma que não sabe quanto vai custar a liberalização do aborto ao erário público. Não sabe ele nem ninguém). Sabemos sim que os casos registados pelas estatísticas da saúde de complicações resultantes do aborto andam à volta de 1500. Admitindo que os números de aborto clandestino apresentados pelo "sim" são verdadeiros, como pode a Joana Amaral Dias apresentar, seriamente, este argumento?
- decorreram pouquíssimos processos judiciais em Portugal relativamente ao crime de aborto (tão poucos, que quanto procuramos obter dados, por tribunais, pelas estatísticas da justiça, eles quase nunca são disponibilizados, pois situam-se abaixo do n.º3 e por isso estão protegidos pelo princípio do segredo estatístico), o custo, quanto comparado com os ditos 20, 25 ou 30 mil abortos é diminuto. Isto, só por si, já padeceria do mesmo vício apontado (de querer comparar o incomparável). Mas aqui a questão é mais grave ainda: é de pura mentira. É que, como todos sabemos, não há processos relativos a aborto praticado antes das 10 semanas de gravidez. Isto quer dizer que os processos que existiram existirão na mesma caso o "sim" ganhe. Esses custos de que fala continuarão a existir.
Não será melhor argumentar com seriedade?

ESPELHO MEU, HÁ ALGUÉM MAIS FANTÁSTICO DO QUE EU?

"nada há de mal em não saber. não espero que toda a gente que tem opinião sobre este assunto -- e quase toda a gente tem -- conheça a lei, saiba pormenores da sua aplicação e tenha seguido a discussão na última década tão atentamente como eu." - o sublinhado é meu (Fernanda Câncio, glória fácil).

Destruindo os próprios argumentos

Ainda nas suas afirmações noticiadas hoje, o Ministro Correia de Campos assegurou que em nenhum caso o SNS efectuará um aborto a uma mulher que não se queira identificar. Lá se vai o argumento da vergonha social, que foi sempre um dos motivos principais do recurso ao aborto clandestino. No entanto, descansa-nos o Ministro, o estado não imporá semelhante regra às clínicas privadas, às quais poderá recorrer quem se quiser manter no anonimato. E, assim, lá se vão os argumentos da igualdade e da luta de classes. Se és rica e não queres que se saiba, vais à clínica. Se és pobre e não queres que se saiba, vais ao vão de escada. A inutilidade deste referendo surpreende-me crescente e ostensivamente a cada dia que passa.

FALSA MODERAÇÃO

Depois de alguma histeria inicial por parte de alguns (poucos) adeptos do "Sim", no qual incluo a jornalista Ana Sá Lopes - a qual chegou a defender a liberalização do aborto se o "Não" ganhasse mas o referendo não fosse vinculativo - temos assistido a uma tentativa por parte dessas mesmas pessoas numa moderação no seu discurso. O artigo de Ana Sá Lopes de hoje no Diário de Notícias é disso exemplo. Em minha opinião, porém, essa moderação não foi conseguida. Escreve a jornalista:
"Os adeptos do "sim" sabem que não vai ser fácil explicar aos indecisos que não têm de passar a ser defensores do aborto para serem defensores da despenalização. E também vai ser difícil explicar aos que são contra o aborto mas contra a condenação das mulheres que, para conseguirem evitar que as mulheres sejam condenadas, precisam mesmo de votar "sim". Aos defensores do "sim" este discurso parece incongruente, mas não o é para os defensores do "não" que conseguem - tantos e quantas vezes - ser contra a condenação das mulheres que abortam e defender o "não", ou seja, que essa condenação se mantenha na lei. É um absurdo jurídico, mas é partilhado por eminentes figuras."
Antes de mais, importa explicar à Ana Sá Lopes que quem é contra o aborto e contra a condenação das mulheres não opta necessariamente pela liberalização, por muito que isso lhe possa custar.
Por outro lado, a Ana Sá Lopes bem sabe que a lei não condena ninguém. Somos (ainda) um Estado de Direito em que todos têm direito a julgamento e defesa antes de serem condenados seja pelo que for. Embora já se tenha percebido que o grande argumento do "Sim" vai ser a (falsa) questão da prisão das mulheres, a verdade é que uma jornalista como a Ana Sá Lopes tem a obrigação de evitar este tipo de falácias. Pretendendo ser moderada, o que consegue na forma, a verdade é que o texto é substancialmente radical, contribuindo ela própria para aquilo que disse temer "(...) o debate à volta da questão, o ruído e o confronto afastam os eleitores e transferem votos do sim ou dos indecisos para o não e a abstenção (...)".

É PENA

O Ministro da Saúde afirmou hoje peremptoriamente que os hospitais do SNS seriam obrigados a fazer os abortos que lhes fossem solicitados, no caso do Sim ganhar o referendo.
Pena é que à pergunta de quanto custará ao Estado a liberalização do aborto até às 10 semanas o Ministro tenha respondido, igualmente de forma peremptória, "Não sei".
Pena é que ao Ministro não tenham perguntado se sabia quantos médicos especialistas são objectores de consciência.
Pena é que o Ministro não tenha explicado quais as consequências para os médicos que se recusarem a fazer esses mesmos abortos.
A este propósito ocorre-me uma evidência. Em qualquer empresa, um administrador que afirme desconhecer os efeitos económicos de uma medida por si tomada é imediatamente despedido (com justa causa) pelos respectivos accionistas.
Pena é que os "accionistas" - todos nós - da "empresa" Estado não possam fazer o mesmo ao Senhor Ministro.

A CULPA É, OBVIAMENTE, NOSSA!

Hoje mais um movimento a favor da liberalização do aborto entregou as necessárias assinaturas na CNE para poder beneficiar do tempo de antena estabelecido por lei. À saída, ouvi a deputada Odete Santos, visivelmente exaltada, dizer o seguinte:
"Se for necessário recorrer aos privados para fazer abortos é o Não que tem culpa disso"
Esta extraordinária frase é da autoria de uma camarada de partido do Sr. Jerónimo Sousa que ontem comparava a actual legislatura ao fascismo do antigo regime. São estes alguns dos personagens que no próximo dia 11/02 vão votar Sim ao aborto livre.

Lógica imbatível

Para os defensores do SIM, o facto de criar uma criança sair mais caro que abortar é razão suficiente para liberalizar o aborto.
É imbatível esta lógica. E arrepiante.

João Vacas

A LEI QUE EXISTE

CAPÍTULO II (Do Código Penal)

Dos crimes contra a vida intra-uterina

Artigo 140º

Aborto

1 - Quem, por qualquer meio e sem consentimento da mulher grávida, a fizer abortar é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.

2 - Quem, por qualquer meio e com consentimento da mulher grávida, a fizer abortar é punido com pena de prisão até 3 anos.

3 - A mulher grávida que der consentimento ao aborto praticado por terceiro, ou que, por facto próprio ou alheio, se fizer abortar, é punida com pena de prisão até 3 anos.

Artigo 141º

Aborto agravado

1 - Quando do aborto ou dos meios empregados resultar a morte ou uma ofensa à integridade física grave da mulher grávida, os limites da pena aplicável àquele que a fizer abortar são aumentados de um terço.

2 - A agravação é igualmente aplicável ao agente que se dedicar habitualmente à prática de aborto punível nos termos dos nºs 1 ou 2 do artigo anterior ou o realizar com intenção lucrativa.

Artigo 142º

Interrupção da gravidez não punível

1 - Não é punível a interrupção da gravidez efectuada por médico, ou sob a sua direcção, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido e com o consentimento da mulher grávida, quando, segundo o estado dos conhecimentos e da experiência da medicina:

a) Constituir o único meio de remover perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida;

b) Se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida e for realizada nas primeiras 12 semanas de gravidez;

c) Houver seguros motivos para prever que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação congénita, e for realizada nas primeiras 24 semanas de gravidez, comprovadas ecograficamente ou por outro meio adequado de acordo com as leges artis, excepcionando-se as situações de fetos inviáveis, caso em que a interrupção poderá ser praticada a todo o tempo;

d) A gravidez tenha resultado de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual e a interrupção for realizada nas primeiras 16 semanas.

2 - A verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez é certificada em atestado médico, escrito e assinado antes da intervenção por médico diferente daquele por quem, ou sob cuja direcção, a interrupção é realizada.

3 - O consentimento é prestado:

a) Em documento assinado pela mulher grávida ou a seu rogo e, sempre que possível, com a antecedência mínima de 3 dias relativamente à data da intervenção; ou

b) No caso de a mulher grávida ser menor de 16 anos ou psiquicamente incapaz, respectiva e sucessivamente, conforme os casos, pelo representante legal, por ascendente ou descendente ou, na sua falta, por quaisquer parentes da linha colateral.

4 - Se não for possível obter o consentimento nos termos do número anterior e a efectivação da interrupção da gravidez se revestir de urgência, o médico decide em consciência face à situação, socorrendo-se, sempre que possível, do parecer de outro ou outros médicos.

Vejo pouca gente, de um e do outro lado, interessada em olhar com atenção para a lei em vigor. Por razões que não vêm ao caso, estive a ler e a reler o famoso artigo 142º do Código Penal. Coloquei-o aqui na sua inserção legal, ou seja, no capítulo a que pertence na respectiva economia textual: "dos crimes contra a vida uterina". Apenas duas ou três observações. O aborto é um crime e assim continuará após o resultado do referendo de 11 de Fevereiro, independentemente desse resultado. Depois, a alínea a) do número 1 do art.º 142º é o que se pode chamar uma "claúsula aberta", tão aberta que serve perfeitamente em Espanha, não se entendendo - eu não entendo - por que é que não serve cá. Como há quem entenda que não serve para as portuguesas, passa-se pois directamente - é esse o sentido da pergunta do referendo - para a tentativa manhosa da liberalização total do aborto, desde que efectuado até às primeiras dez semanas de gestação. Dar-se-á o caso de as mulheres espanholas serem mais "oprimidas" do que as mulheres portuguesas nesta matéria? Não consta que, em Espanha, se queixem. Pelo contrário. As prioridades do SNS passam por coisas bem diferentes do que o aborto, nomeadamente por criar as condições para que as normas que registei acima sejam aplicadas, sem complexos, sempre que seja necessário. Não é preciso mais nada. Defender o "sim", neste claríssimo contexto legal, sobretudo no da alínea a) do nº 1 do art. 142º, é mera afirmação politica de um "sim porque sim".

"AS MÁS COMPANHIAS DÃO NISTO" ou "EU É QUE SOU O PRESIDENTE DA JUNTA"

NOVO COLABORADOR ESPECIAL

A partir de hoje passamos a contar com a colaboração especial de José Diogo Ferreira Martins, Cardiologista Pediátrico, que muito nos honra. Para quem não se lembra, foi o autor de um excelente texto publicado no Público, no dia 12 de Dezembro, e que o André Azevedo Alves referiu aqui.

«DIREITOS HUMANOS EM PORTUGAL»

«Enquanto continuarem a morrer e a ser maltratadas crianças em Portugal», ainda dentro do ventre materno, «vítimas de» aborto, «sem que o Estado e a sociedade intervenham para pôr fim à agressão e proteger quem é agredido, independentemente de depois levar à justiça ou» a local de apoio adequado «quem é agressor, não podemos considerar-nos num país civilizado.»
Quantos mais pequenos seres indefesos «têm de morrer, para nossa infâmia colectiva, até que» alguma Comissão «tenha os recursos (humanos e outros), a autoridade e a diligência necessária para intervir exemplarmente e a tempo», apoiando as crianças, as mulheres e a maternidade, em vez de se pugnar pela criação de uma lei nefasta que legitime essas atrocidades?

Agradeço a Ana Gomes, do Causa Nossa, todas as palavras que me inspiraram neste post (as que estão entre aspas).

MANUEL AZINHAL

"(...) a previsão legal do crime de aborto serve para muito mais do que para perseguir mulheres grávidas. Serve essencialmente para perseguir por esta via quem faz negócio dessa prática. E que com a despenalização continuará no ramo, agora de porta aberta, ou passará a trabalhar nas clínicas espanholas. Fala-se só nas mulheres grávidas para esquecer o facto incómodo de os despenalizados serem fundamentalmente os outros (os que vivem disso, e os que levam a isso)." (Alameda Digital)

CARLOS BLANCO DE MORAIS

"Depositar exclusivamente na vontade da mulher, em nome do direito à valorização da sua personalidade, a eliminação de uma forma de vida humana intra-uterina que se não teria formado sem a intervenção masculina pode constituir uma discriminação infundada da vontade progenitor na decisão abortiva, a qual é totalmente suprimida na questão. No fundo poderia argumentar-se que a referida questão colocada a referendo permitiria, por outros meios e palavras, a legitimação do teor campanha mais radical do sim que marcou o último referendo, o qual se centrou no lema “na minha barriga mando eu”." (Alameda Digital)

ANTÓNIO GENTIL MARTINS

"A ciência médica vem demonstrar que só artificiosamente se podem estabelecer divisórias nesse todo contínuo que é a vida humana." (Alameda Digital)

JOÃO PAULO MALTA

"A liberdade pressupõe existência de caminhos alternativos, implica a capacidade de querer e poder fazer escolhas. Sem que se verifiquem estas premissas, qualquer decisão não será, nunca, verdadeiramente livre. A questão referendada contém, então, em si, um vício formal: sem que sejam criados mecanismos de apoio que sustentem uma real escolha, não existe livre vontade." (Alameda Digital)

NORTE PELA VIDA

"António Lobo Xavier, José Pedro Aguiar-Branco e Matilde Sousa Franco apresentam hoje publicamente o movimento de cidadãos "Norte pela Vida", numa cerimónia ao fim da tarde na Alfândega do Porto. A sessão é a primeira iniciativa pública do grupo depois de recolhidas as cinco mil assinaturas necessárias para a legalização junto da Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Para além do ex-dirigente do CDS e daqueles dois deputados do PSD e do PS, o movimento abarca outros nomes do Norte, como Arlindo Cunha, antigo ministro dos governos de Cavaco Silva, Nogueira de Brito, histórico deputado centrista, os deputados José Paulo Carvalho e Diogo Feyo, entre outros." (DN)

VOTOS PARA 2007

O Público diz-me que o primeiro bebé do ano é uma menina, nasceu exactamente às 00h00 na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa (na de Elvas não seria, certamente), e que pesa 2,420 kg. O que desejo para 2007 é que no primeiro dia do ano de 2008 não haja motivo para se noticiar o sexo e o peso do primeiro aborto do ano, nem a hora e o local da execução.

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Com a presença, entre outros, da Dra. Matilde Sousa Franco, do Dr. José Pedro Aguiar Branco e do Dr. António Lobo Xavier, que usarão da palavra.

TODOS CONTRA O ABORTO?

Na caixa de comentários do último (e excelente) post da Assunção, alguns partidários do "sim" insistem que também eles são contra o aborto. Confesso a minha dificuldade em aceitar este lugar comum, tantas vezes repetido nos debates que se vão fazendo acerca do assunto. Passo a explicar as minhas razões.
Os efeitos da liberalização da prática do aborto foram distintos nos vários países que tomaram essa opção, assistindo-se a um aumento exponencial do número de abortos em alguns, como é o caso da Espanha, ao passo que noutros esse número terá diminuído.
Sem querer discutir o absurdo do argumento frequentemente utilizado pelo "sim", de que a redução do número de abortos é consequência da sua liberalização, a verdade é que se torna difícil avaliar o impacto de tal medida num país como Portugal.
Podemos, no entanto, afirmar que em todos os países em que houve uma aposta séria no planeamento familiar, informação e acesso facilitado a meios anti-conceptivos, medidas de apoio à natalidade, etc., ocorreu uma baixa significativa do número de abortos. Penso que nisto estaremos todos de acordo (ou não?). Acresce que, em todos esses países o processo de adopção é simples e rápido, existindo condições de excepção para o acolhimento dos filhos indesejados ou sem pai nem mãe.
Assim sendo, e uma vez que somos (quase) todos contra o aborto:
Por que não tentar oferecer às mulheres grávidas e respectivas famílias uma alternativa ao aborto ilegal que não passe exclusivamente pela sua legalidade, como pretendem os partidários do "sim"?
Por que não apostar num planeamento familiar que ajude a prevenir gravidezes indesejadas?
Por que não evitar algo que, pelos vistos, a generalidade das pessoas repudia, ou seja o aborto, afastando a ideia de que o mesmo é um mal necessário?
Em suma, será que somos todos contra o aborto?

ISSO BEM CONTADO AINDA DÁ UNS MILHÕES

"(...) prova disso são as dezenas ou centenas de milhares de abortos que se fazem todos os anos em Portugal (...)" (António Figueira, no 5 dias).
O António Figueira sugere que é impossível debater com boa parte dos partidários do "não". Eu gostava era de saber o que é que se pode debater com pessoas que, fazendo tábua rasa dos poucos estudos sobre o assunto em Portugal (a APF, conhecida associação pró-liberalização do aborto, "encomendou" um estudo que aponta para menos de 20.000/ano), sugerem que o número de abortos praticados todos os anos em Portugal poderá ascender a centenas de milhares. Há quem lhe chame demagogia.
Actualização: o António Figueira decidiu alterar o post, retirando a expressão "centenas de milhares de abortos". É evidente que perde sentido o que aqui escrevi. Já o juízo acerca da utilização e posterior retirada de tal expressão fica para quem a constatou.